segunda-feira, 19 de março de 2012

Apoteose Grigory Sokolov na CM

Ontem foi um dos ponto altos da programação 2012 da Casa da Música. Com sala cheia, Sokolov tocou Rameau, Mozart e Brahms.

Da Suite em Re de Rameau, sei que dei por mim sem ter respirado vários minutos, por volta de Les Niais de Sologne . As mãos do mestre Grigory têm um absoluto não sei quê que faz parar o tempo biológico. Aquele piano, a tocar barroco de forma esfuziante, inebriante, só podia ser ilusão.

Da Sonata KV 310 de Mozart, sei que no Adagio a sala viajou para outra dimensão, porque eu já não tinha os pés assentes, estava suspenso num éter de gotículas mágicas de piano. Perdoe-me Maria João Pires, este foi o concerto de piano da minha vida.

A mestria nas Variações sobre um Tema de Händel, op. 24, de Brahms, foi tudo isso e muito mais, vibrante, vertiginosa, sufocante, apoteótica. Transições de velocidade, de força, de ritmo, alucinantes. Jogo de mãos alucinante. De olhos e ouvidos absolutamente bloqueados, era-me difícil acreditar no que se estava a passar naquele teclado.
Aclamação delirante.

Ficando em Brahms, o primeiro Intermezzo, op 117 nº 1, sobre uma melodia escocesa, foi belo de arrepiar. Um Sokolov pianíssimo, sublime de dolente expressividade, numa obra genial do pianismo de Brahms. Fiquei KO.
Já não aguentava muito mais, eu. Demasiadas emoções para uma noite só. E não é que faltavam duas peças? Em que mundo é que isto acontece?

O público da CM (comportamento impecável, pouca tosse) aclamou, aclamou, e... vieram os encores ? Sim. Um (Rameau) . Aplausos, aplausos... e dois (Brahms)! Aplausos... e mais... e três ! ......... quatro ! ..........cinco ! C-I-N-C-O encores ! ... e seis... e sete...

Só pode ter sido uma noite mágica. E eu estava lá, mas sem saber onde, nem quando, nem como, nem nada.

Ah, e Brahms, meu Brahms, ninguém te chega aos calcanhares . *

As Variações:

Intermezzo nº1, de Brahms:

Intermezzo nº2


Les Niais de Sologne, da Suite de Rameau

Adagio da KV 310 de Mozart:

* pronto, já sei, Mozart está lá em cima contigo, ao piano.

11 comentários:

Paulo disse...

Grande pianista. Também já tive a sorte de o ouver na Gulbenkian.

Virginia disse...

Grande Entrada!

É fantástico como se encontram na net pessoas que nunca se viram na realidade e que sentem a música como nós próprios.

Já puz este blogue na minha lista e vou começar a lê-lo.Há tão poucos sobre o que me interessa a sério!

Os excertos são fantásticos, deve ter andado a pesquisar durante horas:)
Obrigada!

Mário R. Gonçalves disse...

Também já tinha ouvido Sokolov, duas vezes, sem me entusiasmar tanto, Paulo. Acho que o programa também é uma pérola, é raro ter a sorte de um concerto tão bem pensado e com peças deste nível. E Sokolov está nitidamente no topo de carreira.

Penso que este programa está em vigor nos próximos concertos, se tiver oportunidade não perca.

Mário R. Gonçalves disse...

Virgínia,

espero que seja o início de uma longa blog-friendship!

Mário

Paulo disse...

Sokolov esteve na Gulbenkian em Novembro mas eu não pude ir. Tocou seis encores.

Gi disse...

Fiquei maravilhada só ao ler o post.
Se calhar antes isso, visto que Brahms não é a minha chávena de chá (quem sabe se teria passado a ser?).

O Joaquim, no blogue In Fernem Land, dá conta do mesmo encantamento em Barcelona.

Joaquim disse...

Efectivamente, ayer en Barcelona sucedió otro milagro.
Es sencillamente sensacional

Mário R. Gonçalves disse...

Gi, Joaquim, eu nem sou muito dado a encantamentos e milagres. Sokolov também não é uma figura com impacto visual. Simplesmente toca piano como ninguém e deixa-nos em êxtase. Em toda a parte, menos na América, onde não vai.

Estou furioso, a propósito, com uma crítica idiota que veio no Público, dedicada quase toda a fazer pouco da corte de fãs (se fosse a MJ Pires já não falava assim) e a troçar do mito (e se fosse Gould?), e depois de considerar que afinal o concerto foi muito bom, apesar de tudo, dá-lhe 1 estrela em 5, ou seja, MAU !

Imbecil!

Paulo disse...

Os críticos do Público e etc. são de fugir.

Joaquim disse...

Yo tampoco soy muy dado a los milagros, por eso cuando suceden me vuelvo creyente.

Gi disse...

Joaquim, :-)