domingo, 26 de fevereiro de 2012

Paavo Berglund (1929 - 2012)


Soube só agora de mais uma despedida final - a recente partida do maestro finlandês Paavo Berglund, conhecido pelos seus concertos com a Philarmonia, com Emil Gilels, interpretando Beethoven; e pela sua divulgação cuidada e apaixonada da obra de Nielsen, de Grieg, de Sibelius....

Homenagem a um músico competente e dedicado.

Paavo Berglund dirige a Filarmónica de Helsínquia
Jean Sibelius - Sinfonia No. 2: Allegretto

sábado, 25 de fevereiro de 2012

Paraselene

viOra bem, nenhum dia é mau quando se aprende uma palavra nova. E hoje assim foi: ao folhear um livro que acabo de receber via Amazon - "Ice, a Victorian romance" - sobre a aventura inglesa no Ártico e no Antártico no séc XIX, dei com belas imagens legendadas com a tal palavra paraselene.

No fundo quer dizer "para além da Lua", é um fenómeno celeste que se dá quando na alta atmosfera há cristais de gelo alinhados, e a Lua surge rodeada de um halo circular como uma espécie de "miragem" luminosa, com um ou mais focos luminosos que são como réplicas do círculo lunar, e por vezes um arco-íris invertido no topo, tudo não mais que reflexos nos cristais de gelo.

Assim:



Os ultra-românticos vitorianos adoraram o dramatismo que o fenómeno imprimia às cenas nocturnas do ártico, e representaram-no com frequência:

Under the light of a paraselene, Carl Petersen, Den Sidste Franklin-Expedition med "Fox”, 1860.

Foi uma época exaltante para se viver, acho eu...

A exposição que deu origem ao livro pode ser revisitada aqui , bastam as belas gravuras para valer a espreitadela.

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

Cenas tristes: os neutrinos & a ficha

Tanta tinta correu sobre a ultrapassagem da velocidade da luz pelos neutrinos do CERN, e consequente revisão da relatividade ! Afinal, caboum! fiasco! e...

...mais uma saborosa vitória de Einstein, glória a ele! Então julgavam que a má conexão de um cabo de computador ia dar cabo de uma ideia de génio que dura há mais de um século? LOL 300 000 vezes, ou melhor, 299 792 vezes !

É também para eu aprender (como se já não soubesse, enfim) a não embarcar em espalhafatos mediáticos , mesmo que aparentemente científicos. Quando alguma coisa acontecer, será provavelmente silenciosa, inicialmente rejeitada e só lentamente insidiada.

terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

Quem pode resisitir a este Kaufmann?

Com um frisson solidário, partilho com a "completamente apaixonada" Gi do Garden of Philodemus este Numa terra distante:

Jonas Kaufmann - Wagner: Lohengrin - In fernem Land
(Munich 2009)




In fernem Land, unnahbar euren Schritten,
liegt eine Burg, die Montsalvat genannt;
ein lichter Tempel stehet dort inmitten,
so kostbar, als auf Erden nichts bekannt;
drin ein Gefäß von wundertät'gem Segen
wird dort als höchstes Heiligtum bewacht:
Es ward, daß sein der Menschen reinste pflegen,
herab von einer Engelschar gebracht;
alljährlich naht vom Himmel eine Taube,
um neu zu stärken seine Wunderkraft:
Es heißt der Gral, und selig reinster Glaube
erteilt durch ihn sich seiner Ritterschaft.
Wer nun dem Gral zu dienen ist erkoren,
den rüstet er mit überird'scher Macht;
an dem ist jedes Bösen Trug verloren,
wenn ihn er sieht, weicht dem des Todes Nacht.
Selbst wer von ihm in ferne Land' entsendet,
zum Streiter für der Tugend Recht ernannt,
dem wird nicht seine heil'ge Kraft entwendet,
bleibt als sein Ritter dort er unerkannt.
So hehrer Art doch ist des Grales Segen,
enthüllt - muß er des Laien Auge fliehn;
des Ritters drum sollt Zweifel ihr nicht hegen,
erkennt ihr ihn - dann muß er von euch ziehn.
Nun hört, wie ich verbotner Frage lohne!
Vom Gral ward ich zu euch daher gesandt:
Mein Vater Parzival trägt seine Krone,
sein Ritter ich - bin Lohengrin genannt.


In a country far away and inaccessible there is a
sacred citadel by the name of Mont-salvat, a temple
so brilliant that the whole earth has nothing to compare
with it, rises there in its glory and splendor.

Within its inclosure, in the depth of the sanctuary,
pious hearts worship, by night and by day, the holy
chalice into which God poured his divine blood ; this
vase was brought to the earth by angels, that it might
be intrusted to the protection of pure and simple-
hearted men.

Every year there descends from heaven a white dove
to give new strength to its miraculous virtue. This
vase is the Holy Grail. Whoever adores it and gives
himself to its service is endowed with superhuman
power. Wherever his destiny may lead him, the Grail
will sustain him, whenever he combats for right and
virtue.

Biit the power of the Grail is of such a nature that it
vanishes as soon as it is revealed ; a severe law commands
the knights to remain unknown to the world ; if
they reveal their rank, they lose their power, they have
to depart at once and return to the holy mountain.

" That is why I am going to leave you. I was sent
to you by the Grail ; my father, Parsifal, is King of the
Grail, and I, his knight, am called Lohengrin."

sábado, 18 de fevereiro de 2012

Cenas tristes: música & política

Nada me surpreende que o medíocre Dudamel e sus muchachos, que, bem sei, estão no top da moda em certos círculos, façam descarada campanha a favor do bruto e tosco Hugo Chávez.

Muito mais me entristece que a excelente Anna Netrebko e o muito-melhor-que-dudamel Valery Gergiev também se sujem em apoio público a Putin.

Fonte: The rest is Noise

Camiñante, no hay camiño

Camiñante, son tus huellas
el camiño, y nada mas;
camiñante, no hay camiño,
se hace camiño al andar.

Al andar se hace camiño,
y al volver la vista atras
se ve la senda que nunca
se ha de volver a pisar.

Camiñante, no hay camiño,
sino estelas en la mar.


Estranhamente, o poema de Antonio Machado parece aplicar-se mais que nunca à actual Europa. Não há caminho, não há plano nem mapa nem rota, vai-se fazendo caminho ao andar. É às cegas, confiando em Sarkozy /Merkel, tacteando, um paso ao lado em falso aqui, um passo atrás ali, cair e voltar a levantar, talvez...

Estranhamente, como digo, é da suposta "esquerda" que vêm as certezas, as receitas infalíveis, os caminhos pré-fabricados. Sabem tudo, o que está mal, o que estaria bem, os maus da fita, o rumo a seguir sem hesitação. E apontam o dedo e as culpas, convictos e heróicos.

Acontece que a História, essa escola de todos os ensinamentos, mostra o que acontece aos rumos infa
líveis.

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

Hugo, de Scorsese

Um filme como há muito já não via: cinema com a magia a comandar, como deve ser, numa homenagem aos fundadores da arte. Comovente, educativo, divertido e intensamente belo.


Entrevista:
http://youtu.be/5PQXe4XuVIk

domingo, 12 de fevereiro de 2012

Pratos germânicos, Gottfried von Strassburg e Wagner


Sofrer sem amor, sofrer por amor...


Por acasos da vida, são meus estes pratos em baixo-relevo pintado sobre cerâmica, montados em moldura de latão trabalhado. Suponho que são provenientes da zona da Alsácia ou da região alemã de Baden-Württemberg, ou mesmo da Holanda, por volta dos fins do séc. XIX.



O texto circular que enquadra as imagens é de Gottfried von Straßburg, o criador do Tristão e Isolda que inspirou Wagner.

Wem nie durch Liebe Leid geschah
dem ward auch Lieb' durch Lieb' nie nah;
Leid kommt wohl ohne Lieb' allein,
Lieb' kann nicht ohne Leiden sein.


Quem nunca sofreu por amor
Não conheceu as suas alegrias
Se, sem amor, muito se sofre,
também junto com amor vem sofrimento.

- tradução muito livre -

Gottes will bist mein ziel,
trost ist meines herzens

O desejo de Deus é a minha vontade
A verdade é o meu coração

Gottfried von Strassburg
Codex Manesse (livro de canções medievais), 1304


Gottfried von Strassburg (? - c. 1210) escreveu romances para a corte germânica medieval: o seu Tristan und Isolt foi uma adaptação de uma lenda do séc XII. A obra de Gottfried, a par do Parzival de Wolfram von Eschenbach e do Nibelungenlied, é considerada uma das grandes narrativas da Idade Média centro-europeia.

A questão que aqui deixo é esta: alguém me saberá dar pistas sobre a origem (histórica, geográfica, cultural) destes pratos? Estou farto de procurar, e tudo o que sei é o que acabei de escrever aqui.

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

Muito frio, muito quente

Geneva, Suíça.
Noutros lados é bem pior.

O Etna, mais um vez. Erupção violenta de quarta para quinta-feira passadas. Só fogo de vista, parece.

terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

Antoni Tàpies (1923 – 2012)


Pode-se gostar muito, pouco ou nada, mas marcou a pintura do fim do século XX. Inovou nos materiais, nas técnicas e na composição. Criou beleza através da estranheza. Bem haja, Marqués de Tàpies.

sábado, 4 de fevereiro de 2012

Paul Klee e a Música: quadros que se ouvem

Je soupire après la musique! Musique ! [...]
La musique est pour moi comme une bien-aimée ensorcelée. [...]

Paul Klee, Journal

Entre os maiores nomes da arte do início do séc XX, o suíço Paul Klee (1879 - 1940) distingue-se pela síntese, na sua obra e na sua vida, entre música e pintura.

Paul Klee pensava a pintura numa perspectiva de compositor. Filho de um professor de música e de uma cantora lírica, tocava bem violino desde criança, e hesitou muito entre a carreira musical e a pintura. Tinha um magnífico violino Testore de 1702. Admirava mais intensamente Bach, Mozart, Beethoven, Brahms, como era norma nesse início do séc XX. Tocava as suas obras a solo, em duo com a esposa, a pianista de Munique Lily Stumpf, às vezes em quarteto. Frequentava assiduamente salas de concerto e de ópera, tomava notas, escrevia comentários críticos.

Ao estilo de Bach (Im Bachschen Stil), 1919

Quando se decidiu pela pintura, fundou o seu estilo sobre o movimento, o ritmo, as oposições e tensões que experimentava ouvindo música da "Idade de Ouro", como lhe chamava - Bach e sobretudo Mozart, que era para Klee o expoente máximo da música, a que aspirava corresponder com a sua arte.

Pequena paisagem ritmada (Kleine rhythmische Landschaft), 1920

Klee pretendia captar o tempo (o fluir do tempo na música) e fundi-lo com o espaço, construindo uma visão nova da "simultaneidade". Achava que assim podia com a sua arte atingir um novo patamar de liberdade criativa.

Rítmico (Rhythmisches), 1930

Rítmico, mais forte e mais livre (Rhythmisches, strenger und freier), 1930

A composição, o ritmo, a variação, a harmonia e a melodia estão presentes em quase toda a obra de Klee. Alguns quadros quase se podem interpretar como «partituras» musicais:

Jardim abstracto-fantástico (Abstract-phantastischer Garten), 1920

Pastoral (Ritmos) [Pastorale (Rhythmen)], 1927

A melodia toma em geral forma de linha. O ritmo manifesta-se em sequências - a dois tempos, a três tempos ... - e na sobreposição de motivos e de campos cromáticos. Às harmonias sonoras correspondem harmonias de cor, brilho, luz e sombra.

Som antigo - abstracto sobre negro (Alter Klang, Abstrakt auf Schwarz), 1925

Em Som antigo há uma estrutura modular que marca o ritmo, uma correlação entre módulos que marca a cadência, e campos de côr que são ilustração sinestésica (inter-sensorial) da qualidade e intensidade do som. Pode ser uma sinfonia, pode ser um acorde a vários instrumentos...

O apogeu deste processo de composição surge quando Klee consegue uma pintura " a várias vozes, polifónica", à imagem da arte de Bach:


Polifonias, de 1932,
uma das mais conseguidas, intercala pontos e quadrados, tons e cores, de forma contrapuntística (clicar para ver mais detalhe). Mais do que associar esta ou aquela cor a esta ou aquela nota, há em vários níveis de estrutura uma espécie de vibração harmónica que faz a ponte entre as duas formas de arte. Ainda mais evidente nesta outra obra, onde encaixes complexos viajam da luz à sombra ou vice-versa, com subtis sobreposições de tons e permitindo uma polissemia de leituras:

Branco em conjunto polifónico(Polyphon Gefasstes Weiss), 1930

Klee refere-se também a óperas da sua predilecção - por exemplo personagens das óperas de Mozart, de Rossini ou de Verdi:

Don Giovanni bávaro (Der bayrische Don Giovanni), 1919.

Bartolo: La vendetta, oh! la vendetta!, 1921 (das Bodas de Fígaro)


A FUGA EM VERMELHO:

A par­tir de 1920, Klee integra a Bauhaus de Weimar, onde será professor. Lá encontra Bartók, Hindemith, Busoni, Stravinsky... é nesse período que pinta "Fuga em vermelho":

Fuge in Rot, 1921

Inspirado por uma fuga de Bach, este é talvez o quadro onde Klee mais claramente exprime os seus estudos sobre harmonia. "Ouve-se" ou "lê-se" uma composição/partitura a múltiplas vozes, quatro temas como um côro de formas que vão tomando variações na cor e na dimensão, partindo da forma vaga e obscura no sentido da nitidez e da luz, sobrepondo-se parcialmente, sendo retomados mais adiante numa ligeira mutação. A simultaneidade de campos sonoros, a gradação, a vibração harmónica de todo o conjunto, realizam a tese de sinestesia proposta por Klee.

Bach, Fuga da Sonata No. 1
Henryk Szeryng



Saber mais:

L'Express - Cité de la musique
Exposition Polyphonies

Centro Paul Klee de Berna
Museu de Arte de Basileia

Analogias Musicales, Museo Thyssen-Bornemisza, 2003

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

Força, força, companheiro Vasco

Chegou a altura de aqui se apoiar com entusiasmo o PREC ! Ou melhor, o PREC/NAO, Não ao Acordo Ortográfico :


Sob a liderança de V.G.M no C.C.B.,

Nem mais - um só - PORTÁTIL com A. O. !

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

Outro Wagner: "Albumblatt"

Richard Wagner, sim, escreveu música para piano. Três sonatas e mais umas peças curtas.

Wagner
Sonata para o Álbum de Mathilde Wesendonck


O "Albumblatt für Frau Betty Schott" foi composto em 1875, um ano antes de completar o Ring e uma ano antes do primeiro Bayreuth. É uma peça simples para piano, mas com linhas de contraponto que lembram aqui e ali o Die Meistersinger von Nürnberg.

O termo Albumblatt, ou "folha de álbum", foi usado pelos românticos para composições curtas dedicadas especificamente a um amigo ou admirador, para que integrasse a "folha" no seu álbum de autografados.

Betty Schott era a mulher de Franz Schott, que publicava as obras de Wagner para uma casa editora de Mainz, e a quem ele devia imensos favores pecuniários. As finanças de Wagner, já agora, têm um historial curioso: desde o início da carreira, contraia dívidas enormes com quem lhe desse crédito, e depois pedia apoios a amigos, patronos e negociantes, que raramente pagava, e só sob ameaça. Chegou a ser preso em Paris, em 1841. Gostava de viver em grande luxo, e para isso não hesitava em exigir exorbitantes adiantamentos sobre as obras ainda por acabar. Franz Schott teve vários desaguisados com ele por causa dos direitos sobre o Meistersinger, que quase o levavam à ruína, e que chegaram a situações caricatas onde Betty também se envolveu. Schott escreveu a Wagner: “Um editor de música não está em situação de poder suprir às suas necessidades: isso só é possível a um banqueiro imensamente rico, ou um conde que possua vários milhões...

A Folha de Álbum deve ter sido uma compensação póstuma pelas arrelias causadas...

"Albumblatt", transcrição para violino de August Wilhelm
Quase uma música para criança...



Albumblatt für E.B. Kietz

Perseguido por uma dívida monstruosa, Wagner fugiu primeiro para Londres, depois para Paris, onde levou uma vida miserável, até que teve um encontro com o pintor Ernst Benedikt Kietz. Este idolatrva Wagner, conseguiu-lhe alguns empréstimos. Composta em 1840, a pequena Folha de álbum para Kietz foi um agradecimento pela ajuda nos tempos difíceis.

Albumblatt für E.B. Kietz


Outro Wagner, obras pequenas mas bonitas, quem diria.