Tenho uma má relação com a cidade onde nasci e vivo. Sempre a achei feia, suja, escura, pesada, caótica, desleixada; agora ganhou cor e excesso de animação, má animação, com um turismo desenfreado que inevitavelmente estragou muito do que havia de menos mau, ou melhorzinho, e promoveu uma vida plástica e frenética de comida e bebida em prejuízo da variedade do comércio.
Vou começar uma série de publicações sobre locais onde vivi muitas horas no passado ou tenho vivido agora recentemente, e que se tornaram a minha referência geográfica urbana para o bem e para o mal. O Porto é uma cidade mais rica do que eu julgava quando era novo, durante a vida escolar e universitária; nessa altura era deprimente e descuidada, mas tinha potencialidades para ser uma cidade europeia digna, com melhor arquitectura, cultura e espaços de lazer.
Não conseguiu ultrapassar essa fatalidade de enriquecer mal, enriquecer estragando, arruinando. O que mais falta é requinte, o requinte de uma cidade europeia limpa, tranquila, ordenada e culta. No Porto manda o barato e feio, a desordem, lixo nas ruas, fachadas decadentes grafitadas, o barulho e o atropelo, o trânsito caótico, as obras constantes por toda a parte.
O melhor do Porto é a Foz e o mar, os museus e os jardins, algumas pastelarias. Coisas boas como os cafés e as lojas únicas, quase desapareceram. As margens do Douro eram sítio degradado e sítio degradado são, incluindo a Ribeira e a Cantareira. A Universidade é um pandemónio, não tem um núcleo, nem um campus de jeito, são caixotes esparsos pela cidade. A arquitectura é de uma pobreza confrangedora comparada a qualquer cidade europeia da mesma dimensão - o casario tosco e pobre, torto e desordenado, as igrejas barrocas de um cinzento pesado, rococó e feio, apenas se alegrando com alguns painéis de azulejo; fontes quase não há, e nenhuma bonita de se ver, até a dos Leões foi estragada. Salva-se alguma obra moderna como o palácio de Serralves, o café/hotel A Brasileira, o Rivoli ou a Casa da Música, exemplos isolados que chegam a destoar por estarem muito acima do que os rodeia.
Chega de paleio. Começo pela rua mais bonita do Porto, a Rua do Infante D. Henrique, entre a igreja de S. Francisco e a Feitoria Inglesa, passando pelo jardim do Infante. Sujeita à maldição turística, a rua viu um dos melhores prédios arrebatado por uma hamburgueria, outro por um hotel que altera a fisionomia da fachada; mesmo assim, ainda mantém alguma harmonia e homogenia de arquitectura.
Biblioteca
O Relógio de Sol
2 comentários:
Sou de Lisboa e vivo em Lisboa e devo dizer que, no que à sujidade, edifícios degradados e grafitados, desorganização e confusão por excesso de pessoas, a minha cidade ultrapassa largamente o Porto. E, dentro da sujidade, há algo em que Lisboa é imbatível - na quantidade de fezes caninas no chão! É uma vergonha!!
Por razões profissionais, vou frequentemente ao Porto (ainda ontem lá estive) e confesso que é uma cidade que gosto muito. Talvez por viver em Lisboa, não a acho tão suja e aprecio alguns aspectos da construção que poderão ser apontados como menos positivos. E aguardarei com muito interesse os próximos textos porque neles poderão vir a ser introduzidos aspectos em que o Porto bate Lisboa e muitas outras cidades nacionais aos pontos...
E termino com o principal, muito obrigado por este texto (e os que virão), que me farão conhecer muito melhor o Porto, cidade de que gosto mas que poderei não ter estado tão atento a tópicos que seguramente aqui serão salientados e explicitados.
Obrigado, meu caro, vou tentar estar à altura. Com a idade, tornei-me cada vez mais intolerante ao que vejo pela cidade, quem vem de fora não vem com esse parti-pris... Vou-me centrar naquilo que são memórias de vida na cidade, e naquilo que (ainda) não me irrita muito. Aproveite o que puder, abraço.
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