- da série 'Viagens virtuais e improváveis' -
Se há alguma zona civilizada no planeta que possa parecer uma extensão da Europa, é a Oceânia - por acaso (?) também a mais longínqua, e mesmo diametralmente oposta. Austrália e Nova Zelândia gozam de um invulgar bem estar, sem paralelo na Ásia, que só se aproxima dos países europeus: sociedades saudáveis, bom nível de vida incluindo assistência e serviços sociais do estado, cultura, abundância de recursos humanos e de oferta de bens, tendência igualitária e máxima liberdade, níveis baixos de corrupção e de criminalidade.
O crescimento é ideal - à volta de 3% - e estável, sem ter sentido a concorrência dos duvidosos BRIC. Tudo isto sem o frio do Canadá, nem o petróleo da Noruega, nem os bancos da Suíça. Como conseguem ? Provavelmente algumas respostas serão incómodas.
Em rigor, os antípodas de Portugal variam entre o mar, a oeste da Nova Zelândia, e o parque nacional de Kahurangi, para o interior norte. As cidades mais próximas de estarem do outro lado de um túnel desde Portugal através da Terra são Wellington, Christchurch, onde houve há pouco um grande terramoto que destruiu parte do centro histórico, e Dunedin, já mais para sul da ilha, talvez a mais bela do país, com muitos edifícios edwardianos e victorianos e uma vitalidade cosmopolita que não seria de esperar em sítio tão afastado do resto do mundo.
Fundada por imigrantes escoceses em 1848, Dunedin teve um arranque lento e pouco próspero, até se descobrir, em 1861, uma jazida de ouro nos arredores. Agora lidera o país como centro económico, comercial e industrial - foi lá que muitas das maiores empresas neozelandesas de manufactura, transporte e comércio nasceram. A Universidade é a mais prestigiada do país, e ser cidade universitária é uma das maiores valias de Dunedin.
Foi o Dunedin Consort, a que me referi aqui ainda há pouco, que me revelou esta cidade igualmente baptizada e me espicaçou a curiosidade. Não tem nada a ver um com a outra.
Os fundadores escoceses queriam fazer de Dunedin a 'Edimburgo do Sul '.
O próprio nome, aliás, tem origem no castelo de Edimburgo ( gaélico Din Eidyn, = 'o monte de Odin'). A maior parte da toponímia é também importada de lá, e até um Fringe Festival tem lugar anualmente. (http://www.dunedinfringe.org.nz/)
Porque será que as tradições da colónia fundadora e o orgulho pela parentalidade com a Escócia se mantêm tão vivos ao ponto de a estátua central ser do venerado poeta Robert Burns ? Alguma ex-colónia portuguesa teria Camões no centro da sua principal praça, ou Torga ?
Robert Burns frente à Catedral de S. Paulo (de 1919).
Uma das coisas mais interessantes em Dunedin é a unidade arquitectural. Muitos edifícios - sobretudo institucionais - são construídos numa espécie local de basalto (breccia vulcânica) e calcário branco, com decoração exuberante, incluindo trabalho em ferro forjado. Começo pela famosa Estação.
Obra de 1907, construída sem orçamento ( - 'queremos o melhor' !) - o arquitecto escocês até colunas de granito e mosaico taliano enviou por barco. A fachada de estilo renascença flamenga alterna basalto escuro e calcário, criando um efeito "bolo de casamento" comum a outros edifícios da cidade.
Agora é um ícone da cidade, com interiores também ricamente decorados. Não posso deixar de admirar como os britânicos levaram para o outro extremo do mundo o melhor que aprenderam a fazer em termos de arquitectura e caminhos de ferro.
Outros exemplos:
A Catedral de S. José, católica, completada em 1886
O Fortune Theater, que ocupa uma igreja desactivada em gótico revivalista da época victoriana, em basalto azulado e calcário. Um dos locais de cultura mais activos e frequentados, com companhia residente.
Site:
http://www.fortunetheatre.co.nz/OBHS, Otago Boys High School, gótico revivalista de 1855.
A entrada da Otago University.
Tribunal (Law Courts), de 1899.
Talvez o mais conseguido dos edifícios neo-góticos da cidade.
Uma curiosidade é o edifício da Câmara, de 1880:
Então não é mesmo parecida com a do Porto ? Lá está, deve ter vindo a inspiração via túnel através do magma terrestre.
E até ... um castelo ! Sim !
Larnach Castle, o único da Nova Zelândia, erguido entre 1871 e 1887 para o Ministro da Minas (de ouro, claro), que por acaso teve um triste fim.
Uma mansão ao estilo baronial escocês, aberta ao público.
Uma das instituições mais prestigiadas é a enorme fábrica da Cadbury:
Nas ruas comerciais, George Street e Princes Street, há fachadas coloridas, com trabalho em gesso ou em ferro forjado.
http://en.wikipedia.org/wiki/Princes_Street,_Dunedin
E finalmente, cafés, marca da Europa. Também há.
'Good Earth Cafe', Cumberland St.
Uma originalidade que nenhum visitante deixa de ver, é a rua mais íngreme do mundo (Guinness Book), a Baldwin Street, com uma inclinação de 1 para 2.8 , ou seja, 36%.
Casa direita, rua inclinada, ou...
... rua direita, casa inclinada.
Agora alguns interiores da estação :
Chão de mosaico italiano.
Música ?
When: Wed 3 September 2014 07:00p.m.
Where: Dunedin Town Hall
New Zealand Symphony Orchestra
Haydn - The Creation
Nicholas Mcgegan - conductor
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Não parece uma bela pequena cidade?
Digamos que esta nossa antípoda não deixa de ser Dunedin 'com sorte'.
4 comentários:
Magnífico Mário, muito obrigado. Tenho pena que não haja um "magma express" que me pudesse levar à Nova Zelândia para poder degustar ao vivo todos estes locais saborosos que nos oferece.
Há um atraso muito grande da ciência em relação ao que a ficção prometia no século passado. 'Magma Express', era fixe.
Resta a net.
Ler este blogue é sempre aprender...
Fiquei bouchebée ( é assim que se escreve?) com a profusão em termos fotográficos e informação. Deve ter levado horas a compôr este post!!
E nós agradecidos.....muito mesmo!
Horas, sim, Virgínia.
O pior são os pormenores técnicos de paginação, demoro mais aí porque quero as coisas 'bem apresentadas'.
Mas, sabe, depois da motivação encontrada, é um gozo permanente até à publicação.
Obrigado, boa semana.
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