quarta-feira, 31 de dezembro de 2014
A minha escolha de melhores gravações de 2014
As orquestras suecas estiveram em alta este ano.
Maria João Pires, concertos nº 3 e 4 de Beethoven ; RSO Sueca, dir. Daniel Harding. Delicado, diferente, and yet perfeito.
Schubert, ciclo das Sinfonias (1 a 6) - Orq. Câmara da Suécia, dir. Thomas Dausgaard. Estilo e frescura inesperados.
Schumann, sinfonias 1-4, Orq. Câmara Escocesa, dir. Robin Ticciati.
Bruckner, a 9ª, por Claudio Abbado - uma herança de mestre numa obra difícil. Karajan destronado.
Missa Solemnis de Beethoven - J. Eliot Gardiner dirige de novo a O.R.&R. e o Monteverdi Choir. E de novo superlativo.
Na música barroca, nenhum disco me encheu as medidas; houve o Stella di Napoli de Joyce DiDonato, os Brandeburgueses do Dunedin Consort. Nada de indispensável.
DVD - Ópera
Eugene Onegin, de Tchaikovsky.
Metropolitan Opera, Anna Netrebko, dir. Gergiev.
Irrepetível. Nunca houve uma Tatiana assim.
segunda-feira, 29 de dezembro de 2014
Top 10 do Livro de Areia
As mensagens mais vistas aqui em 2014 :
Post Nº de visitas
Grande filme: 'O congresso' de Ari Folman .................................... 145
O Fagote (bassoon, basson) ........................................................ 139
Marialva, aldeia mágica ............................................................. 127
Perm, a última europeia antes dos Urais ....................................... 125
O Anjo Gabriel e outras maravilhas, de Vladimir Borovikovsky ........... 119
'Old Tjikko', 9550 anos: ah, se as árvores falassem !..........................112
Nuno Crato, o Indefensável .........................................................110
Requiem de Berlioz, dirige Gardiner, no Mezzo .............................. 100
From Kiev, with love .................................................................. 99
A grande vigarice da votação catalã ............................................... 90
Não vejo um padrão, e ainda bem, parece que continuar multi-temático é a melhor opção. Acho graça que o mesmo número de pessoas se interesse por Marialva e por Perm, tão longinquas e diferentes.
Quanto aos mais visitados de sempre, mantêm-se os primeiros lugares:
Paul Klee e a Música: quadros que se ouvem .................................1350
Oymyakon, o Pólo do Frio ......................................................... 1066
Voltar às origens, ou - ainda gosta de trepar às árvores ? ................. 1056
O Arminho do Ártico ................................................................. 980
Ainda Giotto – capela dos Scrovegni .............................................. 940
Bom fim-de-ano !
sábado, 27 de dezembro de 2014
2014: Não tem graça, mas não tem mesmo gracinha nenhuma
Morreste ? não ?
Excelente.
Passaste fome ? não ?
Excelente.
A tua casa foi assaltada? não ?
Excelente.
E o teu carro, jacking ? não ?
Excelente.
Cortaram-te a luz ? não ?
Excelente.
Estiveste internado com ébola ? não ?
Excelente.
Viste muita TV, telejornais...? não ?
Excelente.
Compraste um iPad, um Tablet ? não ?
Excelente.
Tinhas acções no BES ? não ?
Excelente.
Ainda estavas a contar com subsídio de Natal ? Já não ?
Excelente.
Leste 'Alabardas' do Saramago ? não ?
Excelente.
Choraste pelo cãozinho da enfermeira espanhola ? não ?
Excelente.
Esperas um 2015 melhor que este 2014 ? sim ?
De que te queixas, tiveste um excelente 2014.
Oxalá 2015 não seja pior.
quinta-feira, 25 de dezembro de 2014
Still, Still, Still
Uma das músicas de Natal que ainda me dá prazer ouvir é este lindo lied de compositor austríaco anónimo ( "Salzburger Volkslieder", 1819 ) aqui cantado por Bryn Terfel.
Still Still Still
Schlaf, schlaf, schlaf,
Mein liebes Kindlein schlaf!´
Desejo de dias suaves a acabar o ano.
quarta-feira, 24 de dezembro de 2014
terça-feira, 23 de dezembro de 2014
Três poemas de Robert Lax e uma aria de Bach
Robert Lax (1915 – 2000), poeta americano dos anos 60 - 70, a época áurea do século XX, foi contemporâneo de Bob Dylan e Kerouac, que lhe chamava "o Buda que ri". Foi sempre um outsider, nunca se integrou no meio culto americano ou europeu, que acusava de falsidade; isolando-se no misticismo religioso, exilou-se nos últimos 35 anos de vida como eremita na simbólica ilha de Patmos, Grécia.
Lax aderiu à corrente minimalista; na sua poesia recorre a repetições para obter um efeito cumulativo, conduzindo a um final de serena eternidade; ou pelo contrário criando por contraste um final surpreendente.
Uma estétiva comparável à da música de Arvo Pärt ou Philip Glass.
i draw
straight
lines,
said
the young
man,
and think
they are
perfectly
beautiful;
but what
can I
draw now?
straight
lines,
i said
straight
lines,
straight
lines
until
they
disappear
Robert Lax, New Poems, 1962
the first goodbye
the second goodbye
the third goodbye
the fourth goodbye
the fifth goodbye
the sixth goodbye
the seventh goodbye
the eighth goodbye
the ninth goodbye
the tenth goodbye
the eleventh goodbye
the twelfth goodbye
the hundred & twenty-first goodbye
the hundred & forty-forth goodbye
the hundred & eighty-ninth goodbye
goodbye
goodbye
goodbye
Robert Lax, Poems (1962-1997)
the second goodbye
the third goodbye
the fourth goodbye
the fifth goodbye
the sixth goodbye
the seventh goodbye
the eighth goodbye
the ninth goodbye
the tenth goodbye
the eleventh goodbye
the twelfth goodbye
the hundred & twenty-first goodbye
the hundred & forty-forth goodbye
the hundred & eighty-ninth goodbye
goodbye
goodbye
goodbye
Robert Lax, Poems (1962-1997)
Love &
death
are blood
& bone
love &
death
are bread
& stone
love &
death
are rose
& thorn
(love &
death
are sheep
& shorn)
Robert Lax,
Poems (1962-1997)
Não fica aqui mal uma aria de J.S. Bach, em guitarra clássica, tocada com muito particular sensibilidade:
sexta-feira, 19 de dezembro de 2014
Shackleton's Cross, foi há 100 anos
Howard Goodall compôs esta miniatura inspirado na Shackleton's Cross, a cruz da sepultura do explorador em Grytviken, ilha Geórgia do Sul. Está situada num promontório sobre o porto da antiga estação baleeira, de onde Ernest Shackleton partiu faz 100 anos para a trágica expedição ao Pólo Sul, em Dezembro de 1914, e onde voltou 17 meses depois em muito mau estado, a buscar socorro para a tripulação que deixou à espera na gélida e inóspita ilha do Elefante.
Gosto da antiquada simplicidade da música, gosto da heróica tragédia, gosto da sensação de eternidade e solidão que a cruz simboliza.
terça-feira, 16 de dezembro de 2014
Entrevista de Christophe Coin
No blog de Bruno Serrou, Classique d'aujourd'hui, uma excelente e extensa entrevista do violoncelista barroco e gambista Christophe Coin, aluno de Harnoncourt e Savall.
Além desses dois músicos, Coin também se refere a Rostropovich, Hogwood, Kuijken, o 'seu' Quatuor Mosaïque...
http://brunoserrou.blogspot.pt/2014/12/entretien-avec-christophe-coin_15.html
Para quem possa não conhecer, aqui fica um exemplo do som luxuoso, aveludado, que Coin tira do violoncelo com verdadeiro virtuosismo.
C.P.E. Bach: Concerto para violoncelo Wq172
1º andamento
segunda-feira, 15 de dezembro de 2014
Uma volta pelo Ártico na quadra de Natal
Por esta altura, vive-se a 'longa noite' no Ártico, o Sol nem se chega a levantar nas latitudes acima dos 65º N. As iluminações natalícias são particularmente bem-vindas, para alegrar essa escuridão prolongada.
Barrow, Alasca
71º 17' N
Nome, Alasca - a cidade da corrida ao ouro.
64º 30' N
Iqaluit, Canadá (arquipélago ártico)
63º 45' N
Tasiilaq, Gronelândia (costa oriental)
65º 36' N
Longyearbyen, Svalbard Islands - a mais ártica das cidades:
78º 13' N
Røros, Noruega
62º 34' N
Yakutsk, Sibéria - a capital do frio.
62º 02' N
Æðuvík, Ilhas Faröe
62° 04′ N
Tórshavn, Ilhas Faröe
60º 00' N
Trondheim, Noruega, uma jóia sub-ártica.
63º 25' N
Sisimiut, Gronelândia (costa ocidental) - convívio comunitário.
66º 56' N
E a celebração das luzes também acontece no céu.
Para escapar à misantropia, nem que seja por breves instantes.
sexta-feira, 12 de dezembro de 2014
Casa da Música 2015, a minha selecção de concertos
Pobre mais uma vez, como estes tempos, a programação para 2015 da Casa da Música nos seus 10 anos.
Dedicado à Alemanha, 2015 deveria (poderia ?) ser um dos melhores anos de sempre, com alguns grandes nomes convidados. Além de Sokolov, que gosta de cá vir, Andreas Staier, que também costuma aparecer, e Christian Zacharias, a solo, teremos uma única orquestra decente - a Akademie Alte Musik Berlin - mas nenhum grande maestro. A sublime Missa Solemnis, imperdível mesmo pela orquestra residente, é talvez o ponto alto.
24 de Março
Grigory Sokolov: Sonata op.10, nº3 de Beethoven)
27 de Março
Olari Elts dirige a Missa Solemnis.
17 de Abril
Alexander Shelley dirige a 4ª de Brahms.
3 de Maio
Michel Sanderling dirige a nº 64 de Haydn e a 5ª de Mahler.
30 de Maio
Andreas Staier, um programa de Telemann e Bach com a orq. barroca CdM.
18 de Setembro
Joseph Swensen num belo programa: Wagner (Idílio de Siegfried), Haydn (nº 82 'Urso') e Brahms, a nº 1, a melhor nº 1 jamais escrita.
1 de Novembro
Akademie Alte Musik: Bach (cantatas para soprano, concertos)
21 de Novembro
Baldur Brönnimann dirige um programa de Wagner - lieder e o Liebestod com Anna Hofmann.
28 de Novembro
o pianista Christian Zacharias, num programa essencialmente dedicado a Scarlatti e Chopin.
4 de Dezembro
Leopold Hager dirige Mozart (nº 34), duas árias com a soprano Ana Quintans, e a 2ª de Beethoven.
Fora da clássica, e sem nada a ver com Alemanha, destaco a
4 de Março
Al di Meola e a sua orquestra de jazz interpretam música dos Beatles. Já esteve em Lisboa (Aula Magna).
quarta-feira, 10 de dezembro de 2014
Inverno à porta:
'friend remembered not'
Pois venha então frio a sério.
A colectânea de poemas 'Ice', que andei a ler este Outono, abre com um daqueles poemas sublimes que só um génio pode escrever.
'Blow, blow, thou winter wind'
Blow, blow, thou winter wind,
Thou art not so unkind
As man’s ingratitude;
Thy tooth is not so keen,
Because thou art not seen,
Although thy breath be rude.
Freeze, freeze, thou bitter sky,
That dost not bite so nigh
As benefits forgot:
Though thou the waters warp,
Thy sting is not so sharp
As friend remembered not.
William Shakespeare
Essa ingratidão dos homens que 'gela' os momentos mais invernais da vida passa em muitas outras obras poéticas, de Emily Dickinson ou Burns, Yeats ou Robert Frost.
Também nesse livro 'Ice' tem lugar Nancy Campbell, a escritora e poeta inglesa que mais se tem dedicado ao Ártico, às suas gentes e lugares, e às sensações únicas que experimenta nas paisagens geladas, quase só azul-e-branco sob ventanias glaciares. Num registo totalmente diverso, as sete palavras dos inuit para Inverno, uma sonoridade de cortar à faca :
'Seven Words for Winter'
ukiigatta last winter.
ukioq the winter; the whole year.
ukiukkut in winter; during the year.
ukiuuppaa the winter came upon her before she
reached home, or finished building her house.
ukiorippoq she has a good winter; it is a good winter.
ukiorpoq the winter has come.
ukiortaak the new year.
Nancy Campbell
Ukiorpoq
E há até quem cante a gelada ingratidão de que se queixa Shakespeare :
domingo, 7 de dezembro de 2014
Geometrias no claustro da Sé Velha, e outras miraculosas preciosidades.
O exterior anuncia: não pode ser uma igreja igual às outras.
Uns 80 anos durou a construção, entre os séculos XII-XIII, iniciada com Afonso Henriques e terminada com Afonso II.
Lá dentro, o Milagre das Rosas, um óleo sobre tela do século XVII recentemente recuperado:
Não consegui informação sobre o quadro, mas tenho pena. Gosto muito, é bem bonito. Deve ter sido adicionado por alturas da construção da Janela Especiosa renascentista.
E no claustro, o milagre da luz:
Na transição para o gótico, milagrosas simetrias:
Grau 3
Grau 4
Grau 5 !
Grau 6
Grau 8
É um gosto para o matemático. O arquitecto destas rosáceas de pedra era um dos meus. Não gostava do 7, mas realmente é inestético.
Cá fora, vista do museu Machado de Castro, a ábside da capela-mor:
E mais geometria, através da miraculosa loggia quinhentista do Museu :
Vista assim, Coimbra parece imaculada; falta fotografar a sujidade e os muito maus pisos, o caos do estacionamento, a zona comercial pobre e por demais envelhecida.
Sobre a torre da Universidade, o milagre da Lua.
sábado, 6 de dezembro de 2014
'Hora de Natal', visto em Coimbra
No velhinho mas bonito Astória (quem dera alguém o restaurasse!) há um quadro com serigrafia de Almada e este poema:
HORA DE NATAL
(...)
É a hora em que as pávidas
madrugadas se calam
em que as noites e as tardes
são manhãs definidas
É a hora em que as pátrias
já não têm limites
É a hora em que as grades
de ser grades desistem
É a hora em que as almas
entre si comunicam
É a hora que falta
no relógio da vida.
David Mourão Ferreira
quinta-feira, 4 de dezembro de 2014
Roma, vista do Monte Aventino
Não pelo preço que atingiu a venda na Sotheby's, mas porque nunca lhe tinha posto a vista em cima - nem mesmo em imagem de écran. Ao que parece, totalmente diferente é ver o quadro, em estado impecável, que impressiona pelas pinceladas de Turner.
Mais informação aqui .
terça-feira, 2 de dezembro de 2014
Colecção Outono-Inverno :)
Diospiros e castanhas são das coisas boas da estação fria.
Mais que sabor, trazem cor e texturas.
Quanto a pêras, precisam de ficar umas horas a amadurecer ao sol, um sol baixinho que só aquece ao meio-dia.
Frutoso, este post !
Mais estatística menos estatística, as estações continuam o que eram.
segunda-feira, 1 de dezembro de 2014
De Rilke, um poema para antes de adormecer
'Zum Einschlafen zu sagen' ( 'Para dizer ao adormecer' ) foi publicado no Das Buch der Bilde (1902), de Rainer Marie Rilke. Gosto particularmente da versão francesa, mas é bonito seja em que língua fôr, e mesmo cinemático, de certa forma. Bons sonhos, vezes três.
To be said when going to sleep
I’d like to sing someone to sleep,
to sit beside and be right there.
I’d like to gently lull you, singing softly,
and accompany you asleep and waking up.
I’d like to be the only one at home
who knows: the night was cold.
And would like to listen within and without,
into you, the world, the woods.
The clocks, striking, call out each other
and we can see to the bottom of time.
And down below there's a strange man
and he is disturbing some strange dog.
After that comes silence. I have my eyes
laid wide upon you,
and they hold you gently and let go of you
when something moves in the dark.
À dire pour endormir
Je voudrais endormir quelqu'un en chantant,
m'asseoir tout près, et être là.
Je voudrais te bercer et chantonner tout bas
et t'accompagner au réveil et au sommeil venant.
Je voudrais être le seul dans la maison
à savoir que la nuit fut froide.
Et je voudrais écouter dedans et dehors,
en toi, dans le monde, dans la forêt.
Les horloges sonnent, criant les unes aux autres,
et l'on peut voir au fond du temps.
Et en bas un homme étrange passe encore
et il dérange un chien étrange.
Ensuite le silence s'installe. J'ai les yeux
grands ouverts posés sur toi ;
et ils te tiennent doucement, et ils te laissent
si quelque chose remue dans l'obscurité.
Para dizer ao adormecer
Eu queria adormecer alguém cantando docemente,
sentar-me junto de alguém e ficar ali.
Eu queria embalar-te e cantar baixinho
e acompanhar-te quando despertas e quando adormeces.
Queria ser o único na casa
a saber: a noite estava fria.
E queria escutar, dentro e fora,
de ti, do mundo, da floresta.
Os relógios batem as horas, chamam-se entre si
e vemos o fundo o tempo.
E lá em baixo ainda passa um estranho
e enraivece um cão estranho.
Depois o silêncio vem. Tenho os olhos,
bem abertos, pousados em ti;
e abraçam-te suavemente e libertam-te
quando algo se move na escuridão.
[trad. minha]
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