Fraquinho, fraquinho, mas não desastroso.
A encenação era minimalista, tabiques azuis a criar espaços, paredes, janelas. Monocromático e cansativo. Mas tinha uma ideia muitíssimo bem conseguida: dois espelhos a toda a altura do palco, no lado esquerdo, reflectiam os belos balcões e galerias do Comunale, suavemente iluminadados, e um pano ondulante por trás criava o efeito de palácios venezianos reflectidos na água.
Além desse ambiente cénico, os espelhos também eram usados com outro propósito - um jogo de desdobramento e questionamento dos personagens, em particular a dupla Giovanni/Leporello, que eram vistos de várias perspectivas e ampliados.
Don Giovanni de vermelho, as senhoras de branco (ou preto, Donna Anna).
Vozes: as femininas, apenas os mínimos aceitáveis. A melhor foi a Zerlina de Giuseppina Bridelli (excelente Batti batti o bel Masetto ), voz doce e musical; assim assim a Donna Elvira de Guanqun Yu (inexpressiva, excesso de vibrato), muito má mesmo a Donna Anna de Anna Corvino, voz desagradável e insegura.
Vozes masculinas: um Leporello sofrível (Luca Tittoto), um Dom Giovanni (Alessio Arduini, excelente actor) que se saiu dignamente, a dupla funcionando muito bem em palco. Finalmente Don Ottavio: a melhor voz da noite, excelente prestação de tenor Leonardo Cortellazzi, o Dalla sua Pace plenamente conseguido e aclamado, um momento alto da récita.
Direcção de orquestra pastosa, apagada, fastidiosa, uma vil tristeza. Tomás Pàl não aprendeu nada com Gardiner ou Mackerras.
(fotos do Flickr, excepto as 2 primeiras, minhas)
"Batti batti" : qualquer pretexto é bom para ouvir Lucia Popp:
E já agora John Mark Ainsley em "Dalla sua pace":
11 comentários:
Que pena, Mário, e num teatro tão bonito...
Às vezes nas récitas com elencos desconhecidos, descobrem-se grandes vozes. Tenho pena que não tenha sido o caso Mário.
O teatro, ao menos, é lindíssimo.
Um abraço
Que pena, Mário. Parece que já ficamos um bocadinho contentes por não ter sido desastroso, mas apenas fraquinho.
Alberto: sim, também gosto de frequentar salas e cidades fora dos "grandes" circuitos, às vezes há pérolas; desta vez, valeu pela sala em si, pelo público e por alguns momentos de bom canto e detalhes cénicos. E o Cortelazzi fez um grande don Ottavio.
A última vez que vi uma boa produção foi em Zurique, os excelentes "Mestres Cantores". Mas lá não faltam fundos para contratar...
Assim é, Paulo. De coisas fraquinhas se faz a vida também, não fico contente, mas a desilusão não é total - carpe diem.
Gi, o S. Carlos também é bonito e contudo...
Mário, exactamente.
Eppure, tenho para mim que a próxima temporada nos trará algumas boas surpresas. Talvez poucas, porém.
Paulo, que todos os deuses do Olimpo o ouçam, Santa Cecília nos valha, mas mesmo os milagres dificilmente surgem no deserto...
Valeu pela sala, mas tenha em conta que a ópera de Bolonha tenta manter-se viva a pulso, ao contrário da La Fenice ou do La Scala que quase se podem dar ao luxo de escolher quem lá vai.
É preciso ter fé na próxima temporada, mas não deve esperar milagres. Para se apresentar um cartaz decente dentro dos limites de orçamento seria necessário fazer um pouco de prospecção de modo a descobrir intérpretes decentes que pudessem vir a ser convidados para produções de temporada ou temporárias.
Cumprimentos
Caro Anónimo,
Tive em conta os problemas do Comunale; aliás, antes da récita, expuseram as dificuldades por que passa. O meu comentário talvez não tenha mostrado a simpatia que senti pela casa, por isso agradeço as suas observações.
De facto foi assim mesmo: uma noite de ópera envolvente mas tecnicamente fraquinha, com apenas uma bela voz, outra imperdoavelmente má, e dois ou três momentos mais conseguidos e contagiantes.
(continuando)
AH! E não perdoo a péssima direcção de orquestra; Tomàs Pal já lá está há muito tempo e deve ter demonstrado abundantemente que não serve, mas tem claque ( ao meu lado, aplausos vibrantes ); deve haver por lá amiguismos e capelinhas.
Caro Mário
Na Itália, um pouco como nos países latinos, por vezes os anos de casa contam mais que o talento. Vemos isso nas empresas, na pessoa cuja função já não tem realmente utilidade mas mantém-se por afeição e por ser um "símbolo" da empresa. Vemos isso no desporto profissional no cepo que por ser prata da casa os adeptos vão sempre apoiá-lo e a direcção vai mantendo esse atleta no clube por esse mesmo motivo, e acredito que no mundo artístico se passe algo parecido, senão mais acentuado, dado a música ser algo que desperta sentimentos tão poderosos.
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