Sei como a vida é dura, a longevidade baixa, o terreno e o clima inóspitos, o verão curto, o abastecimento escasso e as carências mais que muitas. Mas para jovens intrépidos, gente com poesia no sangue e despojamento na alma, as terras dos glaciares, dos fiordes, das auroras boreais, dos ursos brancos navegando em iceberg , dos nunataks e dos inukshuks, dos vulcões cobertos de branco, das 100 palavras para a neve, das aldeias de mil cores pintando a neve e descendo pela encosta até ao Ártico tão abundante de vida, aquele isolamento telúrico do homem quando viaja de trenó de cães perante uma imensidão alva que parece o universo inteiro - toda esse Novo Continente é como um novo planeta: uma casa vazia à nossa espera. Seja nos "Northern Territories" do Canadá, no Alasca ou nas Aleutes, na alta Sibéria do Taymyr, nas ilhas Svalbard ou na enorme Gronelãndia, na Islândia ou nas Faröe, no extremo da Noruega ou na rica Suécia dos Sami.
Tudo isto respira na música dos Sigur Rós, poetas islandeses dos grandes espaços. Basta ver o DVD que realizaram pela ilha com concertos locais, num antigo sítio Viking, numa planura deserta, numa cascata, numas ruínas, numa pequena aldeia, para sentir até que ponto aquela música É aquela natureza, traduzida no sentir do homem.
Chego assim ao recente disco de Jónsi, "Go", que motivou e exigiu esta introdução.
Com 4 acordes apenas se faz um disco lindo de morrer. Jónsi é o único e inconfundível vocalista dos Sigur Rós, banda islandesa que marcou os últimos anos, criando uma espécie de rock sinfónico herdeiro dos Yes e dos Pink Floyd, que plana nas alturas pela ousadia das orquestrações e das harmonias, que cria contrastes rítmicos surpreendentes e mesmo brutais, e manda para o lixo quase tudo o resto que por aí se faz (excepto os Magnetic Fields, Peter Gabriel e talvez alguma coisa dos Arcade).
Go é o disco a solo de Jónsi, saído a 5 de Abril, e é mais uma vez um delírio. A riqueza orquestral atinge um nível incomum nesta área, de quase excelência pop. O incrível falsete de Jónsi é puxado a alturas vertiginosas. A voz dele planando sobre órgão em Grow till tall é de arrepiar. Os coros angélicos que cortam subitamente um ritmo frenético são pura beleza, seja em que música fôr.
Esquecendo um ou dois temas mais fracos, é a não perder por nada deste mundo, num hifi de qualidade com o volume puxadinho ! Experiência inolvidável...
( e não se espantem por eu gostar disto: foi desta música que aprendi a gostar, a clássica fez-me exigente e selectivo, mas quando se compõe, toca e canta assim, não resisto.)
(presentemente Em Audição)
2 comentários:
Ora aqui está mais um ponto de encontro. eu também tenho um fascinio especial pela Islândia. Desde que um professore de física uma vez nos mostrou as fotos que tinha feito numa viagem a esse país ... o relato que fez da natureza e das pessoas ficou-me na memória até hoje. Digo muitas vezes que há professores que nos mudam por isso mesmo ... Hei-de um dia visitar esse país. Obrigado pela partilha.
O Norte longínquo é todo ele fascinante, Fernando. Vivem longe de "tudo", deveriam ser as maiores vítimas da periferia, mas não são. Souberam virar a História e a geografia a seu favor.
Abraço,
Mário
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