segunda-feira, 10 de fevereiro de 2025

Os bonitos 'pueblos marineros' de emigração 'indiana' na ria de Ares, Galiza.


As muitas rias, altas e baixas, da Galiza são no conjunto lugares de riqueza paisagística e de património urbano que é uma imensa sorte ter por perto, embora nem sempre sejam de acesso rápido. Até as águas calmas e não-tão-frias e algumas bonitas enseadas de areia superam de longe a triste parolice nova-rica do Algarve, tanto mais que ainda se tem sossego, muito mais do que bulício. Para mim, só tem contra: a ventania, que só raramente dá tréguas, e o nevoeiro ou chuvita, demasiado frequentes .

Ao fundo da ria, Ares.

A ria de Ares é uma das menos apelativas para o turismo - acessos tortuosos, hotelaria fraquinha - mas muito popular pelas festas com comezainas, a maioria delas no Verão; e é lugar dos ' pueblos marineros ' , povoações fundadas por emigrantes de torna-viagem das Américas no início do século XX, alguns deles regressados com as finanças em alta; a arquitectura popular dos trópicos nota-se nas varandas, no colorido das casas. nas praças. Esta herança é conhecida como "Património Indiano", por serem assim conhecidos os povos das "Índias Ocidentais", neste caso Argentina, Uruguai, Cuba ou Florida. É um fenómeno bem mais vasto e valioso que o caso português das "casas de brasileiro", ou mais recentemente dos "chalés suíços".

As povoações de Ares e Redes são as mais interessantes.

Ares
É a 'sede' das comemorações anuais do Património Indianoem Agosto, que por mim evitaria a todo o custo. Mas é certamente um prazer passear pelas 'Caraíbas' poucos quilómetros a Norte de Portugal.

Plaza da Igrexa

A Igreja de San José de Ares data de 1721. A Torre do Relógio anexa tem uma cúpula cimeira em forma de pérgola. Um relógio de Sol moderno de mármore travertino foi instalado na fachada lateral.


Da Praça irradiam, frente à Igreja, a Rúa Real, Rúa os Anxos e Rúa María, onde se concentra quase todo o património 'indiano'.

A casa nº 2 , à entrada da Rúa Real

Casas irmãs Ramos Bugallo
Rúa Real, 64-66

Nos dois lados desta rua estreita alinham-se vivendas 'índianas' das décadas de transição de século XIX - XX, desde o início frente à Igreja até cerca do nº 80. Foi já após 1920 que as duas irmãs Bugallo, casadas com emigrantes em Cuba, fizeram na sua fachada estas galerías policromadas modernistas por onde a luz entra matizada.

Casa de Nicolás López Cancela
Rúa Real, 73

Vivenda familiar construída pelo emigrante Nicolás López Cancela. Destacam-se as duas galerias envidraçadas com varanda central em ferro forjado, e uma bonita sanefa corrida a decorar a cornija.


E pela rua adiante não faltam mais exemplos de varandas e galerias. Ares teve uma época áurea nas décadas anteriores a 1940, muito visível na Praza da Constitución, entre as rúas Real e os Anxos.


Rúa María

Nesta rua há várias frentes corridas de vivendas com varanda de madeira, como esta no nº 89.

No passeio marítimo junto à praia, outro invulgar edifício:

Casa de António Vilar
Rúa Fomento 2 / Av. Saavedra Meneses, 20



Antonio Vilar regressou à Galiza e decidiu converter uma fábrica de salga, de arquitectura italiana, numa moradia frente ao mar. Ficou pronta em 1884.

A "Sirena de las Mirandas", estátua em bronze, foi instalada na praia há poucos anos, frente à galeria envidraçada.

Recorda uma lenda local sobre uma sereia que vivia nos ilhéus Mirandas, na ria em frente a Ares.



Embora Ares tenha dado o nome e seja uma vila de 6 000 habitantes, o pueblo marinero mais vistoso é Redes, uma aldeia piscatória com menos de 300.

Redes


Mais pequena, parece uma aldeia para turistas quando de facto é uma vila piscatória, genuinamente 'marinera', onde a influência centro- e sul-americana ainda se faz sentir mais intensa.

Redes nasceu da ría, ainda há casas com acesso à água por escadaria; em frente, os mastros de estender redes.

O centro da vila é a Plaza do Pedregal, que se abre para a ria, pois ali se encontra o tradicional cais dos barcos de pesca.


Casa Azul , com um torreão de três pisos e cornija saliente, é a marca mais vistosa - e até excessiva - em todos os ângulos da Praça. Mas a casa mais bonita é a Casa de Concha Amado, na esquina da Av. Gaspar Rodrigues (nº 84).




É uma casa modernista de 1894, atribuída a dois arquitectos portugueses.


Toda esta praça é um regalo de arquitectura.


Há na aldeia quatro ruelas estreitas com casas 'indianas': as ruas Arriba, Media, Abaixo, Nova e Ribeira. Dessas não consegui fotografias com qualidade para mostrar... vamos deixar Redes por aqui.

Av. Gaspar Rodrigues, a abrir na Plaza do Pedregal.


2 comentários:

SilverTree disse...

Nem de propósito, estou a preparar uma visita à Galiza em Maio. Que boas sugestões. Tenho sempre continuado a lê-lo e acompanhá-lo com gosto, mesmo se ando preguiçosa nos comentários. Este continua a ser um dos meus cantos favoritos da internet, e um pequeno oásis no meio da loucura que aí anda. Um abraço!

Mário R. Gonçalves disse...

Que bom tê-la por aqui, Inês. Continua a publicar poesia que leio e releio, desinquietante. Pois a Galiza tem muitos encantos, na costa e no interior. Vai ficar encantada com o mar e as ilhas, a costa e o pueblos. Duas recomendações pessoais de sítios que me fizeram feliz: Corcubión , perto do cabo Finisterra; e sobretudo Betanzos, a sul de Ferrol e perto destes dois pueblos que aqui refiro. Betanzos é dita capital do gótico na Galiza (igreja notável), e também oferece uma rara concentração de galerias envidraçadas num ambiente tardo-medieval.
Há também sítios a evitar, se quiser mais conselhos diga.