Como os russos gostam de títulos pomposos ! Trata-se de uma minúscula estação meteorológica e uma mísera cabana feita museu. Mas nesta latitude, mesmo isso é raro e inesperado, como eu gosto.
É noite polar durante quatro meses, e Verão por apenas três semanas. A única vida em terra é um ocasional urso ou raposa, e umas floritas tíbias na primavera, sobre a tundra.
Um grupo de ilhas pequenas a Oeste constitui o Arquipélago Sedov. Duas das mais pequena ilhas, espantosamente, são 'habitadas' de certa forma: a ilha Sredniy tem uma pista de aterragem militar, e, vejam lá, um Museu ! - e a minúscula ilha Golomyanniy acolhe (se a palavra não faz rir) uma estação meteorológica desde 1954, parte da famosa rede de estações construída no fim do czarismo e depois grandemente desenvolvida pelo estado soviético.
Zoom-in :
Arquipélago Sedov - fitas de tundra plana cobertas de gelo.
Golomyanniy é uma ilhota lisa e estreita, normalmente gelada, rodeada de águas profundas mas também debaixo de capa gelada, difícil de encontrar entre as muitas pequenas e maiores ilhas de Severnaya Zemlya.
Golomyanniy, estação meteorológica
Coordenadas: 79° 30′ N, 97° 45′ E,
(a latitude do extremo norte das ilhas Svalbard)
Ocupação permanente: 6 (entre 3 e 7).
Sem praias, sem elevações, uma plataforma de terra rasa de aluvião que cai a pique sobre o mar gélido.
Foi assim que Georgy Ushakov, explorador russo, descreveu a ilha em 1930:
" A triste e vazia ilha de Golomyanniy, (...) um estreito pedaço de terra, mais
me parecia o dorso de uma baleia à tona de água. Da primeira vez que nela desembarcamos sobre a escorregadia superfície branca, caminhamos às cegas, cuidadosamente, tendo mesmo que rastejar a quatro para evitar que a qualquer momento mergulhássemos no abismo gelado."
A estação fica no topo noroeste da ilha, numa faixa com 300 m de largura.
A estação lembra uma 'dacha', perdida a um canto da pequena ilha anónima.
Pelo menos uma família tem de viver aqui para fazer todo o trabalho - recolha de dados, previsões, estudos estatísticos, comunicações, manutenção, e fazer os possíveis para que a vida seja suportável.
Além da casa grande habitada, duas outras cabanas servem de armazém, abrigo do gerador eléctrico e garagem.
Água não falta, de uma pequena barragem alimentada por uma corrente de fusão dos gelos. A pesca é também possível, mas difícil - barco está fora de questão. Para tudo o mais , a pequena equipa - três a sete no máximo - depende das entregas de mantimentos por ar ou por mar, quando é acessível ao quebra-gelos.
Chegam suprimentos de inverno.
Parece uma 'dacha', mas a 80º N.Pelo menos uma família tem de viver aqui para fazer todo o trabalho - recolha de dados, previsões, estudos estatísticos, comunicações, manutenção, e fazer os possíveis para que a vida seja suportável.
Além da casa grande habitada, duas outras cabanas servem de armazém, abrigo do gerador eléctrico e garagem.
Água não falta, de uma pequena barragem alimentada por uma corrente de fusão dos gelos. A pesca é também possível, mas difícil - barco está fora de questão. Para tudo o mais , a pequena equipa - três a sete no máximo - depende das entregas de mantimentos por ar ou por mar, quando é acessível ao quebra-gelos.
Chegam suprimentos de inverno.
Normalmente vive na casa maior uma ou duas famílias, permanecendo vários anos - 20 anos foi o caso recente de Anatoliy e Svetlana Omelchenko com o filho mais novo. Toda a área costuma estar bem cuidada, as casa em boas condições, o parque tecnológico a funcionar sem falhas.
Do livro "O Meteorologista" de Olivier Rolin, extractos que descrevem como nasceu a complexa rede meteorológica na Rússia:
(...) "Continente imenso, selvagem, semi-desértico, quase sem estradas, limitado a norte pelo ocano Ártico, correndo da Polónia até ao Alasca (...) Hoje, na hora em que escrevo, estão menos trinta e nove em Yakutsk, mais dezassete em Sotchi, uma profunda depressão de 968 milibares está a chegar ao Kamchatka, a uma distância de milhares de quilómetros outra está a formar-se no mar de Barents a oeste de Nova Zemlya, enquanto altas pressões de 1034 milibares estacionam no centro sa Sibéria. Edificar um sistema capaz de medir quotidianamente o pulso deste colosso e estabelecer previsões é uma tarefa esmagadora, tanto mais que é preciso vencer as resistências das burocracias emaranhadas e ciumentas do seu território, e sabemos que a inércia burocrática é uma das heranças da época czarista que o regime soviético soube maravilhosamente fazer frutificar. (...) Os aviões precisam das suas informações para terrar, os navios para abrir caminho pelo mar de Kara, os tractores para desenhar os seus pequenos sulcos no chernossolo. No dia um de Janeiro de 1930 é difundido o primeiro boletim meteorológico na rádio (...).»
[o meteorologista] « Alexei Feodossievitch entrega-se à tarefa com energia, e mesmo com paixão. Nas suas cartas, mais tarde, de um modo bastante curioso, chamará ao Serviço Hidrometeorológico Unificado "o meu querido filho soviético". (...) Estende as sua rede de estações, recebe notícias dos ventos em Sacalina, dos milhares de metros cúbicos de água por segundo arrastados pelo Ienissei, dos gelos que atravancam a "rota marítima do norte", a que chamamos a passagem do Nordeste (...) »
Полярная станция Голомянный = Polyarnya Stancya Golomyanniy.
Outra placa à porta de entrada. Os russos gostam de placas.
O interior é o de uma casa urbana decente - várias salas aquecidas, cozinha, sala de jantar, o café sempre quente. Nas paredes, posters, fotos e ofertas de expedições que por ali passam, e são cada vez mais, por vezes a pedir abrigo do frio.
Um tractor de lagarta foi um 'upgrade' recente muito bem vindo:
A equipa técnica lê e transmite de três em três horas os dados das observações.
A arma é indispensável fora de casa - um urso polar surge muitas vezes em silêncio, de surpresa.
O parque tecnológico - antenas e aparelhos de medida.
Luzita na obscuridade fria e húmida. Carro à porta, um luxo.
Como a noite polar dura vários meses e o verão apenas três semanas, este deve ser o pior local do mundo para energia solar.
Mesmo assim, há quem viva alegremente dessa energia:
História no Museu
Foi no quebra-gelos 'G. Sedov', que Georgy Ushakov navegou até Severnaya Zemlya em 1930.
Uma expedição dirigida por Georgy Ushakov permaneceu dois anos no arquipélago (1930 a 32); os exploradores russos tiveram de viver na total escuridão da noite polar; no Verão, ensopavam-se na humidade penetrante dos nevoeiros e sofriam tempestades de neve, furavam caminho entre as placas de gelo e os icebergs, afogados em água e em sopa de neve. Mesmo assim, Ushakov conseguiu mapear com sucesso todas as ilhas de Severnaya Zemlya.
Ostrova Sredniy, 'Ilha do Meio'
Vizinha de Golomyanniy, a Ilha Sredniy é bastante maior e tem uma pista de aterragem, prevendo-se o alargamento a uma base militar. No canto oriental da ilha está a "Casa Ushakov", que fora inicialmente construída na pequeníssima ilha Domashniy (casa) pela equipa de Ushakov. A cabana de madeira foi mais tarde trasladada para a ilha Sredniy, e há pouco convertida em museu.
A primeira casa jamais construída em Severnaya Zemlya.
O 'Museu de História e Desenvolvimento do Arquipélago de Severnaya Zemlya' exibe artigos de jornal, fotografias desenhos, livros, postais e até partes do navio do explorador, o 'Georgy Sedov'.
Fotos, uma hélice, utensílos da época (1930).
Os planos de Ushakov para a cabana fazem parte do pequeno espólio.
Há quem dedique uma vida a sítios assim. Admirável misantropia.
O "G. Sedov" num selo de 1977.
1 comentário:
Obrigado Mário. Mais uma vez, foi uma "lição".
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