sábado, 27 de julho de 2024

Museu Arqueológico de Batumi : Gregos e Romanos na costa caucasiana do Mar Negro


Pequenos vasos Gregos do Museu de Batumi

Lazica, na costa leste do Mar Negro, foi o limite máximo do Império Romano a Oriente - a fronteira Pontus Limes. Antes também os Gregos tinham lá fundado colónias, na região a que chamaram Kolchis, a Cólquida para onde navegaram os Argonautas em 1300 A.C. . 


Os principais sítios arqueológicos foram a colónia grega de Pichvnari, a fortaleza Romana/Bizantina de Apsarus - mais tarde Gonio, na  Lazica   e ainda o forte de Petra nas falésias costeiras de Tsikhisdziri, todos na província de Adjara na Geórgia.


De tudo isto nos fala o Museu Arqueológico de Batumi, o histórico porto da Geórgia, cidade magnífica, visitada e apreciada por Steinbeck, Dumas, Simenon, Hamsun.


Museu Arqueológico de Batumi


Em poucos anos (abriu em 1994) este Museu tornou-se uma referência na Geórgia, devido aos achados em escavações na região de Adjara. A estrela da colecção Grega são pequenas ânforas (amphoriskos) para óleo encontradas na necrópolis de Pichvnari.

Aryballos em cerâmica polícroma, datado do séc. V A.C.; são belíssimas obras da cerâmica Cólquida (do grego Kolkhós, Kolkhis).


Aryballos era um pequeno vaso para óleo perfumado utilizado sobretudo pelos atletas gregos, que o traziam pendurado no cinto para limparem o suor durante as provas.

Um vaso para perfume.

Oinochoe, jarro para vinho.


Skyphos, uma taça alta de vinho com duas pegas.

Kylix, taça com pegas horizontais

Verdadeiras preciosidades.

Anel oval com Afrodite, entalhado a ouro, séc. V AC.

Os Gregos conheciam esta colónia como Colchis (Cólquida),  o destino dos Argonautas, pátria de Medeia, onde estaria escondido o Tosão de Ouro. Era rica, diziam, em ouro, ferro, madeira e mel, produtos exportados para as cidades helenísticas. No século II D.C. a Cólquida foi integrada no Império Romano.

Pitchvnari era uma cidade importante do 1º milénio A.C. , mas já habitada na Idade de Bronze; a sua  necrópole helénica dos séculos V-IV foi objecto de escavações arqueológicas intensas, em colaboração com a Universidade de Oxford.


Fortaleza de Gonio - Apsaros

A muralha encontra-se bem conservada.

Doze quilómetros a sul de Batumi, Gonio / Apsaros é uma fortificação Romana do primeiro século da nossa era. Deve ter sido fundada por Pompeu em 65 AC, sendo referida anos depois por Plínio; no século II, ganhou importância relevante - 5 coortes (metade de uma legião), 2500 homens, tinha Teatro e Hipódromo, e uma muralha vigiada por 18 torres. Tornou-se 'capital' da Lazica, foi visitada por um enviado de Adriano em 123-124, que a inspeccionou e modernizou, numa viagem destinada a promover o bom relacionamento das tropas com os povos locais.


O nome Apsaros, helénico-romano, vem da história dos Argonautas em Colchis - Apsyrtus era o irmão de Medeia. O nome Gonio é mais tardio, do século VI-VII, quando a cidadela esteve sob breve domínio Genovês , sendo depois integrada no Império do Oriente até ao fim da era Bizantina. Ao domínio Turco seguiu-se um tratado que atribuiu toda a Adjara ao Império Russo.

As escavações, com apoio da Universidade de Varsóvia, permitiram obter algum espólio agora exposto no Museu Arqueológico de Batumi. Possivelmente, esta medalha em ouro com pedras embutidas será uma das peças mais valiosas.

Disco em ouro com pedras de granada, âmbar e turquesa, representando uma cena de luta entre animais. [Tesouro de Gonio, séc I-II]


A medalha fazia parte do conteúdo de um embrulho que os arqueólogos desenterraram em 1974, conhecido como o Tesouro de Gonio, que data de I a III DC.

Brincos de âmbar

Placas de ouro com pedras para decorar o saiote dos soldados.

A abundância de ouro na Lazica é em evidente.


Este Phiale pertence também ao tesouro, que está exposto no Museu de Batumi.

Não falta cerâmica, claro, q.b. de ânforas. Este Museu Arqueolõgico é imperdível, para quem tiver a sorte de poder visitar Batumi.


Desde Olisippo ou Conínbriga até Gonio , a vastidão do Império Romano é fenomenal, até causa vertigens. Como é que uma cidade tão "pequena" (1  milhão de hab.) dominou uma extensão de território leste-oeste que ultrapassa 5 000 km?!


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Em breve iremos visitar, aqui no Livro de Areia, a cidade de Batumi, onde se presta homenagem à Europa, desde a Medeia dos Argonautas até à Arte Nova do início do século XX, passando pela Bolonha Renascentista.


sábado, 20 de julho de 2024

Leituras para este Verão


Fui juntando uma colecção de livros sobre viagens, ou sobre aventuras pessoais, que tenciono ler até Outubro.

In Wonderland, Knut Hamsun

Estou a acabar este relato do norueguês Knut Hamsun da sua viagem à Rússia e à Geórgia, com a clássica travessia do Cáucaso pelo Passe (ou garganta) de Darial, a Porta Caucasica referida por Strabo, sob as alturas do Kazbek (5000 m):

'O declive da estrada aumenta, as montanhas cada vez mais se fecham e nos apertam, como se já não houvesse esperança; apenas um pedaço do céu é visível acima de nossas cabeças. Tem um efeito desanimador sobre nós; sentimo-nos esmagados, ficamos em silêncio. De repente, numa curva acentuada da estrada, um enorme abismo abre-se à nossa direita, e bem perto de nós vemos o pico coberto de gelo do Monte Kazbek, com os seus glaciares brancos cintilando ao sol. Está mesmo ali ao lado, plácido e alto, mudo. Um sentimento misterioso percorre-nos - a falésia eleva-se entre muitas outras menos altas, como se conjurada por elas. Sentimos que um ser de outro mundo estava a olhar para nós.'

Climbing Days, Dorothy Pilley

Estes dias de escalada tiveram lugar entre 1910 e 1928. Dorothy Pilley foi a primeira mulher alpinista que dedicou a vida a escalar montanhas, subiu aos Alpes e ao Himalaia.

'Os vales estavam a mergulhar na escuridão à medida que descíamos sobre as neves encharcadas do glaciar. Já não tínhamos pressa. Tínhamos apenas que caminhar, descontraidos, para casa descansar. Só então a fadiga se abateu sobre mim - como um gorro negro, de tal modo que tropecei no gelo granulado recongelado do glaciar seco, e ao longo das moreias emaranhadas por onde a trilha serpenteia até Bricolla. Mas uma corrente de sonolenta beatitude corria nas nossas veias. Uma maldição fora exorcizado, um sonho substituído por uma realidade que o transcendia. Com toda a força literal da palavra estávamos contentes. Mais uma vez, quando me deitei na cama, a vela continuou acesa, extinguiu-se sem eu dar conta, e assim de repente desceu um sono feliz.'

Notes from an Island, Tove Jansson & Tuulikki Pietilä

Diário da residência de maturidade na minúscula ilha de Klovharun do golfo da Finlândia. As duas autoras (uma escreve, a outra executa gravuras com tinta-da-china e aguarela) publicaram esta memória em homenagem à ilha que conheceram ao mínimo detalhe, intensamente, ao longo das estações.

'Tínhamos de tudo, ainda que em miniatura – uma pequena floresta com caminho de mata, uma praiazinha com abrigo seguro para o barco, até um pequeno pântano com alguns tufos de erva-algodão.'

ou

' Estávamos em Março - Inverno tardio, início da Primavera. (...) O mar estava branco de cal em todas as direcções, tanto quanto a vista alcançava. Só então notámos o absoluto silêncio. E que falávamos a sussurrar.'

Travelling Light , Tove Johnson 


The Ministry of Time, Kaliane Bradley


Muito elogiado pelo The Guardian - "a novel where things happen, lots of them, and all of them are exciting to read about and interesting to think about " - é um livro de ficção científica (viaja-se no tempo) que ao mesmo tempo reflecte seriamente sobre quase tudo, desde a crise climática ao 11 de Setembro passando pela corrupção e a história romântica de um ressuscitado da trágica expedição de Franklin ao Ártico. Estou altamente expectante.




domingo, 7 de julho de 2024

No Sistelo finalmente, com passagem na Ecovia e na Vilela


 
A aldeia vista do miradouro (com zoom).

Já há alguns anos na minha agenda, nunca mais chegava  o momento de ir a Sistelo, a aldeia dos socalcos a norte do  Mezio e a poente da Serra da Peneda. Foi agora no fim desta Primavera, e como escrevi aqui a propósito de Ermelo, encontrava-se rodeado de uma exuberante verdura, muita água e pouca gente. Onde estão todos, minhotos ou visitantes, nos bares? Nos festivais de Verão?


Para chegar a Sistelo não há que enganar: sair de Arcos de Valdevez para Norte, abandonar a M101 e passar à M505. Isto sucede depois de Rio de Moínhos. A estreita M505 sobe pela margem direita do rio Vez, junto à Ecovia, o que permite um acesso fácil para pequenos passeios a pé na passarela sob frondosa vegetação fluvial.

A estrada segue ora entre muros e ramadas, ora colada à ecovia do rio Vez , à direita. 


Não são os passadiços, mas já se pode disfrutar a margem sem grandes caminhadas. Deve haver truta, na época certa.




Ponte da Vilela



É uma ponte românica medieval, anterior a 1258.



Pouco adiante, deixa-se a M505 virando à esquerda para a N202-2, que começa a subir e a curvar entre arvoredo e com o rio do lado esquerdo, cada vez mais fundo no estreito vale (há vários acessos a pé, encosta abaixo). 
Até que...


Aldeia de Sistelo


O chamado Castelo é apenas um palacete de brasileiro regressado, do séc. XIX. Foi o 1º Visconde de Sistelo, escudeiro da Casa Real Portuguesa; o fontanário e uma das pontes também se devem ao Visconde.

Agora é restaurante, abre para festas e 'eventos'.


O miradouro mais pitoresco é o dos espigueiros. Está como novo, são talvez oito à volta do tanque comunitário das lavadeiras, também recuperado.



A junta pintada de amarelo forte foi recuperada juntamente com o núcleo de espigueiros, que diferem dos do Soajo pela madeira entre os pilares de pedra.




Restaurados, com as datas de construção bem visíveis.


Lavadouro à sombra e com vistas... 

O fontanário, no centro.


Do adro parte um dos caminhos encosta abaixo até ao rio Vez.

A aldeia foi sempre lugar de pastoreio no vale e agricultura nos socalcos. Agora são actividades reduzidas, adivinham qual é a principal? Claro, o turismo - alojamento e tasquinhas. Mas ainda se vê um ou outro tractor a carregar verdes para o gado, a variedade local é a 'vaca cachena'. Não é raro surgirem pela frente na estrada. 

Vistas do Miradouro




Os acessos estão bons, houve investimento, dois restaurantes, o passadiço oferece caminhadas paradisíacas. Ou me engano muito ou não tarda é tudo de brasileiros, franceses ou ingleses. Os nativos, escapam logo que podem. Ser pastor não é vida.

Vídeo aqui