sexta-feira, 8 de junho de 2018

Madame Serpente, a Senhora Branca: os imortais que querem ser humanos


Madame Serpente Branca é um conto mítico chinês que ganhou grande popularidade: um poderoso demónio em forma de serpente, ao fim de mil anos, transforma-se numa bela mas humana mulher para conhecer o amor. E encontra-o na Ponte Quebrada do Lago Poente de Hangzhou, na pessoa de Xu Xian. Casa com ele e vivem uma paixão tão intensa que atraem a curiosidade e a desconfiança de um monge, capaz de entrever a serpente oculta atrás da foma humana.

Quando o monge sabe que Madame Serpente está grávida, fica estarrecido com semelhamte violação de todas as tradições e tabus, sejam de raça, de religião, divinos e profanos. Resolve intervir confrontando o marido, que acaba convencido. E a (in)esperada tragédia surge quando Xi Xuan engana traiçoeiramente a mulher obrigando-a a retomar a forma de serpente.

O que mais emociona é que a imortal Serpente tenha abdicado dessa qualidade divina e assumido a forma mortal só para conhecer a mais humana das emoções. Por um breve instante tem nos braços esse amor desejado, mas acaba por perder tudo, embora haja versões com fim feliz. A narrativa foi transformada em ópera, cujas récitas costumam ter grande sucesso.

No Museu do Oriente há um exemplar de um belo livrinho ilustrado, tal historinha de B.D. à maneira oriental, com estas ilustrações que vou mostrar.

Como em todas as narrativas míticas orais, há muitas variações; a que está exposta no Museu do Oriente joga na amizade entre as duas serpentes, a Branca (libertária) e a Azul (conservadora), que se mantêm em contacto durante toda a aventura mundana de Madame Branca.

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1.
Dois Espíritos de Serpente, a Serpente Branca e a Serpente Azul, descem da montanha para gozar as delícias da Primavera, tomando a forma de belas mulheres no Lago Poente de Hang Zhou.

2.
Para atravessar o lago, pedem a um barqueiro que as aceite a bordo, onde já se encontra o jovem Xu Xian. Este, encantado, empresta o seu guarda-chuva à bela Senhora Branca, que de imediato se apaixona por ele. Combinam um encontro na Ponte Quebrada.

3.
Quando Xu Xian aparece para reaver o guarda-chuva, a Serpente Azul propõe a Xu Xian que se case com a amiga. Ele aceita de imediato.

4. Mas o monge Fa Hai, do santuário do Monte d'Ouro, revela a Xu Xian que a mulher é uma Serpente Mágica disfarçada. Propõe um plano para a revelar: dar-lhe a beber álcool durante as festividades das Barcas-Dragão.

5. Decorrem as festas, e Xu Xian força a esposa a beber vinho, como é costume local; a Serpente Branca ainda tenta que a sua magia possa evitar o efeito; mas sente-se mal e corre a refugiar-se no quarto.

6. Quando Xu Xian a segue e entreabre os cortinados, vê uma grande serpente branca e desfalece do choque.

7. Ainda mal refeito, sobe ao Monte d'Ouro e pede refúgio junto do monge Fa Hai, que o recolhe e mantém em clausura.

8. E agora começa a parte mais épica: as duas Serpentes (a Branca já recuperada) aliam-se aos animais aquáticos para conseguir resgatar o infeliz Xu Xian do mosteiro. Levantam as águas e inundam o santuário do monge Fa Hai, que acaba por ceder, permitindo que continuem entre os humanos até ao nascimento do bébé.

9. Comovido pela devoção da esposa, lutando contra sentimentos contraditórios, Xu Xian volta à Ponte Quebrada do Lago Poente para se reencontrar com a esposa; mas a furiosa Serpente Azul tenta matá-lo. É salvo pela Senhora Branca, que lhe conta da sua gravidez, e com renovadas promessas de amor retomam a sua vida em conjunto.

10. Assim que a criança nasce, Fa Hai vem buscar as duas serpentes e leva-as aprisionadas para um Pagode no Monte.

11. Anos mais tarde, o rapaz nascido de Xu Xian e da Senhora Branca vai prestar culto junto a Pagode, e consegue ver a mãe por breves instantes.

12. O Pagode acaba por ser destruído e as duas Sepentes conseguem escapar; procurando vingança, acabam por chamar a atenção de Buda que dá o castigo final a Fa Hai.

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Ora acontece que tudo isto lembra muita coisa lida e vista, desde pelo menos a Grécia antiga; no meu caso, recordei a obra-prima de Wim Wenders "Asas do Desejo" , no original "Asas sobre Berlim". Nessa hstória os espíritos não eram serpentes mas sim dois anjos, Damiel e Cassiel; Damiel, apaixonado, sente a tentação de ser humano mesmo que perdesse para sempre a imortalidade. Além do amor, irá sentir tudo o que há de bom e de mau.

Ah, mais uma coisinha: o Lago Poente de Hangzhou existe, assim como existe o Pagode Leifeng, octogonal e com cinco andares, construído em 975, colapsado em 1924 e depois reconstruído.



4 comentários:

redonda disse...

Gostei muito de ficar a conhecer a história e das imagens. Obrigada

Fanático_Um disse...

Imagens muito bonitas que ilustram uma história intemporal, como bem nos recorda no final. Muito obrigado.

Mário R. Gonçalves disse...

redonda, Fanático_Um:

Já foram ao Museu do Oriente ? Está lá (com legendas mais abreviadas).
Aliás, foi a única coisa que me seduziu, achei até o Museu bastante pobre, além da péssima acessibilidade.

Obrigado pela visita.

Unknown disse...

O lago tambem existe assim como uma ponte linda. Podes passear de barco e assistir a uns espetáculos de música e danças tradicionais chinesas. Eu gostei muito. Vou procurar as fotos para te dar.
Rosario