quarta-feira, 2 de março de 2022

Uzhgorod (У́жгород), bela Ucraniana

Homenagem à Ucrânia, muito modesta mas à minha maneira.

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Além de duas etnias, de língua russa e ucraniana, existem três culturas na Ucrânia: uma de herança bizantina e Austro-Húngara e profundamente europeia, que podemos centrar em Lviv e vai até cerca de Vinnitsya, deixando Chernobyl, Kiev e Odesssa de fora; outra centrada em Kiev e herdeira do Rus' (Ruténia), portanto misto de escandinava (varegues ou varangianos) e eslava, mais arreigadamente nacionalista ucraniana; e a faixa cossaco-russa de leste, que nem sequer se sente europeia, são na maioria eslavos orientais, dos quais uma minoria de saudosos do império russo e sobretudo soviético. É a estes que Putin quer *salvar", mas não consta que a Amnistia Internacional tenha detectado "racismo" e muito  menos "nazis", termo que Putin usa em vez de "anti-russos". 

Mas não não é por esta heterogeneidade que a Ucrânia será um país inviável; muitos outros têm história mais complexa e mistura de etnias e culturas, sendo a própria Rússia um exemplo disso, muito menos 'nação' que a Ucrânia, povoada de etnias ao longo da Sibéria que aliás foram sempre muito mal tratadas.

Agora vou dar mais relevo à Ucrânia de raiz europeia, visitando Uzhgorod (ou Uzhhorod), uma cidadezita no extremo ocidental vizinha da Eslováquia. Fica no ro Uzh, e a ponte pedonal que atravessa o rio liga os dois lados da cidade histórica.

Uzhgorod

Com 120 000 habitantes, é uma cidade pacata, pedonal, agradável, com fama de muito florida de cerejeiras e magnólias, e algum património histórico e cultural que vou mostrar.

Duas ruas principais atraem que visita a cidade: Korzo (como o Corso em Itália) e Voloshyna.

Vulytsya (rua) Korzo, cruzamento com a Vul. Voloshyna.

Largos passeios, rua florida.



Cafe Fabbrica Drugetti

Na esquina, com vista para a igreja de S. Jorge

Alguma boa arquitectura.

Sobre os telhados da Voloshyna, as torres de Uzhgorod.

A Igreja jesuíta dedicada a S. Jorge, neo-barroco do século XVIII.

Rua Voloshyna.

Na esquina das rua Korzo com a Voloshyna há uma homenagem ao Tio Koli, o homem que durante 40 anos percorria a cidade ao fim do dia para acender as lanternas. 

Tio Koli, obra de Mikhail Kolodko

Um dos edifícios mais estranhos é a antiga sinagoga ortodoxa, em estilo mourisco. Foi adaptada a sala de concertos para a Filarmonia local. Sim, Uzhgorod tem uma orquestra: a Filarmónica Regional da Transcarpátia.

Aqui em Maio, quando Uzhgorod está florido.






Igrejas há, como é de prever, muitas, mas não valem a visita. A Catedral é esta Igreja-Mosteiro grega da Santa Cruz, gigantesca e feia como Mafra:




A ponte e as ruas centrais de Uzhgorod têm vindo a ser decoradas com mini-esculturas do escultor Mikhailo Kolodko (n. 1978): são caricaturas de figuras históricas ou de símbolos culturais, como por exemplo, na ponte pedonal, esta "Liberdade":



Ou este Liszt:


A cidade é dominada pelo inevitável castelo, uma cidadela-fortaleza sobre o rio Uzh.




Foi entre 1322 e 1691 a residência da família italiana Drugeti, que construiu o palácio à maneira renascentista.


Os Drugeth (ou Drugetov) vieram da Apúlia para a Hungria no século XIV, e graças a serviços prestados receberam da coroa vastos domínios em Horiany.


Um dos mais procurados e conhecidos cafés de Uzhgorod é o Café Pid Zamkom, "Sob o Castelo", na rua Ol'brakhta. Além de ocupar uma casa que foi moínho, reúne uma colecção impressionante de velharias que decoram profusamente o espaço, desde alambiques a máquinas de filmar e salamandras.

Imperdível.


Máquina "expresso" vintage.

Lipova Aleja

Antes de sair do centro, um dos sítios mais agradáveis de Uzhgorod: a Avenida das Tílias (Lipova Aleja), ao longo das margens do rio Uzh. Dizem que é o mais longo túnel de árvores da Europa, e está (estava?) muito bem cuidado, como uma preciosidade.


A Lipova Aleja estende-se por mais de 2 Km nas margens do Uzh, e foi criada em 1928, quando o território pertencia à Checoslováquia.  Centenas de tílias de diferentes variedades, e agora também cerejeiras Sakura, oferecem desde Maio um espectáculo de intenso colorido. 




Esta Ucrânia é verdadeiramente uma Europa de que gosto ! Ruas pedonais, cafés, castelo, parque ao longo do rio... Mas melhor ainda:



A Igreja medieval de Santa Ana em Horiany (ou Goryanska)


A ábside "redonda" é de facto hexagonal, como é evidente no interior.

Esta sim, é a maior riqueza patrimonial de Uzhgorod. Trata-se de um pequeno templo gótico de uma só nave e ábside em ''rotunda', cuja datação tem sido muito polémica - será entre o século X e o século XIII, com maior probabilidade do séc. XI. É um templo único em toda a região da Trans-Carpátia, num lugar onde talvez houvesse um castelo.


Durante trabalhos de restauro no século XIX foram descobertos frescos murais do início do Renascimento, próximos do estilo da escola de Giotto  - foram datados entre o século XIII e XIV. Mais uma influência italiana devida à presença da família Drugeti.




Pronto, não vou prolongar mais esta visita, mas ainda havia um Museu regional trans-cárpato, uma Igreja barroca em madeira de S. Miguel, a Galeria Gorchichnoye Zerno ("Grão de Mostarda"), o Jardim Botânico...

Termino com o passeio das cerejeiras, um vídeo...



e música: 
Agnesa Bachinsky (flauta), Ekaterina Gajo (piano) e Diana Havata (cello), Haydn - Trio Hob. XV 
na sala da ex-Sinagoga de Uzhgorod 

Salvé, Ucrânia !

2 comentários:

Fanático_Um disse...

Que beleza! Espero estar enganado, mas temo que possa vir a ser destruída por estes dias. Quem imaginaria ser possível no nosso Século, na Europa, um ditador genocida, sanguinário e seguramente louco, destruir um País irmão alegando argumentos, no mínimo, risíveis, se a situação não fosse tão trágica. E esperemos que a loucura pare por aqui...

Mário R. Gonçalves disse...

Estou a tentar mostrar porque a Ucrânia é de seu direito um verdadeiro País, com História e Cultura. Até final de 2021 ninguém imaginava isto a acontecer, os votos eram de um melhor 2022 com o Covid derrotado e a vida a voltar ao normal. Pandemia, crise climática, guerra - estamos a travessar um período terrível, sobretudo na Europa, que até tem reagido com valentia. Se Putin é que é um líder "forte", dispenso os líderes fortes. Abraço, bem estar e sossego, Fanático_Um.