sábado, 2 de abril de 2011

o Trans-siberiano (IV)


SIBÉRIA PROFUNDA
Entramos na Ásia!

Vamos dar as boas vindas com um siberiano fofinho:


Sei que não falta por aí quem se derreta com felinos.

Omsk , capital da Sibéria ?

Mais uma monumental estação:



Luxos imperiais no interior


Omsk foi considerada capital da Sibéria e base do exército cossaco no séc. XIX. É hoje um grande centro industrial e mineiro (o Altai é rico em minérios), e um ponto de conexão entre os dois ramos do Trans-siberiano (para a Mongólia ou prosseguindo na Sibéria). De resto, vamo-nos, também não merece visita.

O ALTAI

Cadeia montanhosa na Ásia Central, no ponto onde Rússia, China, Mongólia e Cazaquistão se encontram. A mais protegida floresta da Taiga encontra-se aqui. Para leste, as montanhas, lagos e florestas dão lugar à estepe, mais a sul ao deserto de Gobi.

Zona de confluência de fronteiras e culturas, a cadeia do Altai foi terreno de Genghis Khan e de gerações de negociantes da Rota da Seda; agora é uma região abandonada e raramente visitada, embora com sucesso no turismo dito "de aventura".



A estepe



Ao passar nas proximidades da Mongólia, poderemos ter a sorte de ver uma ou outra ger, ou yurta famosa tenda circular usada pela população nómada das estepes da Mongólia e do Altai.


Funciona também como relógio astronómico: a porta, virada a Sul, deixa que a luz do sol vá iluminando diferentes zonas do interior ao longo do dia.

Excelente leitura aqui:


Novosibirsk, a cidade do Altai.

Estação

Raras casas de madeira, com janelas rendilhadas

Novosibirsk é a 3ª cidade da Rússia. De fundação recente (1893), nasceu da necessidade de construir uma ponte para o Trans-siberiano atravessar o rio Ob, localização estratégica no percurso: rapidamente, a cidade cresceu e tornou-se um importante centro industrial.

Clicar para ver pura fealdade

Cidade sem História (quase), de arquitectura feia à base de blocos e mastodontes administrativos, muito poluída e com uma horrível cintura de dormitórios. Cidade-persadelo a evitar.


O Altai, zona de encontro de povos e civilizações:

Les Usbecks étaient là avec leurs grands bonnets de peau de brebis noire, leur barbe rouge, leurs yeux gris, leur «arkalouk», sorte de tunique taillée à la mode tartare. Là se pressaient des Turcomans, revêtus du costume national, large pantalon de couleur voyante avec veste et manteau tissus de poil de chameau, bonnets rouges coniques ou évasés, hautes bottes en cuir de Russie, le briquet et le couteau suspendus à la taille par une lanière; là, près de leurs maîtres, se montraient ces femmes turcomanes, aux cheveux allongés par des ganses en poils de chèvre, la chemise ouverte sous le «djouba», rayé de bleu, de pourpre, de vert, les jambes lacées de bandelettes coloriées qui se croisaient jusqu’à leur socque de cuir. Là aussi, — comme si toutes les populations de la frontière russo-chinoise se fussent levées à la voix de l’émir,— on voyait des Mandchoux, rasés au front et aux tempes, cheveux nattés, robes longues, ceinture serrant la taille sur une chemise de soie, bonnets ovales de satin cerise à bordure noire et frange rouge; puis, avec eux, d’admirables types de ces femmes de la Mandchourie, coquettement coiffées de fleurs artificielles que maintenaient des épingles d’or et des papillons délicatement posés sur leurs cheveux noirs. Enfin des Mongols, des Boukhariens, des Persans, des Chinois du Turkestan (...)

Jules Verne, Michel Strogoff


Ah, e convém não esquecer que o Altai é Património Natural declarado pela Unesco.

Continuemos, pois, pela planície siberiana:



Tum dum - tum dum, clic clac.  Tum dum - tum dum, clic clac.

A banda sonora quase circadiana, ruído de fundo em viagem, é uma parte importante da vida a bordo. Quando, chiando, o comboio trava numa estação, segue-se um silêncio maravilhoso e ao mesmo tempo perturbador, como se um dos nossos órgãos tivesse parado de funcionar. Hesitamos entre adormecer no silêncio ou sair para esticar as pernas.

O mais estranho é que não queremos parar. A vontade é continuar, sempre.
Tum dum - tum dum, clic clac. Pela janela, desfocadas, desfilam árvores, uma igreja, árvores, estepe. 
Etapa cansativa, esta, e menos interessante. Nunca mais chegamos a Irkutsk!


Fim da reportagem, por hoje. Recolhemos aos aposentos. Vai um cafezinho?

Próxima etapa:
- A travessia do Yenisei, a estepe e o deserto
- Irkutsk e o lago Baikal, ponto alto da viagem.


"Michel Strogoff sentait en lui comme un désir farouche de s’élancer à travers la steppe, de franchir à vol d’oiseau la distance qui le séparait d’Irkoutsk"

8 comentários:

Gi disse...

Esta série faz-me lembrar com saudade os livros de aventuras e viagens que li na adolescência - Verne, Salgari, Obrutchev...

Já pensou escrever romances do género? Fazem falta...

Mário R. Gonçalves disse...

... Corto Maltese, A Peregrinação, as viagens de Marco Polo...isso mesmo.

Escrever romances, eu? :D
Obrigado pelo "elogio", Gi.

Paulo disse...

Esta série é óptima. Pena estar etiquetada como "utopia".

Mário R. Gonçalves disse...

Paulo,

Obrigado. Para mim , é utopia,com uma muito ténue esperança de realização. Para o Paulo deve ser mais alcançável, aproveite !

Vai ficar "varado" com Irkutsk e Khabarovsky.

Alberto Velez Grilo disse...

Muito bom Mário. O que falta às cidades que referiu é compensado por paisagens fantásticas.

Joana disse...

Parece que este trecho do percurso tem o mesmo poder evocativo em quem o segue. Lembrei também os livros de cabeceira da minha infância, a saga de Grishka ( de René Guillot), um rapazinho de uma tribo da taiga,com o seu companheiro urso e a sua inseparável amiga, Yakhou. Foram os livros mais fantásticos que li até hoje, cheios de exotismo e emoção. Através deles, vivi na tenda circular e aqueci-me ao fogo,esperei, no rio, a chegada das renas, cacei o grande alce, resisti a um cerco de lobos e travei amizade com Djidi, o grande urso negro.
Foi muito bom ter apanhado este comboio, Mário. Ainda bem que a carruagem esperou por mim. Obrigada!

Mário R. Gonçalves disse...

Cara Joana,

Linda memória essa ! Já nem me lembrava do "Grichka e o Urso" ! Mais uma que partilhamos ...

Descanse, nunca chega atrasada, eu espero.

Anónimo disse...

Estou na região de Dornod province, leste Mongólia perto da China e da Russia. Os padrões são incomuns, o nivelado sem fim, uma só paisagem 360°. Magnífica a coisa. Vegetação rasteira não fechada inarredavelmente a mesma alternada entre o verde e o cinza de presença única e absoluta açambarcando a vastidão. Solo silto arenoso mais arenoso que siltoso. Os caminhos implantados o são pelos pneus que simplesmente sulcam o solo e mudam para rotas paralelas conforme se aprofundam. Não se vê nada ao derredor sendo que o nada é o tudo soberano e magnífico. A magnitude de Deus nos confunde no desenho da superfície variadíssima do planeta onde fomos colocados provisórios. Se assim, colados e presos ao solo de um imenso globo ficamos extasiados, quanto mais não ficaremos quando desprendidos navegaremos na eternidade de terceiros Céus para cujas visões os humildes outrora incorporados serão contemplados...:)