- 1816, o ano em que não houve Verão -
Era o primeiro ano de paz depois de Waterloo, que acabou com as multisseculares guerras anglo-francesas e em particular as Guerras Napoleónicas, e na Europa respirava-se alívio, contava-se com um bom ano agrícola e com melhoria da vida.
A 10 de Abril de 1815, uma erupção catastrófica eclodiu no Monte Tambora na ilha de Sumbawa, Indonésia. Os últimos 1500 metros de altura do cone foram pulverizados, num rebentamento de uma dimensão descomunal, ouvido a mais de 3000 km ! Seguiu-se um tsunami, aumentando as vítimas para mais de 10 000, soterradas ou afogadas.
A montanha perdeu 1500 m de altura, o seu pico (imagem AI)
Pelas 19 horas a erupção atingiu o máximo, quando três plumas vulcânicas se fundiram numa só, toda a montanha parecia um jorro de fogo líquido. Para a maioria dos cientistas, terá sido a mais destrutiva erupção vulcânica desde que há registos
450 km3 de poeiras e calhaus foram expelidos, juntamente com 60 megatoneladas de enxofre. Ao subir e espalhar-se pela atmosfera, uma densa nuvem negra provocou o obscurecimento da luz solar, e um arrefecimento global entre 5 e 8 ºC no Hemisfério Norte. Sem luz solar, a produção agrícola foi arruinada, a fome e as doenças dizimaram as populações ainda durante esse ano; mas as poeiras finas abrangeram quase todo o Hemisfério Norte, causando prolongados crepúsculos e pores-do-sol, de cor intensa entre o alaranjado e o púrpura.
Caspar David Friedrich, Two men by the sea, 1817Logo em 1815, um nevoeiro seco persistente e avermelhado cobriu parte dos Estados Unidos; em 1816 a Europa e América do Norte sofreram geadas e nevões em Junho, Julho e Agosto.
O fenómeno, agora denominado "inverno vulcânico", foi agravado ainda por uma anormal redução da actividade solar, atingindo um mínimo de sempre de radiação em Maio de 1816.
Weymouth Bay, 1816 , John ConstableO "ano sem verão" arruinou todas as colheitas, sucessivas e violentas monções assolaram a Índia e a China, a fome, o frio e as epidemias alastraram pelo Hemisfério Norte. O pior ano do século XIX.
Semanas passaram a meses sem que o sol aparecesse a romper, havia só chuva torrencial e trovoadas. Na Irlanda registaram-se 8 semanas de chuva sem parar.
Lord Byron, a viver na Suíça (que foi severamente atingida), descreveu no poema apocalíptico "Darkness" esses dias em que "as galinhas recolhiam à capoeira ao meio dia e tinha que se acender as velas como se fosse meia noite" :
I had a dream, which was not all a dream.
The bright sun was extinguish'd, and the stars
Did wander darkling in the eternal space,
Rayless, and pathless, and the icy earth
Swung blind and blackening in the moonless air;
Morn came and went—and came, and brought no day.
Tive um sonho, que não foi em tudo um sonho.
O luminoso sol extinguiu-se, e as estrelas
Vageavam sombriamente no espaço eterno,
Não irradiavam, não tinham rumo, e a terra gelada
Vacilava cega e enegrecida num ar sem lua;
A manhã veio e foi - e veio, e não trouxe dia.
Come era de esperar, as predições de "fim do mundo" abundaram, agravadas pelo aparente apagamento do Sol, e não faltaram citações bíblicas a fundamentar essa crença.
Do Monte Tambora resta hoje uma vasta cratera, que se inunda de água da chuva formando um lago de dimensões variáveis.
O Tambora tinha 60 km de diâmetro na base, são quase 3000 km2 ! O cone expelido de 1500m de altura tem que se juntar outro tanto do interior da cratera, e tudo a somar ao jactos piroclásticos.
Para saber mais:
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Agora talvez perguntem porque fiz este post. Acontece que este quadro de Turner (uma reprodução) é justamente o que tenho à cabeceira da cama, e sempre estranhei aquela cor alaranjada do céu e do reflexo na água. Está tudo explicado: o quadro refere-se a 1817.
Chichester Canal, ca. 1828, J.M.Turner
Boa noite!
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