quarta-feira, 23 de fevereiro de 2022

Sitio arqueológico e museu de Nijmegen
(Noviomagus, capital da Batávia romana)


Taça romana encontrada em Dezembro passado pelos arqueólogos holandeses.

É provável não saber onde fica Nijmegen, eu não sabia quando recebi notícia da taça em vidro romana que lá tinha sido desenterrada há pouco por uma equipa de arqueólogos. Fica no sul da Holanda sim senhor, a leste de Roterdão, nas margens do rio Waal junto à fronteira alemã - uma região pouco frequentada pelo turismo. Quando estive na Holanda, não sabia, e perdi uma das mais interessantes cidades do país.

Grote Markt, no centro de Nijmegen.

Nijmegen tem sítios arqueológicos ainda em exploração e um surpreendente Museu recheado de peças dos séculos I a IV. Afinal, trata-se da antiga Noviomagus, cidade romana de apreciável dimensão e importância estratégica.

Modelo de Noviomagus, Museu de Nijmegen


De nome completo era Ulpia Noviomagus Batavorum, fundada cerca de 104 AD. Anteriormente fora uma cidadela, Oppidum Batavorum, situada no alto das elevações sobre o rio Waal, e capital romana da Batavia até  69 AD, quando foi destruída pelo fogo.

Traiectum = Utrecht, Turnacum = Tournai.

Noviomagus era uma cidade a sério, onde se centralizava toda a Germania Inferior. Controlava o Limes Germanicus na região da Batávia, o limite nordeste do Império no continente. Pelos meados do século II atingiu  5000 a 6000 habitantes, ganhou estatuto de municipium, ou seja, os habitantes eram cidadãos romanos. Acabaria abandonada no século III, talvez pela incursões germânicas que obrigaram a uma reorganização da defesa dos Limes.

As excavações no sítio começaram em 1914.  A mais recente descoberta é a taça de vidro azul, que é um tesouro sobretudo pelo estado pristino, parece feita agora ! Nem riscos nem esbotenadelas nem rachas. 

Vejamos então.


O Museu Het Valkhof em Nijmegen é um edifício marcante, bem localizado dentro de um parque, mas o maior valor está nos achados arqueológicos que contém vindos de seis povoados romanos na região da Batávia.


"Pilar dos Deuses", em honra do imperador Tiberius, com 4 faces - Apolo, Diana. Ceres e Victoria (com Tiberius) (~17 DC)

Uma das peças mais admiráveis é este elmo de cavaleiro em ferro e bronze.


Encontrado no rio Waal, 2ª metade do século I.


Uma molheira de prata mostra o requinte de alguns romanos à mesa:

Encontrada no sítio de Berg en Dal, nos arredores da cidade.

Destaca-se pela sua beleza e valor esta taça de prata romana de 27 AC :



Mas gosto ainda mais desta garrafa de vidro decorada com entrançado de vidro que foi descoberta na sepultura de uma mulher, provavelmente de classe alta. 


Executar uma decoração deste tipo é complicado, requer uma técnica rápida e muito precisa a quente.


Um verdadeiro tesouro.


De resto, uma das riquezas do museu é a enorme colecção de vidros romanos, como estes invulgares pássaros (perdizes?) cuja cauda foi quebrada para obter o perfume que continha.


As excavações continuam a dar frutos. A taça de vidro com pelo menos 1800 anos sem riscos nem rachas é a nova peça de estimação. 


É de origem romana, mas não de produção local, será talvez de Castra Vetera, cidade vizinha na Germania, ou poderá ter sido trazida de Itália por algum comerciante ou algum legionário Bátavo reformado do exército romano.

A Batávia Romana e a sua capital Noviomagus tiveram um papel fundamental no povoamento do território que hoje conhecemos como Holanda. Pode não se notar muito agora, mas na sua origem foi um país da esfera latina !



sábado, 12 de fevereiro de 2022

Devaneios no Loch Fyne: Inveraray e as pontes

Sonhar, talvez sonhar.

A enorme Escócia - um nunca mais acabar de lagos e fiordes e vales, centenas de ilhas, e umas quantas vilas costeiras irresistíveis - é, juntamente com Itália, a  Europa de que mais gosto. Tem um dos seus recantos mais genuínos em Inveraray, no Loch Fyne. É como mergulhar num livro romântico, para fora deste mundo, irreal. 

Vista do alto de Dùn na Cuaiche

Nem falta o inevitável castelo de conto de fadas. Acho que este deve ser um bom refúgio quando se aproximar o fim do mundo; ao que dizem, está próximo.😄

Inveraray (gaélico: Inbhir Aora)

População:    ~700
Coordenadas: 56°14′ N, 5°04′ W

A avenida planeada com acesso de Front Street por uma grandiosa arcada. À  esquerda, Main Street, a rua comercial.

O burgo foi criado por Jaime III em 1474, e subiu a Burgo Real em 1648 com Carlos I; mas a actual Inveraray foi planeada no século XVIII (1772-1800) pelos duques de Argyll, do aliás mal afamado Clã Campbell. Os arquitectos John Adam e Robert Mylne, contratados para traçar o novo espaço urbano, desenharam duas vias principais, paralelas à linha de água: The Avenue (um fiasco!) e Main Street, onde se alinha um luminoso casario branco, num estilo Georgiano elegante e bem proporcionado. A rematar, em ãngulo recto, uma frente para o lago que proporciona o perfil mais divulgado da vila.

Começo pela vista da frente para o lago.


The Inveraray Inn (antigo Argyll Hotel, de 1757), entre arcadas, é um dos prédios mais relevantes. À direita, a Bell Tower.

Front Street

'The Courtyard', Front Street,1757. Antes foi Alfândega, Tribunal, Escola e Prisão - era a Townhouse.

Avenue Screen Wall, 1788 - as portas de entrada com três arcos para a falhada 'Avenida' residencial, ao lado da pousada.
 
Há pouco restaurada, é património classificado.

No alto da Main Street, de frente para o bulício comercial e para o lago, fica a Igreja paroquial de Inveraray, edifício neoclássico com elementos palladianos, de 1792.


O desenho original da igreja de Inveraray, previa dois locais de culto numa só igreja - um em inglês, outro em gaélico; para isso o espaço interior estava dividido a meio por uma parede, e as duas igrejas eram simetricamente opostas, cada uma com o seu pórtico de entrada. 


As duas entradas só diferem em que no frontão de uma há um relógio, no da outra um sino.

Frente Norte com relógio.


Além disso, a igreja tinha uma torre espiral ao centro, sobre a parede divisória; em 1941, essa parede e a torre forma demolidas e o espaço interior único e mais amplo.

Arkland era a parte pobre da cidade planificada de Adams, por trás da Igreja, na South Main Street; 'land' é gaélico para 'propriedade'.

Bairro pobre, mais parecem casernas de um quartel, mas foi requalificado.

A (North) Main Street, frente à igreja, reúne o comércio e hotelaria e por isso é a rua mais animada de Inveraray.

Main Street desce da Igreja directamente para o lago Fyne.

O George Hotel (1779), do arquitecto Adams, Main Street East. A ilusão funciona: a pequena povoação quase parece uma cidade.

Inveraray centraliza comércio e serviços de uma vasta região.



The Royal Burgh Café, Main Street - "wide range of Italian Coffee" !



Ao fundo de Main Street, no passeio do lago, encontra-se desde 1839 a Mercat Cross.

A rua principal vista a partir da Inveraray Cross, com a igreja paroquial ao fundo.

Esta cruz celta de 1300-1400 é um dos poucos vestígios históricos do burgo medieval; sinalizava o mercado, e pode ter sido trazida da vizinha Iona. Caso raro, está esculpida com hastes de videira entrelaçadas.


Front Street e Main Street vão terminar no Quay Close, o pátio do cais, lugar turístico onde se costumam juntar excursões.


Pier Shop já foi edifíco de correios; e a casinha georgiana por trás é o restaurante Ban-Diùc (A Duquesa), de cerca de 1800 - uma fantasia do duque de Argyll.


Também não falta junto ao cais um museu marítimo: uma escuna e um pequeno cargueiro "puffer"  (o mítico Eilean Eisdeal de 1856) que levava abastecimentos a partir de Glasgow ao longo do canal Forth and Clyde; neles se documenta o passado marítimo da Escócia.

A escuna "Arctic Penguin" e o cargueiro Eilean Eisdeal formam um pequeno museu.

Vamos até ao Castelo.

Inveraray Bridge, sobre a foz do rio Aray no Loch Fyne.

A ponte é de 1776 e atravessa os domínios do Castelo dos duques de Argyll. O orifício central destina-se a dar mais escoamento em caso de cheia.

Inveraray Castle

O castelo actual foi construído no século XVIII. É a residência do chefe Campbell, o Duque de Argyll, que ocupa actualmente uma parte do palácio, libertando uma zona de museu para visitantes.  


A arquitectura é uma mescla de elementos do barroco, neo-gótico e palladiano, lembrando o estilo do Château apalaçado francês.



Na sala de jantar, dão nas vistas as miniaturas de caravela em ouro.


Sala Victoriana.

Quarto MacArthur, dito assombrado ...

Na cozinha vitoriana, a bastante fotogénica janela ogival.

Vista sobre os jardins e o lago no "quarto escondido" de um dos torreões.

Ah, as pontes !

Frew's Bridge.

A Frew's Bridge atravessa o rio Shira nos terrenos do castelo.

Garron Bridge (1747), um dos postais da Escócia, sobre a foz do rio Shira.

'Slán', com a ponte sobre o Aray ao fim do dia:

-------------------------------------------

E em breve 'voltarei' a Itália.