quinta-feira, 9 de março de 2017
Beatrice Rana na CdM com as Goldberg
Já se sabe que Gould, no piano, e Pierre Hantaï no cravo, são inigualáveis nas variações Goldberg de J. S. Bach. Mesmo que outras razoáveis interpretações tenham surgido - Murray Perahia, András Schiff ... - essas duas referências ainda são as que mais volto a ouvir.
Beatrice Rana é uma jovem italiana, menina prodígio desde os 9 anos, que se anuncia como possível grande pianista dentro de poucos anos. Riccardo Chailly dirigiu Schumann com ela no La Scala. Rana teve a coragem de realizar uma série de concertos pela Europa apresentando como programa 'apenas' as Variações. E toca-as sem pauta, aos 23 anos ! Segue-se mesmo uma gravação em disco.
Fiquei sentado no côro da Casa da Música, sobranceiro ao piano e com uma vista excelente, teclado e mãos, e pude observar os difíceis cruzamentos de mão nas variações a duas partes. A ária de abertura foi sublime.
Continuou muito bem na 1ª e 2ª variações. Depois pelo meio, as coisas correram mal. Excessivamente rápida, e por vezes acentuando mais o dedilhado à esquerda que a melodia à direita, o que prejudica o seguimento da 'narrativa' que são estas 30 variações. Algumas variações foram totalmente perdidas (a genial 8ª, a incrível 23ª, que pena...), como se Rana não lhes desse importância e as despachasse de qualquer maneira. Nunca martela as teclas sem dó nem piedade, como Burmester; mas tocou com suave, maçadora indiferença.
Felizmente voltou ao melhor a partir da 27ª. A quodlibet esteve muito bem, com algum romantismo, em ritmo pausado e acentuando devidamente; e a da capo esteve ainda melhor que de ínício, perfeita, de ir ao céu, terminando nas nuvens...
Não é Gould, mas pelo menos na ária desafia a primazia do mestre.
Para contrastar, ouçamos no cravo, por Pierre Hantaï:
E agora um extra... para quem como eu gosta de guitarra, aqui fica uma transcrição muito bonita da ária (1997). Toca o húngaro Jozsef Eötvös:
P.S. Hoje saiu no Público a opinião de Diana Ferreira. O título "Bach à Italiana" já é enganador, porque o virtuosismo de Beatrice Rana é bastante sóbrio, alemão mesmo. Depois, mente logo no subtítulo, "sala quase cheia": na minha posição a visão da sala era total, e estava quase vazia ! Finalmente, a autora ficou particularmente satisfeita com as variações nº 8, 15, 21 e 25 - justamente algumas das mais falhadas, que Rana tocou com menos empenho e rigor. Mas quem quer saber ? Qualquer coisa serve, só é preciso encher papel e marcar presença. Jornalismo.
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