domingo, 11 de maio de 2025

Na Finlândia, perto da ameaça russa: Joensuu


Uma ponte pedonal liga a parte mais antiga de Joensuu à cidade nova.

Estamos no leste da Finlândia, a 50 km da fronteira com a Rússia. Joensuu é uma importante cidade portuária de 80 000 habitantes, quase imaculadamente moderna, mas é a localização e as evidências de alguma História que me interessam. 


Situada a  62° 36′ N, 29° 45′ E Joensuu nem sequer é sub-ártica, está à latitude de Ålesund; é uma cidade da região da Karelia, no extremo leste da Finlândia, nas duas margens do estuário do Rio Pielisjoki (Joensuu = "estuário") quando ele se lança no grande Lago Saimaa, cujo sistema de rios permite a navegação até ao famoso Lago Ladoga na Karélia 'Russa' , e daí até S. Petersburgo.

Cais fluvial histórico de Joensuu, na margem esquerda..

Foi cidade em 1848 durante o reinado do Czar Nicolau I, mas já ali existia um povoado desde 1400. Até ao final do século XIX, Joensuu tornou-se era uma das maiores cidades portuárias da Finlândia, com tráfego fluvial para S. Petersburgo e rotas marítimas para as cidades da Europa central. A construção de um canal navegável, em 1870, passou a trazer milhares de barcos a vapor, barcas e navios madeireiros, e o porto fervilhava de actividade.

Canal navegável com comportas no Rio Pielisjoki

O núcleo inicial da cidade é na margem oeste, percorrida pela rua marginal agora denominada Rankatu; situa-se aí o bairro histórico Taitokortteli, um pequeno quarteirão de casas de madeira do final do século XIX num quadriculado de ruas. O nome significa "bairro do artesão", pois tem várias galerias e lojas de artesanato local.


O bairro começa junto ao rio, frente a um jardim na marginal, o Rantapuisto:

Aqui ficava o antigo porto fluvial, e agora o porto turístico.

O cais fluvial de passageiros era o centro de animação da margem esquerda. Quando chegava ou partia um navio, os passageiros e a carga traziam uma vida intensa ao Taitokortteli.


O Teatro e Casa de Cultura Pakkahuone



Ao lado, a Casa de Olson de 1853, talvez a mais antiga da cidade, também frente ao rio Pielisjoki


Construída para o farmacêutico Olson na rua Malmikatu 1. Nos finais do século XIX esta era a zona mais animada, junto ao antigo porto.


A mais bonita da cidade, também.

A Casa Mustonen, centro de Artes, é onde se concentra a actividade do bairro.

Casa Mustonen de 1870, na Koskikatu

O quarteirão data de 1870, construído sob ordens do Kauppaneuvoksen (consultor comercial) Mustonen.

Kauppaneuvoksen Kahvila, um café-restaurante com o nome do consultor comercial Mustonen.


Um quiosque de café e gelados.

O Centro de Arte Ahjo

Antigo ginásio do Liceu, foi convertido em espaço de Arte para exposições, instalações e performances.


Museu das Belas Artes

Junto ao Taitokortteli, o Museu de Joensuu, fundado em 1962 com oferta de colecções privadas, ocupa um edifício neo-renascença de 1894, antigo Liceu.

Na rua Kirkkokatu

Numa cidade tão remota admira a dimensão deste Museu. Algumas obras:


Albert Edelfelt, 'Virginie', 1883

Vaino Aaltonen, Runotar (Musa), 1926

A colecção mais importante é um conjunto de arte religiosa, com destaque para uma Madonna de Bernardo Daddi, aluno de Giotto:

Bernardo Daddi, altar (Florença, séc XIV)

Mais:

A Igreja de Joensuu



É uma igreja luterana de 1903, em tijolo, no estilo neo-gótico e de inspiração Arte Nova, mais evidente na decoração das abóbadas das três naves.



Ylisoutajan silta, a Ponte do Remador


Ponte pedonal de 2014, cujo nome recorda um remador vitorioso. Premiada pelo design e pela iluminação nocturna.

 Iluminada ao entardecer, com a agulha da Igreja ao fundo.


Joensuu deve a sua relevância actual aos mais de 20 000 estudantes da Universidade da Finlândia Oriental e da Universidade da Karélia do Norte, situadas na margem direita, a cidade moderna.


Joensuu é conhecida também como Capital Florestal da Europa, não só pelo extenso Parque Florestal que a circunda, mais denso a Norte, como pelos estudos florestais (ambientais, madeiras, transportes fluviais) nas suas Universidades. 



A temível fronteira leste

A sul da aldeia de Värtsilä, pela estrada nº 9 até ao pequeno lago Virmäjärvi, que pertence a meias à Finlândia e à Rússia, estamos na linha de fronteira; aqui é o ponto mais oriental não só da Finlândia como de toda a União Europeia !


Esta proximidade com a fronteira russa marcou a história de Joensuu. Do outro lado, está a República da Karélia, território pilhado à Finlândia pela força mas cujos laços com o lado ocidental facilitam a cooperação transfronteiriça.
 
A Guerra de Inverno, também conhecida como Primeita Guerra Sovieto-Finlandesa, começou com a invasão por tropas russas da Finlândia em 30 de Novembro de  1939, e terminou três meses e meio depois como Tratado de Paz de Moscovo a 13 de Março de 1940. Embora dispondo de maior força militar, sobretudo força aérea e tanques, a URSS sofreu elevado número de baixas e de início pouco conseguiu progredir. A Liga das Nações (precursora da ONU) condenou o ataque como ilegal e expulsou a URSS. A Finlândia repeliu os ataques durante mais de dois meses e inflingiu mais de 160 000 mortes ao exército invasor, sob temperaturas que atingiram  −43 °C.

Com o Tratado de Paz , a Finlândia cedeu 9% do seu território à URSS, que apesar das pesadas baixas acabou por ter mais ganhos do que exigia a princípio (não faz tocar campaínhas de alarme ?) . Ficou com vastos terrenos em torno do Lago Ladoga, na Karelia, tendo a Finlândia ficado apenas com duas regiões a Norte e Noroeste do Lago. História que os finlandeses vêem repetir-se na Geórgia, na Ucrânia.

Actualmente os 1340 km de fronteira, fortemente patrulhados e vigiados, bordados de covas e blocos de cimento anti-tanque ('dentes-de-dragão'), são praticamente intransponíveis, à excepção de algumas estradas de terra não pavimentada; há faixa de terreno interdita que impede a aproximação a menos de 3 ou 4 km.

'Zona de fronteira - acesso proíbido'.

Boa sorte Finlândia, que a paz esteja contigo.

















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