Seat of virtue, source of pleasure!
Life without thee knows no blessing,
No endearment worth caressing
- NUM GRÃO DE AREIA
O MUNDO INTEIRO VER -
Sabia que há nas West Highlands da Escócia, a 56º N, uma pequena floresta tropical moderada ? E um jardim de maravilhas?
Ouvi falar de Ellenabaeich e An Cala no livro 'Ce que prend la mer', uma história de desencontro familiar mais ou menos bem contada que se passa nestas paragens. Ficam numa pequena ilha de ardósia, na costa ocidental da Escócia: a Ilha de Seil, também desconhecida para mim.
A visita começa quando se chega ao Atlântico pela estrada B844; para atravessar o estreito braço de mar entre a costa e a ilha, foi construída em 1792 uma ponte em arco elevado a imitar antigo, uma ponte de pedra. Leva o nome do estreito, "Clachan" :
Pode dar um arrepio saber que estamos numa ponte minúscula sobre o Atlântico; mas há muitas destas na Noruega, também para aceder a ilhas. A Escócia tem nada menos que 900, novecentas! , ilhas, das quais cerca de 100 desabitadas. Este grupo das Hébridas Interiores chama-se Slate Islands devido à riqueza em ardósia, que foi intensamente extraída no século XIX.
Depois da ponte, a estrada B844 curva a sul e vai pela beira mar, entre terrenos verdejantes e arborizados, até chegar à aldeia portuária de Ellenabeich, a principal povoação da ilha.(*) O nome significa 'porto' ou 'ancoradouro' em gaélico.
O mundo está tenebroso, de candeias às avessas, mas a edição delivros e discos nem por isso: não faltam novidades empolgantes ou no mínimo sedutoras. O negócio das gravações de música clássica não parece mau, a ver por estes exemplos, mesmo que não renda tanto como a coqueluche Taylor Swift.
Discos CD
Haydn 2032 , volume No.17
É daqueles de que nunca se diz bem de mais: fabuloso. Tudo - orquestra, direcção, dinâmica, detalhe, solista (violino). Ainda se publicam discos assim ?!!! Que gosto. Direitinho para o meu Top. Antonini faz milagres com os basilienses. Deixo só o andante famoso do HOB VIIA:I , fatto Per il Luigi , escrito para o violinista Luigi Tomasini de Pesaro.
E depois, Haydn era mesmo genial. A prova está aqui, esqueçamaos a Oxford, Urso, Militar e outros pastelões desses. Este é o Haydn mais precioso, criativo, bem disposto, feliz mesmo, como o das famosas nº 6-7-8. Antonini dirige com um prazer tão intenso, uma atenção, um empenho, quase lúbrico. A Sinfonia nº 13 é um mundo. Em 1763 !!! Quando Haydn dirigia os seus próprios concertos em palco, havia momentos especiais - uma melodia, um contraponto em flauta, qualquer detalhe - que o público adorava; Haydn sorria de contente e o público batia palmas, era costume nessa altura bater palmas sempre que se ouvia um trecho favorito durante um concerto. Era engraçada, essa cumplicidade entre compositor e público, que se saudavam mutuamente em plena execução.
Handel, Judas Maccabaeus
Laurence Cummings, Orq. Festival de Göttingen, coro da NDR
Sim, sim ! Laurence Cummnings, o 'nosso' director da orquestra barroca da CDM.
Neste disco, Cummings voa um pouco mais alto com a orquestra do Festival de Göttingen, solistas medianos, mas a sua direcção é cuidada, seguindo os pressupostos da música de Handel, mas sem instrumentios da época. No global, é a melhor gravação desta excelente obra de Handel: um oratório - quase ópera - para celebrar metaforicamente a vitória na batalha de Culloden *.
Dois momentos-chave da obra:
Coro: See the conquering hero, que Handel retoma no ano seguinte em Joshua; ouçamos com Laurence Cummings:
Cantam em celebração o Homem e a Mulher israelitas. Não consegui a versão dirigida por Cummings, mas está ao mesmo nível esta que conta com as excelentes solistas Nuria Rial e Lucia Duchoňová, e com a orquestra barroca de Hamburgo:
É um belo hino à Paz, um entre vários que Handel compôs, e à paz justamente do povo judaico ! O libretto de Judas Maccabaeus conta a história da resistência dos Judeus aos conquistadores Sírios do Império Selêucida de Antióquia, em 169 AC, que invadiram e arrasaram o Reino da Judeia. Judas Maccabaeus foi o clérigo e general que comandou a revolta. No século II antes de Cristo, notem bem.
O episódio histórico e o personagem de Judas Macccabaeus fizeram sempre parte do imaginário cristão. As récitas em Covent Garden foram o maior sucesso de Handel, depois do Messias.
Para comparar com a mais clássica e pausada versão de William Christie, com as sublimes vozes de Sarah Connolly e Rosemary Joshua.
Dido e Aeneas , Purcell
Joyce Didonato, Fatma Said com Il Pomo d'Oro, dir. Emelyanychev
Nem diria que esperava grande coisa de uma Dido cantada por Joyce Didonato; engano: esta gravação veio marcar uma nova referência, pela frescura interpretaiva da orquestra e pelo naipe insuperável de vozes. Toda a gente (revistas, críticos) a coloca como uma das melhores do ano. Como se diaz muitas vezes, parece que ouvimos a obra de Purcell perla primeira vez, tal é a atenção aos detalhes e a pureza do som; finalmente uma gravação "da época" com peso orquestral e sem correrias, com poucas excepções. "Trough the hills", por exemplo, resplandece de vigorosa alegria. Um regalo de audição: prenda de Natal aconselhada.
Coro: "Cupid only throws the dart" :
Livros
Ainda à espera de ser lidos:
Ce que prend la Mer, de Manon Fargetton
A jovem Maxine, ao encontrar memórias inesperadas de um pai distante, parte à procura de respostas numa pequena ilha escocesa das Hébridas Interiores, a sul de Oban. A ilha, o mar, os ferries, a costa, os cais, um jardim improvável... O relato da viagem, entrecortado de regressos ao passado, e onde não falta a música - o pai era violoncelista.
Orkney, Amy Sackville
Continuando nas minhas míticas ilhas escocesas, 'Orkney' é um romance invulgar, mesmo estranho, que começa como conto de fadas algo folclórico e vai acabar fragmentado num desconcertante negrume, marcado pelo ritmo das ondas, das correntes, das marés. Desde o suspeito New York Times até ao insuspeito Times Literary Supplement, elogios à escrita de Amy Sackville.
Kairos, Jenny Erpenbeck
Situado em Berlim, 1986, em plena crise das Alemanhas, uma história de ciúme. engano, crueldade, polícia política, onde vive a História e memória cultural de uma época de crise. No topo das escolhas do Spectator e New York Times.
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* Em 1746, perto de Inverness na Escócia, travou-se uma brutal batalha em que o duque de Cumberland derrotou os jacobitas que, a partir da Escócia, queriam restaurar a dinastia Stuart, apoiada por França.