sexta-feira, 12 de março de 2021

Grise Fiord, capital de Ellesmere no Alto Ártico Canadiano.


Destino improvável, esta seria uma evasão grandiosa, homérica.

Ellesmere, ilha de bonito nome, é a décima maior do mundo e fica acima do círculo polar na região do Nunavut, a oeste da Gronelândia. Quase toda classificada como parque natural, desabitada à excepção de duas estações polares de investigação*, tem uma única povoação no extremo sul, Grise Fiord, habitada desde os anos 50 por uma população Inuit.



Grise Fiord
(Aujuittuq, ou ausuiktuq, "onde o gelo nunca funde")

População: ~160
Coordenadas: 76º 25´N , 82° 53′ W (1150 km a norte do Círculo Polar)


Grise Fiord está numa enseada do golfo Jones Sound, na costa sul da Ilha de Ellesmere**. É a comunidade mais a norte do Canadá. Tem cerca de 40 moradias e 20 edifícios comerciais ou administrativos. O nome colonial foi atribuído à volta de 1900 pelo explorador norueguês Otto Sverdrup.
As casas têm de ser estruturas leves sobre estacas.




Foi fundada em 1953, quando o Governo do Canadá forçou o realojamento de famílias Inuit do Quebec e da ilha de Baffin, para reforçar a soberania do país na Alto Ártico. Foi um início trágico e desumano, que mais tarde se tentou atenuar com o reconhecimento e a onstalação de serviços à comunidade - Escola, Correios, post de Saúde, pista de aterragem, e em 1966 a loja-cooperativa Inuit que exerce uma espécie de governo étnico, além de estimular as artes e desportos. 
Larry Audlaluk escreveu um livro de memórias onde narra o sofrimento dos pais para se adaptarem a uma terra árida, sem pastagens nem recursos.

A Co-op vende sobretudo congelados, doçaria embalada e conservas. Frescos, poucos e caros.


Mesmo a cobrar uns brinquedos na caixa, a tradição inuit marca uma diferença.

A Escola Umimmak é sempre o local mais alegre e animado.


É o centro de actividades diárias para a comunidade.


Danças tradicionais, cinema, aulas de costura e arte, educação de adultos e dias especiais do calendário, tudo acontece na escola.

Nos dias de luz , é ao ar livre que se brinca.


A Igreja de S. Pedro foi construída nos anos 60. Sofreu recentemente um incêndio.


Num local de tal forma longínquo e isolado, as formas básicas de sustento são vitais: pesca e caça de subsistência. Felizmente os recursos marinhos abundam; já em terra coelhos, raposas e caribous têm diminuído drasticamente, só os bois almiscarados (umimmak) estão em expansão. Com as alterações climáticas talvez as coisas até melhorem por aqui.

As peles de urso podem ser obtidas se o urso for abatido em defesa sob ameaça.

Foto de Laisa Audlaluk, Grise Fiord.

Na caça às focas, nem os mais velhos resistem às tecnologias; abandonaram os trenós pelos snowmobiles (motas de neve), e agora aderiram aos SUVS, que têm aquecimento e música.


Para adquirir os escassos produtos importados do Sul, a ajuda maior são as receitas do turismo, cruzeiros sobretudo, e a venda de artesanato local. A vida é dura, triste e monótona, mas ralaxada e saudável. Os homens dedicam-se mais à pesca e caça, as mulheres à confecção de roupas quentes - parkas, kamiks (botas).

Looty Pijamini (n. 1953) é um artista escultor Inuit de Grise Fiord.

Sedna, a 'deusa' do mar.

Duas mães

Em homenagem aos primeiros Inuit que fundaram a colónia de Grise Fiord, Looty esculpiu em 2010 este conjunto mãe e filho, de olhar expectante, a mãe mais assustada, a criança parecendo desafiar o futuro.



Roupas amautiit (foca, caribou). Amautiit = parka inuit concebida para transportar uma criança às costas. 

Como estamos em altas latitudes árticas, há aqui duas estações no ano: a estação da luz dura de Maio a Agosto, é quando o sol nunca se põe; a estação escura vai de Outubro a meados de Fevereiro, quando o sol nunca nasce - a longa noite. A temperatora vai de 0º a -40ºC nos meses frios, em Janeiro atingiu uma vez -62.2º C.


A Ilha de Ellesmere constitui uma Reserva Natural, pela geologia e pela fauna. 


Apesar da escassez de pastos e vegetação, existe uma fauna inesperadamente abundante. A mais incómoda são os rebanhos de bois almiscarados; mas há os belos veados Caribou Peary:
A vantagem do caribou é a velocidade com que corre.

E lebres, brancas como a neve:

Assim como as inevitáveis raposas:


Nas aves, a espectacular coruja das neves:

e os Ptarmigans, espécie de perdiz do ártico muito apreciada:

Ursos polares vão rareando, e na verdade não fazem muita falta. Criou-se um mito, mas é um bicho inútil (à parte as peles que os Inuit aproveitam) e pouco recomendável.

Este viu certamente um salmão do ártico sob o gelo.

Uma história que espantou os biólogos foi a da raposa azul de Spitsbergen (nas Svalbard, ilhas árticas da Noruega) que após ter sido marcada percorreu nada menos que 3 500 km até ser detectada em Ellesmere, tendo atravessado a calote polar até à Gronelândia e daí a baía de Baffin para a ilha canadiana:


A jornada durou 76 dias entre Março e o fim de Junho, quase sem parar. Estranha persistência.

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* A maior é Alert, das forças armadas canadianas, com uma equipa permanente de cerca de 60 pessoas.
** Ellesmere é uma aldeia e lagoa a sul de Chester, UK


1 comentário:

Arnaldo Leles disse...

Como vai Mário? O nome desta raposa é Forrest Gump.