sábado, 6 de abril de 2019

Douglas Boyd dirige o concerto do ano na CdM


Já tinha previsto que isto podia acontecer; mas foi uma confirmação retumbante. Ter um maestro de primeira água faz a diferença, e a Orquestra da Casa da Música tocou Schubert como nunca - e deu uma fenomenal 9ª (Grande)  ao auditório quase cheio.


Grande direcção, e preparação, do escocês Douglas Boyd. Deu toda a atenção ao detalhe, à estrutura fina, ao diálogo dentro da orquestra, preteriu um som poderoso usando uma formação relativamente parca e tirando o máximo partido de sopros e metais, realçados no seu particularmente rico contributo nesta sinfonia. O equilíbrio do conjunto, os magníficios staccatos e pianos, a dinâmica da secção de metais, compensam largamente alguma perda de impacto sonoro nas cordas. Douglas Boyd começou como oboísta, talvez isso tenha tido influência nestas opções.

Mau, mau, só as notas da Folha de Sala:
"A herança de Beethoven deixa de funcionar como um peso inultrapassável ou até parali­sante."
"Ritmos apoteóticos e esplendor do desenvolvi­mento temático fazem deste andamento uma prefiguração quase perfeita das amplas sinfo­nias de Bruckner."
"Um dos grandes passos em frente na arte da instrumentação clássico ­romântica".


Esta ideia de progresso, de que algo "antecipa" ou "prefigura"  ou é "passo em frente" na música e na arte em geral, é um completo disparate. Dizer de alguém, suponhamos Fra Angelico, que teve o mérito de antecipar, digamos, Rafael, não faz sentido; porque Fra Angelico vale por si, não "antecipou" coisa nehuma, nós é que a posteriori perspectivamos a evolução que levou de um ao outro. Braque "prefigura" Dealaunay ? Hugo "antecipou" Wells? Pois o pateta que escreveu as notas sobre Schubert diz que esta Nona Sinfonia "prefigura" as de Bruckner, como se isso fosse grande mérito; e logo esse bruto, tosco, medíocre Bruckner. Ainda se fosse Mahler... mas é um disparate! A Sinfonia é inovadora e genial por mérito de Schubert, que é inovador e genial; tal como a seguir foram Mendelssohn e sobretudo Brahms, depois Mahler. Nenhuma obra "antecipa" outra obra, a não ser que seja uma evolução do mesmo autor. Ah, e Beethoven como "travão"? isto é coisa que um crítico decente escreva ? Um 'peso' 'paralisante' ?

Curiosamente, a assistência portou-se à Europeia: uma aclamação à altura, com três regressos ao palco, mas sem se pôr de pé a fazer figura pacóvia. Não podia ser a mesma gente que se levanta logo a gritar bravô a qualquer medíocre, como tem sido costume.

Um concerto perfeito, até nisto. Portanto, uma grande noite de música.

Para não ficar sem música, deixo o Finale com Harnoncourt:

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