domingo, 28 de setembro de 2025

O vórtice Swelkie, as marés furiosas em Pentland Firth, e a Ilha de Stroma onde já ninguém quer viver.


Publiquei há 2 semanas um post sobre Wick e Thurso, na região de Caithness, a mais setentrional da Escócia. Ora sucede que entre esta região e as Ilhas Orkney, poucas milhas marítimas mais a norte, há coisas de que vale a pena falar porque ninguém delas fala.

O mar de Pentland Firth frente ao farol de  Holborn Head.

Entre as duas minúsculas e desabitadas ilhas de Stroma (Caithness) e Swona (Orkneys), o Atlântico Norte é particularmente selvagem, com marés violentas, das mais bravias no Planeta, e um redemoínho famoso, o Swelkie (de 'Svelgr', significa "engolidor" !). 


Este mar é conhecido por Pentland Firth (do nórdico Petlandsfjörð), que significa O Estreito dos Pictos, o povo nativo da Escócia conhecido pelas grandes Pedras gravadas e pela resistência aos Romanos que os obrigou a construir um muro de defesa.

O vórtice Swelkie, por seu lado, forma-se a Norte de Stroma nas duas marés - vazante e enchente. Quem alguma vez lá passou não tem vontade de voltar, diz o 'British Islands Pilot', manual náutico da Marinha americana. 

O Swelkie, vórtice marítimo no Atlântico Norte, ao largo da Ilha de Stroma.

Tal como o seu irmão Maëlstrom mais a norte junto às ilhas Lofoten, o Swelkie foi o terror de muitos marinheiros de pequenos barcos e assusta até navios maiores.


É criado pelas correntes de maré entre as duas ilhas, não sendo para admirar que Stroma é a mesma palavra que Stream, corrente; Stroma (Strøm Ø) é literalmente a Ilha das Correntes. 

O mar 4 a 5 km a norte de St John's Point é a pior zona de correntes

Será escusado dizer que é muito difícil viver em Stroma ou Swona, pequenas ilhas rasas, plataformas sem altitude, varridas pelas ventanias e impossíveis de alcançar ou de serem abastecidas em dias de mar bravio. O mar de Pentland tão depressa é navegável como sofre tempestades violentas e tremendas marés, como um mar em ebulição, fervilhando de torvelinhos, correntes, ondas, tudo à luta com ventos contrários. 


Navegar no Pentland Firth é de evitar sempre que possível. A parte pior é um percurso 4-5 km a norte da Ponta de St. John, onde as correntes para Oeste atingem 16 nós e as vagas surgem de todos os quadrantes, sem que se consiga um rumo estável.

Barco salva-vidas da RNLI* (40 ton., 1998) no Pentland Firth

O ferry Claymore da Caledonian MacBraide (1600 ton.) não teve vida fácil nestes mares.

Em Janeiro de 2015, o cargueiro MV Cemfjord, que transportava cimento, afundou subitamente sem SOS nem qualquer outro alerta, com a perda total da tripulação. Ainda hoje se desconhece a causa, mas certamente houve erro de navegação por parte de quem pilotava; um ferry que passou perto testemunhou ondas de 10 metros, e teve de fazer frente a uma maré sob tempestade "extraordinariamente violenta". O navio deveria ter evitado essa rota, muitos outros tinham adiado a travessia devido às previsões de mau tempo.

O MV Cemfjord, de 1984, era um navio de 80 m, 1800 toneladas.

O naufrágio deu-se justamente na área a Norte da Ponta de St. John, com correntes para Oeste de 7-8 nós e rajadas contrárias de 100 km/h.


O naufrágio do MV Cemfjord:

Pentland Firth já foi objecto de estudo como fonte de energia. É como um grande funil oceânico, gera a mais poderosa energia de marés do planeta ! No seu máximo de correntes de maré, cerca de 30 km/h (16 nós), as ondas de maré de vários metros poderiam gerar mais de 8 Gigawatts, uma coisa colossal - 15 vezes mais que Alqueva, quase o dobro da Nuclear de Zaporizhzhya ! Seria a maior fonte de energia renovável do Reino Unido, chegava e sobrava para Londres. Outras vantagens incríveis: é regular, previsível, com dois picos máximos em cada 24 horas, permitindo garantir anos de abastecimento sem falha. No mínimo, obter 1 Gigawatt é o objectivo actual.

Ilha de Stroma

Coordenadas : 58° 41' N, 3° 7' W
Área: 375 ha (menos de 4 km2)
Habitantes: 0




Ondas rápidas de maré, correntes e torvelinhos tornam o acesso à ilha muitas vezes problemático. A sul, há um pequeno porto mais protegido das correntes, The Haven. 

Acima do pequeno cais, as casas abandonadas the Uppertown, que eram habitadas por pescadores e criadores de gado.

No seu auge, em 1724, houve 47 famílias permanentes na ilha, 200 a 300 pessoas, a trabalhar para a família Sinclair que era proprietária do terreno. Ocupavam-se sobretudo com as ovelhas e as pastagens, mas o maior lucro era do contrabando de bebidas alcoólicas. Era uma vida de terrível isolamento, várias semanas seguidas sobretudo no Inverno ou sob tempestades; tudo melhorou um pouco em 1824 com a construção do cais de acostagem.


Mesmo assim, sem água nem luz, sem escolas, era obrigatório um vai-vém constante e muita despesa. Foi-se despovoando, a única loja fechou em 1956, o posto de correio em 1958, a última família saiu em 1962. 


Já nem o faroleiro lá mora - o farol é automatizado desde 1961 - só aventureiros, investigadores marinhos e o dono da ilha, proprietário também do único barco e das ovelhas.


Farol no extremo Norte perto do Swelkie, porto e casas abandonadas na costa sul e leste. 

É neste canal que começaram a funcionar as primeiras turbinas de maré, ao largo das rochas Merry Men of Mey, junto à Ponta de St. John.

Ilha de Swona

Ainda mais pequena, esta ilha das Orkney também teve o seu período de ocupação, bem mais antiga, desde os Neolítico, e mais tarde com os Vikings.


Sendo mais fácil de abordar, com um bom abrigo a leste e bons pastos, esteve ocupada até 1974; pequenas casas de quinta eram habitadas por famílias de criadores de gado. 

'Rose cottage', a casa dos dois últimos habitantes

O Loch Tarf à esquerda, e as rochas Tails of the Tarf onde se formam também redemoínhos perigosos. Assinalado a vermelho, o Cairn.

O mais relevante em Swona é talvez a câmara funerária do Neolítico, rodeada de um 'cairn' de lajes verticais,  chamado "Chambered Cairn at Tarf".


En Swona, o melhor porto de abrigo é a nordeste, The Haven.

O Projecto de Energia de Marés da MeyGen

O projecto britânico já arrancou, numa fase experimental, ainda com uma produção modesta. Foram marcadas três linhas no fundo marinho para assentamento de turbinas:


As primeiras 6 turbinas, colocadas entre a Ilha de Stroma e a costa a uma profundidade de 40 a 60 metros, geram 6 MW ;  turbinas de um modelo mais potente foram instaladas na 2ª fase, de hélice dupla, que continuam a ser produzidas e aplicadas:


Espera-se obter 65 MWh concluída a 3ª fase, até 2029. Como o fornecimento é estável, os 400 MW deverão ser atingidos até 2035. Ainda falta muito para o Gigawatt prometido.


É ao largo das formações rochosas "The Merry Men of Mey’, em direcção a Nordeste, que está a ser instalado o campo de turbinas no fundo marinho. À superfície, fluxos rápidas, redemoínhos, água em convulsão, e o vento em luta contra as correntes. 40 a 50m mais abaixo, alinhamentos de turbinas. O futuro.


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