Gosto muito deste poema de Catherine Barnett publicado no livro Human Hours, título retirado dos seus últimos versos, '
Instead I only leaned my bike against the church /
and looked out across the sea of human hours '. Foi inspirado pela leitura do Essay concerning Human Understanding do filósofo inglês John Locke, que nele apresenta a célebre tese da 'lousa em branco', a tabula rasa que seria a nossa mente à nascença.
Eu já o tinha postado no original, aqui; fica agora uma tentativa de tradução:
Ensaio sobre a Compreensão Humana
Catherine Barnett
John Locke diz que as crianças não percebem o decurso do tempo
e quando eu era menina isso era verdade
e continua verdade -
Já foi há trezentos anos mas o que sinto por Locke
ainda não é assunto encerrado.
Conservo o livro dele na minha bolsa
com outros prazeres -
bâton, Bayards, fósforos, clips, e um pequeno sabonete
roubado na Renaissance Inn
onde às vezes engano Locke com outro homem.
Pelo menos os objectos perduram -
vejam como o velho sofá se aguenta !
Locke teria bom aspecto deitado aqui
com o seu rosto alongado, rugas na testa e ao centro ...
ele que demasiado depressa floresceu
e ultrapassou este lugar de multidão.
La Duration, disse eu, tentando rolar o 'r '
quando uns amigos franceses perguntaram
em que andava eu a pensar.
John Locke et la Duration.
Pensaram que eu disse l'adoration,
o que é verdade também.
Acontece que duration não é francês,
por má que seja a minha pronúncia.
O termo correcto é la durée
outra palavra que não digo bem
embora tenha uma vez passado uma bela durée
a pedalar a minha Vélib' alugada ao longo do Sena
até ao Sacré-Coeur,
onde tinha planeado antecipadamente
que passaria a noite em adoration.
Em vez disso encostei a bicicleta contra a igreja
e fiquei a ver o mar das horas humanas.
Ver o mar das horas humanas. Aí está um espectáculo que não foi cancelado, que oferece toda a variedade de emoções; na grande maioria das sessões contudo são emoções de desânimo e desapreço pelas más encenações, más actuações, má direcção, já para não falar do texto que ninguém sabe quem escreveu mas está muitíssimo mal escrito. É uma alegria quando, coisa rara, há um rasgo de talento, uma centelha de beleza a iluminar a plateia.
1 comentário:
Obrigada por este post. O poema é fantástico, como todos os que escolhe, e gosto das suas traduções. O último parágrafo, nestes dias em que ando de tão mau humor, também me faz sentir menos sozinha, e diz com elegância aquilo que eu só poderia dizer mal. Obrigada.
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