------ baseado num artigo de Benoît Vitkine no Le Monde de 28 de Janeiro ------
Larysa Petrivna é o nome verdadeiro da poetisa ucraniana Lesya, Леся Українка (1871-1913), que ainda é lembrada em Moscovo numa estátua situada numa avenida nobre e central, ainda denominada 'Ukrainska Boulevard'. Não será por muito tempo, parece-me, pois é ali que alguns cidadãos vão depositar flores na derradeira manifestação possível de solidariedade em Moscovo. Flores, mas não só: peluches, brinquedos, velas acesas, aos pés da Lesya dos ucranianos, promovida quase a divindade.
Desda o bombardeamento de Dnipro a 14 de Janeiro, este passou a ser o ponto de encontro dos que se opoem à "operação especial". Escreve Benoît Vitkine:
"É um exercício terrivelmente solitário. Uma mulher avança, tem dois cravos vermelhos na mão. Ajoelha-se demoradamente, e quando se levanta tem os olhos inchados de lágrimas e a respiração ofegante. Nada de teatral, não é representação. As únicas testemunhas visíveis são dois polícias a alguns metros, num veículo de lâmpada rotativa acesa. A respiração ofegante é da dor e do medo."
Le Monde, 28/1/2023
"Quando se dá conta de nós jornalistas, precipita-se com o smartphone estendido: 'tirem-me uma foto, para eu mostrar aos que não acreditam que ainda é possível.' (...) É no filho que ela pensa ao depositar as flores: 'não quero que ele viva num país parecido com o Irão, não quero que crianças ucranianas da idade dele continuem a morrer. '(...) 'Eu tinhe de vir, também por mim, para me poder respeitar, para que o mundo saiba que nem todos os russos apoiam este horror.' Ninguém sabe quem levou o primeiro raminho; depois desse, muitos outros se seguiram , apesar das detenções. Todas as noites, as flores desaparecem, levadas por desconhecidos; cada dia, a pequena montanha de flores é reconstituída."
" Numa só hora, neste dia 24 de Janeiro, quatro pessoas vieram depositar ramos, e depois retiraram-se; outras hesitam; uma mulher aproxima-se e recua ao ver a polícia; um jovem dá várias voltas à estátua, como que a apalpar o terreno; uma mulher mais corajosa pergunta em voz alta: 'temos direito a colocar flores ?' O polícia encolhe os ombros."
Sobre Lesya:
http://athena.pt/2021/05/14/a-potente-voz-de-lesya-ukrainka-ukrainka
https://www.unesco.org/en/articles/lesia-ukrainka-path-love-fight-and-hope
Sapho
No topo da rocha, sobre as ondas
uma bela jovem se queda
coroada de refulgentes louros
tem nas mãos a melódica lira
E é uma canção de tristeza
que ela agora na lira acompanha
ao coração lhe sobe uma mágoa
que lhe pesa na voz ao cantar
Fala da majestosa glória
Lembra a beleza do mundo,
a gente perversa, o amor
e a traição, os anos de lástima.
Esperança e desespero... a jovem
dilacera a coroa de louros
e no clamor das ondas do mar
encontra o fim da canção.
Lesya Ukrainka, 1884
[tradução combinando traduções francesa, inglesa e espanhola]
A escravidão ainda é mais ignóbil quando é livre.
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