Volto ao tom mais ligeirinho, desta vez dedicado a apreciadores da bica, cimbalino, il espresso.
Depois da corrida migratória para Oeste, o futuro parece ser o Norte - go North young man. Na América, na África e Médio Oriente, as vagas migratórias vão para Norte. E os extremos - Canadá, Noruega, Suécia, Alasca, Gronelândia - são já refúgios para quem quer escapar da fornalha e procura emprego ou lazer sob a fresca. Lá ainda se encontra aventura, inesperado, e trabalho para quem tem formação ou empenho, e até inspiração para literatura e poesia.
E cafés, o tal sinal definitivo de civilização, também há ? Mesmo que seja um pub/café, ou café/bar...
“Coffee is a lot more than just a drink; it’s something happening. Not as in hip, but like an event, a place to be, but not like a location, but like somewhere within yourself. It gives you time, but not actual hours or minutes, but a chance to be, like be yourself, and have a second cup”
Gertrude Stein, Selected Writings
Eis o resultado de uma breve e refrescante procura na net, sempre acima dos 60ºN. Viagem virtual e improvável, como é habitual aqui, saltitando de café em café :)
1. Mellegeret Café, Ny Ålesund , ilhas Svalbard (Noruega)
78°55' N
Já aqui o referi uma vez - é uma imbatível primeira escolha, a quase 79º N, na perfeição de um ambiente Ártico remoto e pristino. Ursos brancos a rondar perto.
Com vista para fiordes e montanhas geladas, na direcção do Pólo Norte, não há quem não tenha ouvido falar dele. Um must.
O Mellageret foi construído em 1919 como armazém de farinha, ligado à proximidade da linha férrea mineira.
Esplanada a dar para os glaciares. Qualquer um se inspira para um poema.
2. The Seaview Café, Hope, Alasca
60° 55′ N
Hope, esperança, já é um bom presságio...
O "Mar à Vista" no Alasca, ao fundo da Main Street da cidade de Hope, não fica muito a Norte, mas a minha segunda escolha é um monumento - está classificado como National Heritage, já existe há 120 anos a aquecer alma e coração a gente enregelada; tem, felizmente, sido renovado e melhorado, sem prejuízo da traça original.
Celebrando o Solstício de Verão no Seaview
Ponto de encontro de gente que vive num raio até centenas de quilómetros, é já um lugar mítico também. Infelizmente, fecha entre Outubro e Abril.
O interior, quentinho, contrasta com o que vai lá fora, mas a vista vale mais.
Ainda estamos muito a Sul do Círculo Polar, mas a paisagem já é ártica.
3. Cafémma, Uummannaq, Gronelândia
71º 52' N
Este é muito recente, quase novo em folha ! A Gronelândia convertida ao café.
Na maior 'cidade' (aldeia por padrões europeus) do norte da Gronelândia, destino turistico de espantosa beleza, este café do alto Ártico é para curtir sobretudo em... esplanada, o que exige roupas bem quentes !
Como café urbano, este deve ter o record absoluto em latitude - mais a Norte é difícil encontrar cidades.
No interior, café com vista para o porto. Escrever uma novela ?
Requinte a quase 72º N, no país dos esquimós. Custa a acreditar.
4. Inuit café, Ilulissat, Gronelândia.
69° 13' N
Ilulissat é a Meca do turismo na Gronelândia, por causa do glaciar Sermeq Kujalleq, classificado (com a zona envolvente) como património mundial pela Unesco. Está 200 km a norte do Círculo Polar, ainda é frio que chegue. O café/restaurante abriu em 2011, sinal da mudança de hábitos - talvez a tentar desviar a tendência local do álcool.
Os elementos Thai denunciam a nacionalidade do proprietário.
5. Gallery Café, Inuvik, NWT, Arctic Canada
68º 21' N
Inuvik é uma povoação Inuit que cresceu até ser pequena cidade, no grande delta do rio Mackenzie, 200 km a Norte do Círculo Polar. Mesmo no centro, o Café Gallery é uma extrema raridade nestas terras, uma de que Inuvik fez culto. Mas fecha no Inverno.
Com bolo e tudo. Mas nas Terras do Noroeste do Canadá (NWT), cafés só nos hotéis; O Gallery é (era ?) uma excepção. Este ainda não é um Ártico muito apetecível...
6. Bláa Kannan, Akureyri, Islândia
66º 18' N
Akureyri é uma cidadezinha islandesa, ártica q.b., mas com um ambiente urbano já razoável (pop. 20 000), e que oferece entre outros o excelente Bláa Kannan. Muito concorrido no Verão.
Flores e far niente a 66º N, não há muito onde.
7. The Glue Pot, Nome, Alasca
64º 30´N
Nome é uma cidadezinha histórica e modesta da era da corrida para o ouro (1898-1900), no Noroeste do Alasca, e aberta às investidas violentas do mar de Bering.
Ao longo da rua principal, que lembra o Faroeste americano, os bares em madeira são porta-com-porta; no Glue Pot, que é bar e serve café, há gulodices e ... gelados ! Sim, em regra as gentes do Ártico adoram gelados - se calhar são mais quentes que o ar que respiram...
Aberto toda a noite.
8. Café Ruiskuhuone, Raahe, Báltico, Finlândia
65º 25' N
A Finlândia não será um país de cafés, certamente. Raahe é um pacata mas bonita cidadezita do ártico finlandês, e oferece um grande espaço de convívio à beira da água do Golfo da Bótnia: o Café Ruiskuhuone, que serve sobretudo como bar e café-concerto.
No inverno parece pouco convidativo:
Mas
Fica assim nas tardes de Verão.
E assim nas noites.
9. Trondheim, Noruega
63º 10' N
Trondheim é talvez a maior cidade acima de 60º N, sem dúvida a mais bela. Muito concorrida e cosmopolita, tem vários cafés ( e casas de chá) - difícil é escolher.
Numa das ruas mais antigas, fica o 'Dromedar'. Ia já para lá a correr.
Com sol ou com neve, de dia ou de noite. Estamos a dois passos do Ártico.
Melhor, só o luxuoso Ni Muser, com doçaria de morrer, localizado junto à fabulosa catedral Nidaros:
Contrariamente ao que se diz, a Noruega tem a cultura Europeia do café. Já a Suécia nem tanto.
Para gostos urbanos e bolsas cheias, não há melhor escolha.
Boas calorias para os 63º N !
10. Café Natur, Tórshavn, ilhas Faröe (Dinamarca)
62° 00′ N
Bem, Tórshavn já é uma capital !
As lindíssimas Ilhas Faröe até nem ficam assim tão longe, à distância de um vôo de Copenhaga. Na capital há vários cafés, mas o Café Natur é o mais antigo e o mais bonito.
Situado no antigo porto, fica junto à cidade velha e ao parlamento Viking. Também já é um café/bar mítico, imperdível.
Café :
Noir comme le diable,
Chaud comme l'enfer,
Pur comme un ange,
Doux comme l'amour.
Talleyrand
Dromedar, Trondheim
Disclaimer: alguns destes estabelecimentos podem entretanto ter encerrado, não garanto os dados à data de hoje.
2 comentários:
O frio que apanhei no Canadá desgostou-me de vez dessas latitudes.. Mas as esplanadas são apetitosas. Durante muitos anos achei incrível que Lisboa tivesse muito menos esplanadas do que qualquer cidade com pior clima; finalmente parece estar a mudar.
Não há fome que não traga fartura , Gi - agora são de mais ! E muitas ocupam os passeios de forma caótica.
Mas Londres sofre do mesmo: nunca foi cidade de "al fresco", agora é uma invasão incómoda.
Mas o que me agrada nestas terras do Norte é que estejam a melhorar a qualidade de vida - já sabem e gostam de passar um tempinho à boa vida e ao ar livre, a conversar, a observar, a ler, com o seu café. Poucas coisas há de melhor para levarmos conosco quando acabar.
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