No 29 de Fevereiro, mais uma "viagem impossível" no Livro de Areia.
Este local remoto na costa ártica europeia bem podia ser candidato à Ultima Thule de Pytheas - um grupo de ilhas longínquas e misteriosas escondidas num braço de mar gelado conhecido como -
1. O MAR BRANCO

O Mar Branco é uma extensão do mar de Barents, na costa noroeste da Rússia.

O Mare Album já era conhecido no séc XI pelo negócio das peles - a navegação e os portos foram crescendo à custa das florestas costeiras ricas em animais de pele.
Entre o séc. XV e o séc. XVIII , o Mar Branco já fazia parte das mais importantes rotas de comércio na Rússia. O seu papel só diminuiu com a fundação da cidade de São Petersburgo, que abriu uma ligação mais favorável ao Báltico.
Na década de 1930, sob o regime de Estaline, foi construído à custa de trabalho forçado um canal de ligação do Mar Branco ao Báltico, que desaguava em S. Petersburgo:

A cidade mais importante do Mar Branco é Arkhangelsk; nos tempos do comércio marítimo de peles era um dos mais importantes portos russos. Actualmente é usada como base naval e de submarinos. É uma cidade feia e pouco acolhedora, marcada por decadentes blocos da era soviética, por esculturas e monumentos de propaganda ao longo de desoladoras avenidas. O Mar Branco é agora uma rota frequente da frota de submarinos russos, assim como local de depósito de abundante e ferrugenta sucata naval.

Durante décadas de reinado soviético, as ilhas do Mar Branco foram utilizadas como campos prisionais de dissidentes, ao que parece os primeiros, ainda antes de Estaline; ficaram tristemente conhecidas como o Arquipélago Gulag; actualmente reclamam o estatuto de local espiritual e religioso, dando abrigo a comunidades monásticas e recebendo visitas turísticas, sobretudo depois de reconhecido o seu valor patrimonial pela Unesco em 1992.

2. AS ILHAS SOLOVETSKY
(Património Cultural da Humanidade, 1992)
O arquipélago consiste em 6 ilhas e uns 100 ilhéus. A maior é Bolshoy Solovetsky , com 220 km2. Também têm relevância as ilhas Anzersky, Bolshaya Muksalma e Bolshoy Zayatsky.

As Solovetsky (ou Solovki) estão apenas 160 Km a sul do círculo polar, nas coordenadas de 65°N 35°E, mas escondem tesouros fabulosos de arqueologia e arquitectura, a par de testemunhos históricos do infame Gulag.

São ilhas sem relevo, em grande parte cobertas de floresta (pinho ártico envelhecido) e semeadas de centenas de pequenos lagos. As áreas restantes são território de tundra.


COs primeiros habitantes ( 2000-1000 B.C.) deixaram abundantes traços culturais do neolítico: labirintos, megalitos e empilhamentos. No fim da Idade Média, o arquipélago foi um lugar de grande actividade monástica desde o século XV, com várias igrejas que datam dos séculos XVI a XIX :
"exemplo extraordinário de um aldeamento monástico no ambiente inóspito do norte da Europa, que ilustra a fé, tenacidade e espírito empreendedor das comunidades religiosas tardo-medievais".
ILHA de ANZER (Anzersky)
A natureza da ilha de Anzer é surpreendente: num pequeno território há vários tipos de paisagem. É nesta ilha que existe a maior elevação - o Monte Gólgota, com 88 metros.




A ILHA BOLSHOY ZAYATSKY
Bolshoi Zayatsky é uma pequena ilha (1,25 km2) incrivelmenete rica de heranças arqueológicas e religiosas.
A Igreja de St. Andrei, em madeira, de 1702:



Mas a ilha é sobretudo conhecida como santuário pagão, com um complexo de estruturas de culto e sepulcrais datando do II-I milénio A.C., sendo as mais espectaculares e intrigantes os numerosos labirintos; o maior, com 25 metros of diâmetro, é também o maior do mundo no género.
Os labirintos de pedra de Bolshoi Zayatsky estão bem conservados. Ao longo da beira-mar ou no fundo dos bosques, encontram-se pelo menos 18 labirintos de pedras, 600 megalitos funerários, e vários alinhamentos e círculos megalíticos.

Os mais belos labirintos são espirais de pedras pousadas sobre o solo, que o tempo cobriu com vegetação rasteira da tundra que tem sido cuidada para melhor apreciação.


Ainda não se sabe o propósito da sua construção, há a probabilidade de terem a ver com ritos sagrados.
3. O MOSTEIRO DE SOLOVETSKY
na ilha Bolshoy Solovetsky

O complexo de Solovetsky é um exemplo extraordinário de povoação monástica do extremo norte da Europa. Por isso foi classificado Património Cultural da Humanidade.
O Mosteiro foi fundado por três monges de Kirillo-Belozersky por volta de 1430, e no fim do séc XVI já era um dos mais influentes centros religiosos na Rússia.




A fortaleza foi construída entre 1582 e 1594, e Solovetsky tornou-se um centro económico, religioso, militar e cultural da região. A actividade artesanal abrangia pintura de ícones, escultura em madeira, gravura, litografia. A actividade comercial incluía salinas, pesca, colher e trabalhar pérolas, ferragens, fabrico de tijolos.


Dentro da muralhas há vários templos, capelas, e pátios dedicados a actividades domésticas.





A CATEDRAL DA TRANSFIGURAÇÃO (1558-1566)








O mosteiro expandiu-se ao longo de séculos não só pelas ilhas, com várias secções e capelas, mas inclusive em largas faixas do território costeiro.


Depois da revolução de 1917, o mosteiro foi fechado, os monges mortos ou deportados, e foi convertido num campo de concentração e trabalhos forçados integrado no sistema Gulag até 1939. Lá pereceram mais de 100 000 pessoas - oficiais, cientistas, religiosos, escritores, artistas, negociantes, a elite russa. O campo de Solovetsky ficou também como memória desse genocídio cruel e sem sentido.
A aldeia do Mosteiro
A aldeia de Solovetsky inclui capelas, hospedarias de peregrinos, uma doca seca, escolas, um museu... e recentemente um pequeno hotel para turistas.




Les Iles aux mille lumières


SOLOVETSKY NO INVERNO





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Ler mais:
http://www.anatol.org/projects/travel/russia/solovki-archipelago.html
http://www.solovky.com/en/labyrinth.htm

Espanta que isto ainda seja Europa, e que aqui junto ao círculo polar e num canto afastado da Rússia europeia se venha encontrar tão abundante e valioso testemunho do nosso passado comum.