sábado, 4 de fevereiro de 2012

Paul Klee e a Música: quadros que se ouvem

Je soupire après la musique! Musique ! [...]
La musique est pour moi comme une bien-aimée ensorcelée. [...]

Paul Klee, Journal

Entre os maiores nomes da arte do início do séc XX, o suíço Paul Klee (1879 - 1940) distingue-se pela síntese, na sua obra e na sua vida, entre música e pintura.

Paul Klee pensava a pintura numa perspectiva de compositor. Filho de um professor de música e de uma cantora lírica, tocava bem violino desde criança, e hesitou muito entre a carreira musical e a pintura. Tinha um magnífico violino Testore de 1702. Admirava mais intensamente Bach, Mozart, Beethoven, Brahms, como era norma nesse início do séc XX. Tocava as suas obras a solo, em duo com a esposa, a pianista de Munique Lily Stumpf, às vezes em quarteto. Frequentava assiduamente salas de concerto e de ópera, tomava notas, escrevia comentários críticos.

Ao estilo de Bach (Im Bachschen Stil), 1919

Quando se decidiu pela pintura, fundou o seu estilo sobre o movimento, o ritmo, as oposições e tensões que experimentava ouvindo música da "Idade de Ouro", como lhe chamava - Bach e sobretudo Mozart, que era para Klee o expoente máximo da música, a que aspirava corresponder com a sua arte.

Pequena paisagem ritmada (Kleine rhythmische Landschaft), 1920

Klee pretendia captar o tempo (o fluir do tempo na música) e fundi-lo com o espaço, construindo uma visão nova da "simultaneidade". Achava que assim podia com a sua arte atingir um novo patamar de liberdade criativa.

Rítmico (Rhythmisches), 1930

Rítmico, mais forte e mais livre (Rhythmisches, strenger und freier), 1930

A composição, o ritmo, a variação, a harmonia e a melodia estão presentes em quase toda a obra de Klee. Alguns quadros quase se podem interpretar como «partituras» musicais:

Jardim abstracto-fantástico (Abstract-phantastischer Garten), 1920

Pastoral (Ritmos) [Pastorale (Rhythmen)], 1927

A melodia toma em geral forma de linha. O ritmo manifesta-se em sequências - a dois tempos, a três tempos ... - e na sobreposição de motivos e de campos cromáticos. Às harmonias sonoras correspondem harmonias de cor, brilho, luz e sombra.

Som antigo - abstracto sobre negro (Alter Klang, Abstrakt auf Schwarz), 1925

Em Som antigo há uma estrutura modular que marca o ritmo, uma correlação entre módulos que marca a cadência, e campos de côr que são ilustração sinestésica (inter-sensorial) da qualidade e intensidade do som. Pode ser uma sinfonia, pode ser um acorde a vários instrumentos...

O apogeu deste processo de composição surge quando Klee consegue uma pintura " a várias vozes, polifónica", à imagem da arte de Bach:


Polifonias, de 1932,
uma das mais conseguidas, intercala pontos e quadrados, tons e cores, de forma contrapuntística (clicar para ver mais detalhe). Mais do que associar esta ou aquela cor a esta ou aquela nota, há em vários níveis de estrutura uma espécie de vibração harmónica que faz a ponte entre as duas formas de arte. Ainda mais evidente nesta outra obra, onde encaixes complexos viajam da luz à sombra ou vice-versa, com subtis sobreposições de tons e permitindo uma polissemia de leituras:

Branco em conjunto polifónico(Polyphon Gefasstes Weiss), 1930

Klee refere-se também a óperas da sua predilecção - por exemplo personagens das óperas de Mozart, de Rossini ou de Verdi:

Don Giovanni bávaro (Der bayrische Don Giovanni), 1919.

Bartolo: La vendetta, oh! la vendetta!, 1921 (das Bodas de Fígaro)


A FUGA EM VERMELHO:

A par­tir de 1920, Klee integra a Bauhaus de Weimar, onde será professor. Lá encontra Bartók, Hindemith, Busoni, Stravinsky... é nesse período que pinta "Fuga em vermelho":

Fuge in Rot, 1921

Inspirado por uma fuga de Bach, este é talvez o quadro onde Klee mais claramente exprime os seus estudos sobre harmonia. "Ouve-se" ou "lê-se" uma composição/partitura a múltiplas vozes, quatro temas como um côro de formas que vão tomando variações na cor e na dimensão, partindo da forma vaga e obscura no sentido da nitidez e da luz, sobrepondo-se parcialmente, sendo retomados mais adiante numa ligeira mutação. A simultaneidade de campos sonoros, a gradação, a vibração harmónica de todo o conjunto, realizam a tese de sinestesia proposta por Klee.

Bach, Fuga da Sonata No. 1
Henryk Szeryng



Saber mais:

L'Express - Cité de la musique
Exposition Polyphonies

Centro Paul Klee de Berna
Museu de Arte de Basileia

Analogias Musicales, Museo Thyssen-Bornemisza, 2003

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

Força, força, companheiro Vasco

Chegou a altura de aqui se apoiar com entusiasmo o PREC ! Ou melhor, o PREC/NAO, Não ao Acordo Ortográfico :


Sob a liderança de V.G.M no C.C.B.,

Nem mais - um só - PORTÁTIL com A. O. !

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

Outro Wagner: "Albumblatt"

Richard Wagner, sim, escreveu música para piano. Três sonatas e mais umas peças curtas.

Wagner
Sonata para o Álbum de Mathilde Wesendonck


O "Albumblatt für Frau Betty Schott" foi composto em 1875, um ano antes de completar o Ring e uma ano antes do primeiro Bayreuth. É uma peça simples para piano, mas com linhas de contraponto que lembram aqui e ali o Die Meistersinger von Nürnberg.

O termo Albumblatt, ou "folha de álbum", foi usado pelos românticos para composições curtas dedicadas especificamente a um amigo ou admirador, para que integrasse a "folha" no seu álbum de autografados.

Betty Schott era a mulher de Franz Schott, que publicava as obras de Wagner para uma casa editora de Mainz, e a quem ele devia imensos favores pecuniários. As finanças de Wagner, já agora, têm um historial curioso: desde o início da carreira, contraia dívidas enormes com quem lhe desse crédito, e depois pedia apoios a amigos, patronos e negociantes, que raramente pagava, e só sob ameaça. Chegou a ser preso em Paris, em 1841. Gostava de viver em grande luxo, e para isso não hesitava em exigir exorbitantes adiantamentos sobre as obras ainda por acabar. Franz Schott teve vários desaguisados com ele por causa dos direitos sobre o Meistersinger, que quase o levavam à ruína, e que chegaram a situações caricatas onde Betty também se envolveu. Schott escreveu a Wagner: “Um editor de música não está em situação de poder suprir às suas necessidades: isso só é possível a um banqueiro imensamente rico, ou um conde que possua vários milhões...

A Folha de Álbum deve ter sido uma compensação póstuma pelas arrelias causadas...

"Albumblatt", transcrição para violino de August Wilhelm
Quase uma música para criança...



Albumblatt für E.B. Kietz

Perseguido por uma dívida monstruosa, Wagner fugiu primeiro para Londres, depois para Paris, onde levou uma vida miserável, até que teve um encontro com o pintor Ernst Benedikt Kietz. Este idolatrva Wagner, conseguiu-lhe alguns empréstimos. Composta em 1840, a pequena Folha de álbum para Kietz foi um agradecimento pela ajuda nos tempos difíceis.

Albumblatt für E.B. Kietz


Outro Wagner, obras pequenas mas bonitas, quem diria.