quinta-feira, 9 de novembro de 2023

No "City of Rhodos" pelo mar Egeu - Mikonos, Rodes, Knossos e Thera

Foi em 1990, século passado, que voámos ainda jovens até à Grécia e fizemos o incontornável cruzeiro pelas ilhas do mar Egeu. Tivemos a sorte (mais do que sabíamos) de nos meterem num navio 'antiquado', o City of Rhodos, daqueles onde abundam corrimões de madeira bem envernizados e latão dourado no interior. Era bonito mesmo, mas pelos vistos inseguro, tinha a quilha pouco profunda de navio fluvial que lhe dava alguma instabilidade em mar agitado. A nossa cabina era muito má, perto da casa das máquinas, mas caminhar pelos passadiços dos conveses e amuradas enchia-me de ilusões navegantes. 

O City of Rhodos fora construído nos estaleiros navais de Cádis, em 1966, por encomenda da Argentina, que o baptizou como "33 Orientales (*) ; destinava-se a fazer parte da Frota Fluvial para navegar no vasto Rio de la Plata. Acabou por servir como navio-prisão para políticos opositores, e degradou-se muito. A companhia grega Cycladic Lines comprou-o em 1979, modernizou-o, adaptou-o ao mar, e deu-lhe o nome da Cidade de Rodes. Mais tarde foi comprado pela K-Lines dos irmãos Kyrtatis.

Recém-restaurado, todo bonito, no Pireu.

O K é de Kykladikés e também de Kyrtatis...

A bordo comia-se malzito, ninguém falava Inglês. Querer saber "please, what fish is this, quel poisson, que pez ?" dava direito sempre à mesma resposta: bacalá. "Portugal is bacalá", diz o presidente.

A navegação levou-nos primeiro até Mikonos. Chegámos às 18.30, fim de tarde, quase hora de jantar. Foi uma corrida aflita para os barcos que nos levavam a terra, e uma corrida pelas ruelas brancas - não vimos quase nada, espreitámos os moínhos e gozámos um café razoável na esplanada frente ao Egeu.


E fomos repreendidos pelo nosso atraso - o nosso 'shuttle' foi o último ! - até porque o mar estava a ficar agitado. Noite de navegação para Rodes.

'Promenade' do convés das baleeiras.

Como o navio era relativamente pequeno, eu conseguia dar a volta pelos passadiços descobertos dos decks e tombadilho em pouco mais de meia hora, o que era uma boa passeata. Também me senti bastante livre de movimentos, excepto na proa e na ponte. 

E aportámos a Rodes.



Lembro-me de um calor pavoroso, deveria estar perto dos 40º.


A Atena de Lindos, a abrasar.

Três andares de convés de promenade, da proa à ré.

Em navegação, de Rodes a Creta :




Heraklion, Creta.

ΣITY οφ ΡΟΔΟΣ !

Foi a melhor escala da viagem: Knossos e o Museu de Heraklion são daquelas espantosas heranças historico-artísticas que quase fazem esquecer as malfeitorias da humanidade. Nunca me senti tão helénico.



Um dos momentos altos de todas as nossas viagens.

O Museu de Heraklion seria uma esplêndida surpresa: talvez mais rico que o da Acrópole, tivemos na visita o apoio de uma guia individual que sabia de História Grega como um Mestre, entusiasta e detalhadamente informada. Foi uma tarde de luxo hitorico-arqueológico.

O "Principe dos Lírios" de Knossos, XVI AC, o original no museu.


De volta por Thera / Santorini

Ancorado em Santorini

Gostei muito de ver cá de baixo a parede da cratera e o casario branco lá em cima na crista. 


Mas subir pela vereda dos jericos foi um suplício - além do declive, o cheirete e a sujidade eram de mais. E lá no alto não há nada de especial - parece um aldeamento turístico azul e branco com dourados, muito algarve-plástico e abundante em pedinchisse aos visitantes. 


O regresso teve um momento mágico - o pôr do sol no 'solar deck' da popa do navio, com a crista de Santorini já não branca mas dourada, e um sossego total, a muralha do vulcão pela frente e o sol meio afogado lá atrás no horizonte; não havia mais ninguém a aproveitar o momento.

Vimos um pôr do sol assim , mas do deck superior do 'Rodes'.


Por esta altura começava eu a balbuciar na Internet, havia o tímido Projecto Minerva nas Escolas, mas não havia blogs nem páginas pessoais nem Google nem Wikipedia. Mesmo o Yahoo foi só 4 anos depois. As fotos eram em película, reveladas em papel. As que tirei dentro do navio não estão mal, estão mais fracas as paisagens e os tesouros patrimoniais helénicos.

Adeus City of Rhodos

Passado dois anos a Cycladic Lines faliu, o naviu andou em bolandas pelo Chipre com outros nomes, e acabou desmantelado em Limassol em 2006. Só viveu 40 anos, coitado.

Há um vídeo fraquito com o City of Rhodos:

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(*) Os 33 Orientales é o grupo insurreccional que em 1825 tentou incorporar o território a norte do Rio de la Plata (hoje Uruguai) ) nas então 'Provincias Unidas' do sul.


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