quinta-feira, 1 de setembro de 2022

Sempé: as ilustrações para o Sr. Sommer de Süskind


Não segui a carreira de Jacques Sempé desde cedo, só há poucos anos o descobri no Le Point e desde então procurei conhecer mais obra dele. É Arte, aquilo que Sempé fazia, obras únicas e inconfundíveis, respirando ironia e ternura num traço imprevisível, nada óbvio.

O prazer de 'voar' com a ventania, encosta abaixo

Ou subir às árvores e ver a extensão do mundo

Foi ao ler a História do Sr. Sommer de Patrick Suskind que tive um dos melhores contactos com Sempé, pelas 24 aguarelas com que ilustrou a narrativa do estranho senhor, que vendo bem nada tem de estranho - é o nosso desespero de vida.


Com mochila às costas e empunhando um cajado, ele anda pelos caminhos em volta do lago sem destino nem propósito, num passo rápido, como uma sombra. Toda a descrição parece uma historinha infantil, com um personagem excêntrico que de início faz sorrir.



Muitas vezes o jovem narrador, nos seus passeios a pé e depois de bicicleta, avista o sr. Sommer na sua permanente corrida para sítio nenhum.


O encontro mais dramático aconteceu uma vez, de carro com o pai, durante uma violenta tempestade de granizo.

"Mas agora, conduzindo debaixo de chuva, na estrada rural coberta de granizo, seguindo a par do senhor Sommer, o meu pai tinha gritado pela porta aberta do carro uma frase feita: «Está a pôr a vida em perigo!» Então o senhor Sommer deteve-se. Creio que foi ao ouvir «jugarse la vida», e parou tão bruscamente que o meu pai teve de travar a fundo para não o deixar para trás. E então o senhor Sommer passou o cajado da mão direita para a esquerda, voltou-se para nós e, com voz clara e forte, golpeando o chão várias vezes com fúria e desespero, gritou: "De uma vez por todas, deixem-me em paz!" E mais não disse. Só isto. De imediato bateu com a porta que lhe tínhamos aberto, voltou a trocar a vara para a mão direita e seguiu caminhando sem olhar para para trás."

A tonalidade trágica vai crescendo ao mesmo tempo que o narador cresce de criança para adulto. A fantasia inicial acaba por dar lugar à celebração da morte.


Jacques Sempé trabalhou para várias publicações, mas talvez a "obra prima" seja Enfances:





1 comentário:

Tink disse...

Meu querido Sr Sommer e a sua mochilinha...Bom recordar.