terça-feira, 5 de outubro de 2021

As casas-museu de Kirkjubøur e Saksun



Não se pode esperar grande arte europeia nos museus das ilhas Faroé. Se ainda hoje vivem à parte num modo de vida que beneficia de apoios mas não obedece às normas europeias, até há meio século atrás eram ilhas atrasadas, raramente visitadas, onde as comunidades piscatórias e de pastoreio viviam pouco melhor do que em modo de subsistência, conservando tradições milenares; o que por outro lado faz das ilhas no seu todo um museu.

Na verdade existe em Tórshávn, a capital, um museu com obras do pintor faroense Sámal Joensen-Mikines, o Listasavn Føroya. Mas o mais genuíno que as Faroé têm para mostrar da sua história está em casas-museu, em particular o conjunto que existe em Kirkjubøur, na ilha de Streymoy, a maior e mais povoada (~25 000 hab.) das Faroé e também uma das mais belas e incontornáveis.


A ilha de Stremoy fica à volta dos 62º N de latitude, tem numa extensão noroeste - sudeste 42 km por 10 de largura. Sem floresta, está coberta de verde excepto no Inverno. É uma das ilhas mais desenvolvidas, com rede de estradas e pontes.


Kirkjubøur
fica no extremo sul, na costa e sobranceira ao mar, como a larga maioria das povoações; actualmente só lá vivem umas 70 pessoas. É o mais importante local histórico das Faroé, residência de Erlendur, o bispo viking, filho do rei Horik da Dinamarca, que fez construir na aldeia, por volta do ano 1300, a grandiosa Catedral de Magnus, de que sobram só ruínas - ou talvez nunca tenha sido acabada. Marcava a cristianização das ilhas, até aí submetidas à Noruega e fiéis ao culto nórdico.



O que resta da catedral é testemunho suficiente da importância da diocese das Faroé e do seu bispado em Kirkjubøur. A residência episcopal Kirkjubøargarður - a Granja de Kirkjubøur - tinha portanto uma dignidade especial; foi contruída por volta de 1100, antes da nossa nacionalidade.


Roykstovan é a casa mais antiga, talvez anterior a 1100. A entrada era de costas para o mar.


Mais abaixo do complexo e perto do mar, a Igreja de St. Olav, também ela muito antiga, cujo interior moderno e despojado ainda serve o culto.


É uma das casas de madeira ainda habitadas mais antigas do mundo.


O leão empinado com machado é como um brasão, e indica submissão ao reino da Noruega.


Não havia árvores nas ilhas*, a madeira vinha da Noruega, ao que diz a lenda chegava à deriva por mar até dar à praia. A parte mais antiga da casa são as salas roykstova (sala de fumo) e loftstovan (águas furtadas), agora biblioteca.



A Roystova é a sala convivial, para trabalhar e jantar, a maior da casa, com uma abertura no tecto para a saída do fumo produzido pelos fogões.




A biblioteca era onde o bispo Erlandur se recolhia a trabalhar.

As casas Kirkjubøargarður são propriedade do Estado cedidas à família Patursson, que as ocupa desde 1550, e actualmente vive na parte mais moderna e cuida das outras, declaradas património histórico.

O complexo mais recente data do séc. XVI/XVII




Sala da casa da família Patursson.

Saksun fica na costa noroeste da ilha Streymoy. Já foi uma entrada de mar entre montanhas, que formava um bom porto de abrigo. Uma tempestade violenta bloqueou a entrada com areia, criando uma lagoa de água salgada sem acesso do mar. 


Saksun deixou de ter um porto, é uma aldeia pitoresca no extremo da lagoa. Praticamente são meia dúzia de casas em redor de uma quinta de pastoreio do século XVII, e que foi estaurada como Casa-Museu Dúvugarður. Ainda se mantém activa como para criação e pastoreio de ovelhas.

Com os seus tectos cobertos de turfa relvada, as casas estão bem conservadas como exemplo da casa agrícola faroense.


No interior exibem-se sobretudo utensílios e mobílias no seu contexto original.


glasstova (sala do vidro) é a única com janela de vidro. É onde se dorme, come e trabalha.


A sala é aquecida com um fogão alimentado de carvão em brasa através de um furo na parede:



Mais:

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* Desde há poucos anos foi possível plantar e manter uma pequena floresta e árvores dispersas.




2 comentários:

Henrique Vaz disse...

Gostei da reportagem sobra as ilhas Faroé, mais propriamente sobre as casas-museu.Apesar de tudo não é sítio onde eu gostava de viver...

Mário R. Gonçalves disse...

Na nossa idade, já só estamos bem a viver na 'nossa terrinha'. Se tivesse 20 anos, quem sabe, era uma bela aventura e uma vida radicalmente diferente. Ainda bem que gostaste, Henrique.