segunda-feira, 2 de maio de 2016

A Lisboa de que gosto, menos uma má noite no Teatro Camões


De regresso, ficam aqui pequenas notas e uma fotorreportagem.

A FCG em noite de concerto

 1. O Concerto que Tom Koopman dirigiu na Gulbenkian mostrou, primeiro, que grande dirigente ele é, competente, sério e muito seguro apesar daquele ar bonacheirão e muito efusivo com que cumprimenta toda a gente; e segundo, o nível de excelência a que Orquestra e Côro podem chegar quando bem dirigidos.

A coordenação foi exemplar, ouviam-se todas as pequenos apontamentos que abundam em Mozart numa linguagem fluída e dinamicamente expressiva como deve ser na música barroca. Gostei em particular da força dos stacattos e do ritmo seco com que soavam percussão e metais em uníssono. O canto foi bem servido, Yetzabel Arias não é deslumbrante de voz mas cumpriu com algum brilhantismo. Como já aqui salientei no último post o Laudate Dominus, fica agora o Agnus Dei da Missa da Coroação K317 com o Vienna Boys Choir e, penso eu, Sandrine Piau.




2. O Romeu e Julieta aldrabado à moderna por Rui Horta, no Teatro Camões, com o TNDM e a CNB, esteve tão mauzinho como eu receava.


Apercebi-me de que mais gente foi ao engano, julgando ir assistir o bailado de Prokofiev. O cartaz engana qualquer um, com o título da Companhia e do famoso Bailado no Teatro Camões - que mais poderia ser ?

Pois poderia ser uma mixórdia mal amanhada com excertos de Shakespeare (os melhores, claro, mas mal declamados) e textos rascas tipo Big Brother, ou anúncio publicitário "ó meu, tás a ver", executados por um corpo de actores bem abaixo de mau, a berrar e mesmo assim amplificados, e com um corpo de bailarinos que talvez pudessem fazer melhor mas o que lhes foi pedido foram marchas e danças guerreiras como aquelas dos maoris neozelandeses ao iniciar um jogo de rugby. E tudo demora, demora...

O conceito cénico resume-se a preto e branco - preto em todas as roupas, sem distinção, branco num cortinado luminoso de fundo que corria de um lado para outro para fingir alguma dinâmica de palco, pois mais não havia. Tudo lamentável. Pobre CNB que se mete com gente tão medíocre.

A ideia podia ser interessante - montagem de textos da peça de Shakespeare de modo a obter um programa mais actual, uma reflexão sobre a violência que impede o amor mais ajustada aos dias que correm. Para isso, o mínimo era respeitar o texto de Shakespeare, a genial matéria prima. Não: desbarataram-no como se fosse lixo descartável. Nem digo mais nada.


3. Passeatas

Como tencionava, andei por uma Lisboa a escapar aos turistas, zero deles se possível. Consegue-se na Lapa, em Alvalade, na Estrela também. Há muitas fachadas e janelas bonitas, recantos, vielas e travessas sem saída, lojas diferentes - gostei muito por exemplo da Companhia Portuguesa de Chá.

Galeria:



Tantas varandas, um só varandador.






Lojas
Gelataria artesanal Conchanata, Alvalade

Ovos moles de Lisboa, calçada da Estrela.

Companhia Portuguesa de Chá, rua Poço dos Negros.


Ah, e os alfarrabistas às dezenas !




A terminar, Vieira da Silva na estação do Rato:

[Fantástico, o retoque artístico da Metro no canto inferior esquerdo onde sobrepôs um cartaz informativo]

4 comentários:

Fanático_Um disse...

As fotografias da cidade onde vivo são muito bonitas. Conheço muito bem alguns dos locais retratados (os mais doces :-)!. Tenho pena que se tenha defraudado com a CNB, mas foi imprudente. Há anos que é assim, muito aquém do mínimo aceitável! Sou apreciador de ballet mas. desde um inenarrável "Lago dos Cisnes" que vi há muitos anos em que os cisnes pareciam mais cavalos selvagens (pelo somatório do ruído que faziam com os pés e desequilíbrios constantes) que deixei de ir, para não ter mais desilusões.

Virginia disse...



Ri-me com a sua desilusão balletica, mas lembro-me de que espectáculos de ballet em Lisboa eram = a fiasco. Nunca me esqueço dum Lago dos Cisnes com a Companhia do Marques de Cuevas e um Carmina Burana no Coliseu....até a orquestra era péssima!!

Quanto à Gulbenkian tenho saudades pois durante três anos em que vivi a dois passos não perdi concertos excelentes.

O resto é mais do mesmo. Lisboa não ultrapassa o Porto em matéria de cantos não turisticos e é tudo maior e menos elegante. Sou de lá, nasci no coração da capital, mas devo confessar que não tenho saudades e nem os convites constantes da família me fazem deslocar-me só para ester nessa cidade.

Mário R. Gonçalves disse...

Fanático_um,

Deixei-me enganar por que na data em que comprei os bilhetes não se sabia nada senão que era o Romeu e Julieta pela CNB no Teatro Camões. Quando mais tarde soube os detalhes, a vontade de não pôr lá os pés foi grande, mas quis ver até que ponto ia o despautério.

Lisboa é uma cidade muito "passeável", embora íngreme. Avenidas com árvores, luz e colorido, esplanadas por toda a parte, gente afável que fala bem sem precisar de muletas "rascas" como no Porto. Agrada-me sempre constatar a boa qualidade de vida urbana que se pode ter fora do centro.

O Chiado é que está difícil de frequentar.

Mário R. Gonçalves disse...

Virgínia,

Lamento discordar de novo, Lisboa é bem mais rica, luminosa, colorida e elegante, e até limpa, que o Porto. A arquitectura urbana de algumas ruas e bairros é um gosto de se ver, os miradouros e as ruas em encosta com rio ao fundo são únicos. Poucas cidades exibem conjuntos de fachadas tão homogéneas, com varanda de ferro e cobertas em azulejo, por exemplo, nada comparável à escura e triste rua das Flores do Porto. Mas um dos maiores contrastes é ouvir as pessoas, no metro, nas ruas, nas esplanadas: é raro o palavreado ordinário e troglodita que me massacra no Porto.

Não tenho dúvida que se tivesse de escolher, escolhia Lisboa. Alvalade ou Lapa, provavelmente. Longe do trãnsito maluco.