Allegoria della pittura - auto-retrato de Artemisia, de 1639 - uma obra espantosamente moderna.
Artemisia Gentileschi (1593, Roma - 1654, Nápoles) foi uma pintora italiana que obteve grande sucesso na corte, sob protecção dos Medici e de Carlos I de Inglaterra.
Allegoria della fama, 1630
Caso raro, uma mulher dedicada às artes no séc. XVII, célebre na Itália e na Europa. Talvez por ser já filha de pintor (Oratio Gentileschi) - mas mesmo assim teve de se casar com um artista menor de Florença, para poder exercer "legalmente" !
Caso raro também de coragem e de talento, Artemisia bem merecia ser mais universalmente conhecida. Usava a côr (amarelos e azuis famosos) e a luz/sombra como poucos, fazia sobretudo retratos - privilegiando mulheres, num feminismo assumido - e projectava com violência na pintura o ressentimento pelos maus tratos sofridos por parte do tutor (Agostino Tassi, pintor também) que a marcaram para toda a vida.
Clio, la Musa della Storia, 1632 (detalhe)
Mulheres , quase sempre: deusas, musas ou figuras históricas trágicas: Santa Cecília (várias), Santa Catarina; Minerva, a musa Clio; Cleópatra, Judith... e Artemisia ela própria, em vários auto-retratos !
Autoritratto come suonatrice di liuto (tocadora de alaúde), 1617
Artemisia Gentileschi rodeou-se de um atelier de assistentes que recebia encomendas de gente rica em Roma, Florença, Nápoles e até em Londres, como esta pintura de tecto (em parceria com o pai) na Grande Sala da Queen's House de Greenwich:
Allegoria della Pace e delle Arti sotto la Corona inglese, 1939
Ao centro, a Paz encimando a Vitória, e à volta as Artes - o Trivium e o Quadrivium.
Artemisia Gentileschi conquistou a pulso a liberdade e a glória. Requisitada por príncipes e cardeais, construiu uma carreira única na época, e merece ser relembrada como uma das grandes pintoras italianas do barroco.
Aqui deixo algumas das obras mais bonitas, aquelas em que Artemisia parece ter conseguido alguma paz interior.
A virgem com o Menino, 1609
Cleópatra (1635) , no seu triste destino de mulher heróica, retratado com carinho em tons de azul e amarelo... O uso do lapis-lazuli, o pigmento mais caro de todos, a que só recorriam os artistas mais reputados, nota-se no azul vivo do pano.
Amarelos fabulosos: a bela Allegoria dell'Inclinazione (1616), uma jovem desnuda que com as mãos regula uma bússula apontada para o céu, onde uma estrela ilumina a sua bela cabeleira loira talvez demasiado cuidada...
Representa o talento natural, a predisposição para uma arte. Talvez a jovem seja mais uma vez a própria Artemisia, segundo Alexandra Lapierre:
"queria representar uma jovem bem fornecida, despida e que incarnasse a Allegoria dell'inclinazione, a alegoria de todas as propensões artísticas do divino Michelangelo. Com uma liberdade desconcertante, Artemisia retratou-se a si mesma, reivindicando na obra a beleza do prório corpo, e o génio do seu pincel."
Outra virgem com o menino (detalhe) :Madonna col bambino, 1611: lindíssima, toda uma poética feminina no olhar e no gesto, a perfeição do cabelo do menino...
E mais um auto-retrato, talvez o mais belo de todos:
Musa della Pittura, 1635 - notável chiaroscuro.
Artemisia dava particular atenção aos tecidos - uma mulher coquette que tinha gosto nas roupagens.
Seria este o olhar de Artemisia ?
Música da época (Itália, séc. XVII):
Monteverdi, madrigal "Altri canti d'amor, tenero arciero"
Exposição até 15 de Julho, no Musée Maillol, Paris:
Artemisia: Pouvoir, Gloire et Passions d’une femme peintre
http://www.museemaillol.com/
1 comentário:
Muito bom. Há muito tempo que sinto uma grande admiração por esta pintora.
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