domingo, 12 de outubro de 2025

Livros e Discos para o Outono

O mundo está tenebroso, de candeias às avessas, mas a edição delivros e discos nem por isso: não faltam novidades empolgantes ou no mínimo sedutoras. O negócio das gravações de música clássica não parece mau, a ver por estes exemplos, mesmo que não renda tanto como a coqueluche Taylor Swift.

Discos CD

Haydn 2032 , volume No.17


Giovanni Antonini,  Dmitri Smirnov
(violino), Orq. Câmara de Basileia 

É daqueles de que nunca se diz bem de mais: fabuloso. Tudo - orquestra, direcção, dinâmica, detalhe, solista (violino). Ainda se publicam discos assim ?!!! Que gosto. Direitinho para o meu Top. Antonini faz milagres com os basilienses. Deixo só o andante famoso do HOB VIIA:I , fatto Per il Luigi , escrito para o violinista Luigi Tomasini de Pesaro. 

E depois, Haydn era mesmo genial. A prova está aqui, esqueçamaos a Oxford, Urso, Militar e outros pastelões desses. Este é o Haydn mais precioso, criativo, bem disposto, feliz mesmo, como o das famosas nº 6-7-8. Antonini dirige com um prazer tão intenso, uma atenção, um empenho, quase lúbrico. A Sinfonia nº 13 é um mundo. Em 1763 !!! Quando Haydn dirigia os seus próprios concertos em palco, havia momentos especiais - uma melodia, um contraponto em flauta, qualquer detalhe - que o público adorava; Haydn sorria de contente e o público batia palmas, era costume nessa altura bater palmas sempre que se ouvia um trecho favorito durante um concerto. Era engraçada, essa cumplicidade entre compositor e público, que se saudavam mutuamente em plena execução.

Handel, Judas Maccabaeus

Laurence Cummings, Orq. Festival de Göttingen, coro da NDR

Sim, sim ! Laurence Cummnings, o 'nosso' director da orquestra barroca da CDM. 

Neste disco, Cummings voa um pouco mais alto com a orquestra do Festival de Göttingen,  solistas medianos, mas a sua direcção é cuidada, seguindo os pressupostos da música de Handel, mas sem instrumentios da época. No global, é a melhor gravação desta excelente obra de Handel: um oratório - quase ópera - para celebrar metaforicamente a vitória na batalha de Culloden *.

Dois momentos-chave da obra: 

Coro: See the conquering hero, que Handel retoma no ano seguinte em Joshua; ouçamos com Laurence Cummings:

A comparar com a poderosa versão de Charles Mackerras 

https://www.youtube.com/watch?v=Ok1Hqbfsn0w

Dueto: O lovely peace

Cantam em celebração o Homem e a Mulher israelitas. Não consegui a versão dirigida por Cummings, mas está ao mesmo nível esta que conta com as excelentes solistas Nuria Rial e Lucia Duchoňová, e com a orquestra barroca de Hamburgo:

É um belo hino à Paz, um entre vários que Handel compôs, e à paz justamente do povo judaico ! O libretto de Judas Maccabaeus conta a história da resistência dos Judeus aos conquistadores Sírios do Império Selêucida de Antióquia, em 169 AC, que invadiram e arrasaram o Reino da Judeia. Judas Maccabaeus foi o clérigo e general que comandou a revolta. No século II antes de Cristo, notem bem.

O episódio histórico e o personagem de Judas Macccabaeus fizeram sempre parte do imaginário cristão. As récitas em Covent Garden foram o maior sucesso de Handel, depois do Messias.

Para comparar com a mais clássica e pausada versão de William Christie, com as sublimes vozes de Sarah Connolly e Rosemary Joshua.


Dido e Aeneas , Purcell 

Joyce Didonato, Fatma Said com Il Pomo d'Oro, dir. Emelyanychev

Nem diria que esperava grande coisa de uma Dido cantada por Joyce Didonato; engano: esta gravação veio marcar uma nova referência, pela frescura interpretaiva da orquestra e pelo naipe insuperável de vozes. Toda a gente (revistas, críticos) a coloca como uma das melhores do ano. Como se diaz muitas vezes, parece que ouvimos a obra de Purcell perla primeira vez, tal é a atenção aos detalhes e a pureza do som; finalmente uma gravação "da época" com peso orquestral e sem correrias, com poucas excepções. "Trough the hills", por exemplo, resplandece de vigorosa alegria. Um regalo de audição: prenda de Natal aconselhada.

Coro: "Cupid only throws the dart" :

Fatma Said, "Pursue thy conquest, love" :

Livros

Ainda à espera de ser lidos:

Ce que prend la Mer, de Manon Fargetton

A jovem Maxine, surpreendida por memórias de um pai distante, parte à procura de respostas numa pequena ilha escocesa das Hébridas Interiores, a sul de Oban. A ilha, o mar, os ferries, a costa, os cais, um jardim improvável... O relato da viagem, entrecortado de memórias, e onde não falta a música - o pai era violoncelista.

Orkney, Amy Sackville

Continuando nas minhas míticas ilhas escocesas, 'Orkney' é um romance invulgar, mesmo estranho, que começa como conto de fadas algo folclórico e vai acabar fragmentado num desconcertante negrume, marcado pelo ritmo das ondas, das correntes, das marés. Desde o suspeito New York Times até ao insuspeito Times Literary Supplement, elogios à escrita de Amy Sackville.

Kairos, Jenny Erpenbeck

Situado em Berlim, 1986, em plena crise das Alemanhas, uma história de ciúme. engano, crueldade, polícia política, onde vive a História e memória cultural de uma época de crise. No topo das escolhas do Spectator e New York Times.

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* Em 1746, perto de Inverness na Escócia, travou-se uma brutal batalha em que o duque de Cumberland derrotou os jacobitas que, a partir da Escócia, queriam restaurar a dinastia Stuart, apoiada por França.


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