Mostrar mensagens com a etiqueta gótico. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta gótico. Mostrar todas as mensagens

quinta-feira, 12 de janeiro de 2023

Em Kaunas, uma das belas ruas da Europa: 'Vilniaus gatvė'


Para começar bem 2023, preparei demoradamente uma visita a uma cidade lituana pouco falada, cuja valia histórica passa sobretudo pela pertença à Liga Haseática. O centro é atravessado por uma rua invejável, coerente e elegante, que foi há pouco objecto de obras de revalorização, e é agora rua pedonal.

Kaunas é uma cidade central e histórica da Lituânia, com uma perigosa vizinhança - fica perto do exclave russo de Kaliningrad, fonte potencial de ameaças e conflitos.


Devido também à fronteira com a Bielorrússia, os lituanos não vivem descansados receando pela sua independência. As cidades de Vilnius, Kaunas e Klaipéda (de que já aqui falei), são cidades muito europeias dentro do estilo Báltico, com um historial que remonta aos Vikings e à Liga Hanseática, quando tiveram relações privilegiadas com todos países do Norte da Europa.

A primeira menção à cidade de Kaunas é de 1361, quando foi construído um Castelo em tijolo sobre a margem do rio Nemunas. Por estar na rota importante do comércio Hanseático e ter o seu próprio pequeno porto fluvial, Kaunas cresceu e prosperou e em 1441 integrou-se na Liga com o seu próprio entreposto, que negociava sobretudo com Danzig - peles, couro, cera, madeira, alcatrão, sal, felpo e grãos. Uma casa adequada para os mercadores da Hansa que pernoitavam em Kaunas era uma necessidade pelos meados do século XV. 

Casa de Perkunas

Casa de Perkunas (deus do Trovão) é a mais antiga casa gótica da cidade velha de Kaunas. Foi construída por mercadores hanseáticos e serviu com escritório da Liga entre 1440 e 1532. Fica num quarteirão histórico junto ao rio, perto do antigo porto, e onde há outras casas dessa época.

Outro exemplo é a 'Casa de Echel', também do século XVI, recentemente restaurada e que pertence também à Universidade; uma história não confirmada conta que Napoleão na sua passagem (devastadora) por Kaunas pernoitou nesta casa num dia chuvoso de Junho, e por isso é conhecida como Napoleono namas.

O frontão é renascentista.

No século XVI, Kaunas teve a sua Escola e um Hospital, e era uma bela cidade tardo-gótica. Já nessa altura foi vítima da cobiça da Rússia, que atacou várias vezes em 1665, e acabou ocupada pelo exército sueco em 1701.  Já no século XIX, foi alcunhada "Pequena Paris" pela abundância de arquitectura Art Deco, pela vida cultural e académica, pela moda e decoração, e por uma alargada cultura de Cafés. E isto acompanhado por elevados padrões de qualidade de vida.

Depois dos desastres de civilização no século XX, Kaunas renasceu com a adesão da Lituânia à União Europeia, e é hoje uma cidade média com 300 000 habitantes. A vida de cafés ficou para a História, o que mais vale na cidade é o Castelo e a rua Vilniaus com a sua arquitectura.

O Castelo


A fortaleza actual é do início do século XV, quando o poder lituano se estabeleceu expulsando a Ordem Teutónica que reinava na região. A partir de então Kaunas pôde-se desenvolver fora de muros.


A torre e a fortaleza continuaram a ser objecto de alterações nos séculos posteriores.


Basílica Gótica de Kaunas, nº 1 da rua Vilniaus 


Pouco se sabe da igreja original; uma reconstrução teve lugar em 1671, e ao gótico tardio foram adicionados vários elementos renascentistas e barrocos. A edificação actual resulta de alterações em 1800.




Os interiores forma renovados em 1771 e 1800.


O órgão neo-gótico de 1882 é obra de um mestre de Vilnius.



Rua Vilniaus (Vilniaus gatvė)


A rua parte da Praça da Câmara, um vasto largo quadrangular onde algumas casas do séc. XV recordam os tempos da Liga Hanseática.


A Vilniaus é a rua mais antiga e mais longa do centro histórico, agora uma rua pedonal repleta de esplanadas, receita seguida em quase toda a Europa. Começou por ser o caminho medieval que partia do Castelo para Vilnius; as casas de madeira iam sendo substituídas por casas de tijolo vermelho de famílas mais abastadas. 



Rua Vilniaus, nº 10
Casa de famílias ricas, construída em tijolo no séc XVI, com elementos góticos, renascença e barrocos, e notáveis frontões nas empenas laterais.



Rua Vilniaus, nº 7

Edifício do final do século XVI, no estilo gótico em tijolo típico do Báltico. Pertence à Universidade.

O portão dá acesso a um pátio interior

Rua Vilniaus, nº 11
Uma das esquinas mais bonitas e animadas. É curioso verificar a  prientação das duas casas, uma com a fachada mais larga voltada para a rua, a outra mostra a empena de frontão.

Nestes edifícios históricos está (estava?) instalada a Livraria Humanitas, Knygynas Humanitas.


Aqui fica também a Taverna Buon Giorno, sítio para um bom espresso:



Rua Vilniaus, nº 21
Outra casa gótica de tijolo com frontão renascentista.

O Café Vero instalou-se nos nº 18-23


Rua Vilniaus, nº 29
Nesta esquina fica o colégio católico Stº Inácio de Loyola.

Chegados aqui, a rua é interrompida pela estrada 130 e continua do outro lado; para quem caminha, há uma passagem em túnel sob a estrada.

Do outro lado, a Vilniaus  muda de carácter; passa a ser avenida sossegada e larga, alinhada de belos prédios de dois-três andares em cores suaves.

Rua Vilniaus, nº 33

O edifício histórico da Presidência da Lituânia quando Kaunas foi capital , entre 1919 e 1940. Agora é um Museu.



Rua Vilniaus, nº 58-60

Casa de 1910, com loja de requintada louça Checa, e mais cafés

Rua Vilniaus, nº 64

A escultura "Nežiopsok!" fecha a rua e testemunha uma época passada da sua vida urbana.

Nesta última esquina fica um quiosque da popular cadeia Kauno Spauda, que além de imprensa vende frutas e legumes.


A rua termina pouco depois na Avenida da Liberdade, próximo do local da

Igreja de Stª Gertrudes

Admite-se ter sido construída no século XV , não há registos históricos. 



Kaunas à noite




-----------------------------------------
Não haverá muito mais a ver em Kaunas, mas já basta para justificar uma paragem diferente dos roteiros habituais. São muitas - cada vez descubro mais - as cidades do Báltico e do Mar do Norte que testemunham uma História tão rica como a do Adriático. Já aqui mencionei Stade, Lübeck, Wismar, Stralsund, Ystad, Visby, Klaipėda, Pärnu e no Mar do Norte, Ribe, Bruges, Bergen, King's Lynn. Gosto tanto dessa Europa ! No  Renascimento e na Idade das Luzes, foi nelas que prosperou a ideia de civilização e o cosmopolitismo.

sábado, 12 de fevereiro de 2022

Devaneios no Loch Fyne: Inveraray e as pontes

Sonhar, talvez sonhar.

A enorme Escócia - um nunca mais acabar de lagos e fiordes e vales, centenas de ilhas, e umas quantas vilas costeiras irresistíveis - é, juntamente com Itália, a  Europa de que mais gosto. Tem um dos seus recantos mais genuínos em Inveraray, no Loch Fyne. É como mergulhar num livro romântico, para fora deste mundo, irreal. 

Vista do alto de Dùn na Cuaiche

Nem falta o inevitável castelo de conto de fadas. Acho que este deve ser um bom refúgio quando se aproximar o fim do mundo; ao que dizem, está próximo.😄

Inveraray (gaélico: Inbhir Aora)

População:    ~700
Coordenadas: 56°14′ N, 5°04′ W

A avenida planeada com acesso de Front Street por uma grandiosa arcada. À  esquerda, Main Street, a rua comercial.

O burgo foi criado por Jaime III em 1474, e subiu a Burgo Real em 1648 com Carlos I; mas a actual Inveraray foi planeada no século XVIII (1772-1800) pelos duques de Argyll, do aliás mal afamado Clã Campbell. Os arquitectos John Adam e Robert Mylne, contratados para traçar o novo espaço urbano, desenharam duas vias principais, paralelas à linha de água: The Avenue (um fiasco!) e Main Street, onde se alinha um luminoso casario branco, num estilo Georgiano elegante e bem proporcionado. A rematar, em ãngulo recto, uma frente para o lago que proporciona o perfil mais divulgado da vila.

Começo pela vista da frente para o lago.


The Inveraray Inn (antigo Argyll Hotel, de 1757), entre arcadas, é um dos prédios mais relevantes. À direita, a Bell Tower.

Front Street

'The Courtyard', Front Street,1757. Antes foi Alfândega, Tribunal, Escola e Prisão - era a Townhouse.

Avenue Screen Wall, 1788 - as portas de entrada com três arcos para a falhada 'Avenida' residencial, ao lado da pousada.
 
Há pouco restaurada, é património classificado.

No alto da Main Street, de frente para o bulício comercial e para o lago, fica a Igreja paroquial de Inveraray, edifício neoclássico com elementos palladianos, de 1792.


O desenho original da igreja de Inveraray, previa dois locais de culto numa só igreja - um em inglês, outro em gaélico; para isso o espaço interior estava dividido a meio por uma parede, e as duas igrejas eram simetricamente opostas, cada uma com o seu pórtico de entrada. 


As duas entradas só diferem em que no frontão de uma há um relógio, no da outra um sino.

Frente Norte com relógio.


Além disso, a igreja tinha uma torre espiral ao centro, sobre a parede divisória; em 1941, essa parede e a torre forma demolidas e o espaço interior único e mais amplo.

Arkland era a parte pobre da cidade planificada de Adams, por trás da Igreja, na South Main Street; 'land' é gaélico para 'propriedade'.

Bairro pobre, mais parecem casernas de um quartel, mas foi requalificado.

A (North) Main Street, frente à igreja, reúne o comércio e hotelaria e por isso é a rua mais animada de Inveraray.

Main Street desce da Igreja directamente para o lago Fyne.

O George Hotel (1779), do arquitecto Adams, Main Street East. A ilusão funciona: a pequena povoação quase parece uma cidade.

Inveraray centraliza comércio e serviços de uma vasta região.



The Royal Burgh Café, Main Street - "wide range of Italian Coffee" !



Ao fundo de Main Street, no passeio do lago, encontra-se desde 1839 a Mercat Cross.

A rua principal vista a partir da Inveraray Cross, com a igreja paroquial ao fundo.

Esta cruz celta de 1300-1400 é um dos poucos vestígios históricos do burgo medieval; sinalizava o mercado, e pode ter sido trazida da vizinha Iona. Caso raro, está esculpida com hastes de videira entrelaçadas.


Front Street e Main Street vão terminar no Quay Close, o pátio do cais, lugar turístico onde se costumam juntar excursões.


Pier Shop já foi edifíco de correios; e a casinha georgiana por trás é o restaurante Ban-Diùc (A Duquesa), de cerca de 1800 - uma fantasia do duque de Argyll.


Também não falta junto ao cais um museu marítimo: uma escuna e um pequeno cargueiro "puffer"  (o mítico Eilean Eisdeal de 1856) que levava abastecimentos a partir de Glasgow ao longo do canal Forth and Clyde; neles se documenta o passado marítimo da Escócia.

A escuna "Arctic Penguin" e o cargueiro Eilean Eisdeal formam um pequeno museu.

Vamos até ao Castelo.

Inveraray Bridge, sobre a foz do rio Aray no Loch Fyne.

A ponte é de 1776 e atravessa os domínios do Castelo dos duques de Argyll. O orifício central destina-se a dar mais escoamento em caso de cheia.

Inveraray Castle

O castelo actual foi construído no século XVIII. É a residência do chefe Campbell, o Duque de Argyll, que ocupa actualmente uma parte do palácio, libertando uma zona de museu para visitantes.  


A arquitectura é uma mescla de elementos do barroco, neo-gótico e palladiano, lembrando o estilo do Château apalaçado francês.



Na sala de jantar, dão nas vistas as miniaturas de caravela em ouro.


Sala Victoriana.

Quarto MacArthur, dito assombrado ...

Na cozinha vitoriana, a bastante fotogénica janela ogival.

Vista sobre os jardins e o lago no "quarto escondido" de um dos torreões.

Ah, as pontes !

Frew's Bridge.

A Frew's Bridge atravessa o rio Shira nos terrenos do castelo.

Garron Bridge (1747), um dos postais da Escócia, sobre a foz do rio Shira.

'Slán', com a ponte sobre o Aray ao fim do dia:

-------------------------------------------

E em breve 'voltarei' a Itália.