quarta-feira, 8 de junho de 2016

Os 'Larousse' - cresci entre o Petit e o Grand


A minha tendência 'enciclopédica', que se nota aqui no Livro, talvez tenha esta explicação simples - foram dois 'Larousse' a monumental fonte de informação que me formatou.


Foi por influência das visitas à minha tia, a única que interessa para o caso, onde tinha liberdade nos anos 60 para consultar um livro bonito que era raro ver por cá: o Petit Larousse de 1963 - que comecei a coleccionar recortes de jornal (sobretudo o 'Primeiro de Janeiro'), que agrupava por temas, e depois colava nuns cadernos muito mal amanhados com capa de cartolina e folhas presas por agrafos. Chamava a isso "Enciclopédia Ilustrada", para enorme gozo do meu irmão. Era, na altura, o meu 'blog'.


Mas o que me interessa agora aqui é relembrar o Petit Larousse. 1798 páginas em formato A5, bem encadernado e muito usado, tanto que está encapado com protecção plástica. Uma jóia. Era editado por Claude Augé.

A letra A começava com um belíssimo Avion Caravelle, a letra T figurava sobre uma imagem do Tigre Royal.


Cada capítulo de Arte - românica, mexicana, muçulmana - tinha direito a uma ou duas páginas ilustradas de exemplos. Algumas pranchas a cor eram um luxo - Papillons, Energie nucleaire, Renaissance, Costumes. Cada país, cada continente, dava direito a um excelente mapa, a uma ou duas cores.

Aqui encontrei uma aprendizagem que a escola não dava.

As famosas pages rose separavam o volume em duas partes. Nelas listavam-se locuções latinas (quase todas !) e estrangeiras:

Um guia precioso!

Antes das páginas rosas, na primeira parte, que era a maior, os nomes comuns; na segunda parte, os nomes próprios - pessoas, personagens mitológicas, localidades. Desenvolvia-se a História e a Cultura, com mapas, pranchas e cronologias. A Suíça tinha um belo mapa de página inteira, detalhado, tão grande como o dedicado à Península Ibérica; lá ao norte ficava, sic, La Corogne. As últimas páginas eram outro suplemento - um pequeno Atlas dos países francófonos.

Era óbvio o peso maior da cultura clássica - havia muito mais informação sobre a Mesopotâmia, a villa Borghèse ou as igrejas Góticas, do que sobre arquitectura moderna, a pintura abstracta, as cidades de hoje. Todos esses enviesamentos influenciaram certamente o meu gosto, é verdade.

Matisse é o mais moderno a merecer referência ilustrada.

'Automobile'. Quando era quase uma arte.

Um dos poucos nomes portugueses, Camões: "grand poète portuguais (...) mort dans la misère. Il excèle dans les images hardies, les peintures éclatantes des phénomènes de la mer." Voilá.

Salazar, oh não, "homme d'état portuguais,  il a fondé le nouvel état sur le régime corporatif et maintenu son pays dans la neutralité."
Praticamente o mesmo número de linhas.

'Bateau' surpreende pelas duas referências a Portugal: o sardinier (suponho que é o barco da xávega) e o rahello, certamente rabelo do Douro.

É fácil, hoje, detectar erros, incorrecções e disparates. a net é tão mais rápida e auto-correctiva. Em 63 nem se sonhava com isso: ordinateur, s.m., 'calculateur arithmètique' (...). A proeza mais recente da humanidade era o satélite russo tripulado (1961), o Vostok 1 de Gagarine ainda algo misterioso, e a tecnologia de vanguarda era o transistor. "Trou noir" não existia, nem sequer "cassette", mas existe électrophone (uma caixa, tipo mala, com gira-discos e altifalante)!


O Larousse du XXème Siècle é de outro campeonato. São 6 enormes e pesados volumes, do A-Carl ao Ro-Z, sem esquecer o Carm-D, onde era suposto encontrar tudo, exaustivamente, sobre qualquer assunto até à data de publicação.


O forro da encadernação já era por si uma pequena enciclopédia.

Não é livro que se leve para ler na cama antes de adormecer, mesmo assim "li-o", quer dizer, folheei uma a uma todas as páginas consultando um ou outro artigo, duas vezes !

Assim abriam as letras.

Editado por Paul Augé, editor da família de Claude Augé.

Oiseaux.

'Arbres', uma das minhas pranchas favoritas.

No 'XXème', Portugal merecia três páginas, nada mal. Infelizmente, uma delas era a genealogia da monarquia portuguesa...

Uma das grandes qualidades do Larousse eram os magníficos desenhos, todos eles. Mas em particular os desenhos de obras de arte - igrejas, castelos, e mesmo pinturas ! - que faziam melhor efeito do que fotografias.

Louve du Capitole.

La foi.


Ave Cesar.

Bela coisa, as enciclopédias. Belos livros, sim, mas belos objectos também, testemunhos históricos de uma época.

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Hoje, a viagem virtual percorreu memórias de... livros! :)


3 comentários:

Fanático_Um disse...

Fez-me recordar, com emoção, uma parte da minha juventude. Um avô professor de português e de francês não me poupava à consulta dos "Larousse". Bem fez ele!

Mário R. Gonçalves disse...

Só lhes faltava dar música, Fanático_Um.

Fanático_Um disse...

:-)