sexta-feira, 19 de julho de 2019

A Ecologia dos ricos (e há outra?)


Reciclar é para ricos. Carro eléctrico é para ricos. Energia solar é para ricos. Ansiedade com o futuro climático, é para ricos.

Nem as pessoas, nem os países pobres têm essa preocupação ou esses recursos 'amigos do ambiente'. Um rico pode passar sem plásticos, ter em vez disso peles ou raíz de nogueira; um pobre não passa sem plásticos. Um país rico pode mandar o lixo para os países pobres, que o deitam ao mar. A maior comodidade não poluente a que um pobre tem acesso, é a bicicleta, faça sol ou faça chuva, calor ou granizo. A bicicleta é tão pobre que nem permite que se viaje acompanhado, conversando ou ouvindo música. Só um rico pode achar-lhe piada, para curtas passeatas à beira-mar; mas já não para ir e vir do trabalho, a 50 km de casa. E ainda pior se a idade avança - o selim é duro, as costas doem, faz cãibras nas pernas.

Onde há locais de recolha diferenciada de resíduos - aquele conjunto de depósitos mais ou menos coloridos e bem fechados? Nos zonas ricas, ou turísticas. Nas pobres, um único contentor velho, de plástico corroído e grafitado, ou saquinhos de plástico à porta. Nova Delhi, com os seus 22 milhões, alguma vez pode ter recolha de lixo diferenciada? Ser abastecida de electricidade por energia solar? ou eólica ? Nem pensar. Só combustível, ou nuclear. Mas a Islândia, a Suíça ou Singapura podem. E as Faroé.

Estou tão farto de aldrabice e hipocrisia nestas coisas, de Guterres impante como um reizinho a perorar sobre a 'catástrofe climática' aos coitadinhos africanos frente às câmaras. O problema que o planeta tem é de facto criado pelo Homem: pelo seu número. Não pelo seu comportamento, mas pelo crescimento descontrolado da humanidade. Talvez a Islândia, as Faroé, a Finlândia possam ter bom ambiente ecológico por muitos anos; têm pouca gente. A Índia, o Brasil, Moçambique ou a China não; estão condenados à degradação ambiental. Não há remédio, é gente de mais, a administração do território é péssima: permite-se a habitação em zonas inundáveis e de cota baixa; latas, dejectos, CO2, químicos, sucata, pneus, restos, tudo o que há de mau continuará a ser produzido e depositado em milhões de toneladas ano após ano. Adianta alguma coisa os países intermédios, ricos, preocuparem-se e restringirem-se? Duvido. Adianta alguma coisa substituir combustível por lítio ? Tenho a certeza que não. É só um luxo de ricos, satisfeitos por terem um carrão que não emite gases tóxicos, silencioso, eh pá vê lá se deitas fora essa caranguejola ruidosa e fumarenta. Influência no clima, zero.

Culpam a Revolução Industrial, como se fosse melhor viver antes dela. Mas se houvesse uma nova Revolução Industrial - que aprendesse a destruir ou converter os plásticos? A fabricar um produto semelhante mas fácil de reciclar? a construir motores de combustão não poluentes ? A plantar e fazer crescer florestas em pouco tempo? A controlar o clima, a chuva e os tornados? Para aí sim, é que deviam ir todos os esforços: para a investigação científica nas áreas onde a poluição é mais gravosa. Todos os discursos hipócritas apelando à restrição e à auto-flagelação dos consumidores deviam ser substituídos por discursos de incentivo entusiástico à criatividade industrial. O TGV é um dos grande exemplos de progresso, de melhoria da qualidade de vida. Em vez do poluente e perigoso avião, uma rede TGV é uma ideia fantástica. A China já aderiu - aí está uma bela realização industrial ecológica de um país pobre.

Neste sentido, coisas como o Acordo de Paris são de facto inúteis e enganadoras. Apontam para que nos conformemos com uma austeridade auto-imposta, para o miserabilismo na economia. Recuso a sobrevivência da humanidade pelo empobrecimento. Para retroceder, abdicar, viver em frugalidade monástica num retorno à vida rural, não vale a pena. Prefiro que o planeta estoire de vez. Ou vamos a Marte, e mais além, ou tenho vergonha de ser Homem.


1 comentário:

Belinha Fernandes disse...

Ainda há pouco escrevi sobre o lixo que os EUA despacham do país para fora e depois dizem que os outros é são os países poluentes! Julgo que se podem fazer opções por materiais menos poluentes independentemente da Humanidade se ter multiplicado sobre a Terra. Foi sempre assim em tudo. Os paises ricos é que indicaram o caminho, por exemplo, a varíola hoje está mais que controlada mas não ainda nos países pobres. Podemos questionar se as baterias de lítio e a sua produção não são igualmente problemáticas, claro que sim.Pois se o são as dos nossos telemóveis e PCs. Mas o caminho deverá ser abandonar as jazidas até porque elas não saõ inesgotaveis. As pessoas hoje olham o plástico somo um vilão mas o seu aparecimento foi revolucionário a muitos níveis.Também queria dedicar uma postagem a isso mas ainda não tive tempo. Acho que o consumidor não é o problema. Que culpa tem o consumidor que lhe chegue às mãos uma pasta dentífrica numa bisnaga e numa caixa de cartão? Já viu a inutilidade dessa caixa? Ninguém mantém a pasta na caixa e o produto poderia vir apenas no tubo, bem selado, e bastaria.A China tem colocado em prática muitas medidas para combater a poluição. As pessoas pressionaram fortemente o governo - e o consumidor tem aí um papel fundamental - e foram ouvidas. Sigo o que lá se passa com muito interesse.A abundância do nosso tempo nem sempre significa progresso: hoje a carne é baratíssima devido à forma como os animais são alimentados e medicados e crescem de forma rápida, mas essa não é a carne mais saudável que o ser humano já comeu. É claro que podemos sempre dizer que estamos melhor agora do que num tempo em que a fonte de proteína era cara e só destinada aos mais ricos. Mas, mais uma vez, parece que as pessoas até viviam melhor sem o saber privilegiando leguminosas e vegetais, que também têm proteína, e ingerindo pouca carne, que parece agora ser nociva, e cada vez mais. Olhe, por vezes eu até prefiro não refletir sobre estas questões pois parece que nada já faz sentido, que em vez de estarmos a evoluir estamos apenas a seguir por outros caminhos mercê de interesses muito pouco transparentes. O pior do nosso tempo é mesmo este estado de dúvida e incerteza acerca de tudo em que vivemos mergulhados. Apesar do acesso a tanta informação é muitas vezes difícil perceber o que é certo e errado. Gostei muito de ler o seu texto.