Perugia foi outra italiana imperdível que, ahimè, perdi.
Uma das pessoas a quem muito devo foi essa irmã do meu pai que entre outras coisas me deixou o bichinho de viajar pela Europa, e em particular Itália, França e Flandres. Não casou, tinha por isso tempo e disponibilidade, algumas (poucas) poupanças, e sobretudo uma grande sede de História e Cultura que eu herdei. Isto não é um post qualquer, é a minha humilde homenagem; e pouco a pouco foi ficando mesmo um dos meus melhores posts aqui!
Palmilhou Itália pedra a pedra, capela a capela, museu a museu. É quase inacreditável a extensão da lista de cidades e locais históricos que visitou. De tudo isso fazia, na volta, pequenos dossiers com guias, mapas, postais e notas de viagem.
Para meu consolo e já agora para uma publicação rica de cultura mediterrânica, cá vai Perugia como ela terá visto, mais ou menos; como nunca tive oportunidade de lá chegar, faço a visita inspirado por ela e suas notas. Juntei imagens digitalizadas de postais que ela tinha no dossier, 'melhoradas' em Photoshop.
Ela foi de Roma, de combóio (viajava sempre de combóio), e mal chegou deve ter caminhado direitinho até à Casina di Perugia onde se alojou, por trás da Piazza IV Novembre. Imagino que se sentou num dos degraus do Duomo, de frente para a fonte, a Fontana Maggiore.
De 1277, esta obra de Fra Bevignate celebrou a chegada de água à cidade depois de concluído o aqueduto que a trouxe de um monte próximo. As lajes de mármore esculpidas em baixo-relevo são obra de Nicola Pisano.
No tanque superior, imagens dos Santos (Pedro, Paulo, Lourenço...) e a personificação de Perugia, uma raínha próspera com uma cornucópia, símbolo da abundância de que gozava a cidade desde o séc. XII.
Em baixo, cenas das Quatro Estações, bíblicas e de trabalho.
Outono: o envasilhamento do vinho.As origens de Perugia sao pré-etruscas. Mas foram os Etruscos que alargaram e fortificaram a cidade, e lhe coseguiram importância regional. Quando a Fonte foi construída, era a mais rica cidade da Umbria.
Do aqueduto resta ainda uma pequena secção transformada em Via del Acquedotto para peões, na parte alta da cidade.
Palazzo dei Priori - Galleria Nazionale dell' Umbria
O Palazzo dei Priori, construído entre 1293 e 1343, é talvez o mais perfeito dos palácios gótico-medievais italianos. Foi sempre sede administrativa e agora também lá está alojada a Galeria Nacional da Umbria.
A Entrada lateral faz-se pelo Corso Vannucci.
A Galeria expõe quase apenas imagens bíblicas, dezenas de Annunciaziones, Madonnas col Bambino, Trípticos góticos.
Mas há pelo mesmos uma surpreendente obra-prima: Santa Cecília a tocar a Espinetta *, de Orazio Gentileschi (1622).
De novo na Praça, o grande portal do 1º andar, no topo da escadaria, abre-se para a Sala dei Notari, de tectos pintados com as Fábulas de Esopo.
Profetti e Sibille.(metade inferior), painel de Perugino.
Em frente ao Palácio, do outro lado da Fonte, fica a Catedral gótica inacabada (1345 - 1430), tosca e incaracterística. Deste lado, a fachada lateral, o melhor é a loggia que abriga da chuva ou do sol, e os degraus ao longo da parede para sentar a disfrutar a praça.
Lá dentro as madeiras com embutidos do coro são uma das poucas riquezas decorativas.
A cidade velha organiza-se em torno de duas vias - O Corso Cavour e o Corso Vannucci - e duas praças - a Piazza Italia, ajardinada, e a IV de Novembro, o 'centro histórico'.
A Pastelaria Sandri, Corso Vannucci 36, é uma instituição na doçaria de Perugia. Finalmente, uma arte secular :)
Chocolates, vinhos, pastelaria e café numa sala de 1860.
O Corso Cavour é uma rua estreita entre fachadas altas em cores pastel; percorridos alguns metros passa-se à Praça Giordano Bruno, uma pequena praceta, onde se situa o antigo Mosteiro de San Domenico, agora adaptadao a Museu Arqueológico Nacional da Umbria,(MANU). E que museu !
Entra-se pelo claustro.
Uma peça bem conhecida, a Sereia (há quem lhe chame Tritone) em bronze, verdadeira obra prima. (séc VI A.C).
Kylix, 555-535 AC.
Passada a Porta Marzia e os panorâmicos Giardini Caducci, sítio excelente para sentar, as pernas já devem estar martirizadas. Da balaustrada vêem-se os telhados, os jardins e as torres da cidadae, entraremos no Corso Vannucci, uma vulgar rua de esplanadas e alta moda.
A parte alta de Perugia é extremamente íngreme, uma via de trânsito tem de seguir em sucessivos SS encosta acima, e as vias pedonais precisam de falsos degraus esculpidos para vencer a forte rampa. Uma garrafinha de San Pellegrino é indispensável. As vielas do alto, como a Via Bartolo, a Via Ritorta (o nome diz tudo); a Via Appia, que cruza o percurso do antigo Aqueduto e a via Cesare Battisti, são um labirinto de curvas e declives, escadas sob arcos e túneis, qual delas a mais pitoresca, caótica e desnorteante.
Ponte da Via Appia sobre o Aqueduto, visível mais abaixo.Via do Aqueduto.
Via Maestà delle Volte
Nessa rede de vielas em declive, a Via Maestà delle Volte começa numa esquina esconsa da Piazza IV Novembre junto à catedral, e como um cenário de filme passa entre altas fachadas uma fonte sob arcos, ruínas de portais, túneis, e chega à Piazza Cavalotti.
Sob um Arco do século XV, foi construída em 1928 esta fonte de imitação medieval, com bom gosto, convenhamos.
É outra referência inconfundível, uma das 7 antigas portas da muralha. A parte etrusca termina no friso; a loggia é uma adição renascentista do séc. XVI.
* espécie de clavicórdio, um pequeno cravo.
4 comentários:
Fantástico. Obrigado!
Desta vez, acertei num sítio onde já esteve, Fanático-Um? Numa ida a Pesaro?
Não, nunca estive, mas ainda não peri a esperança de lá ir, assim a pandemia o permita!
Repito-me sempre nestas suas publicações de viagens, mas mais uma vez, obrigada! E como alguém que gosta mesmo da arqueologia das gavetas, que bom, ter um tesouro familiar assim para percorrer e celebrar. Um abraço!
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