sábado, 29 de janeiro de 2011

Dame J, a voz que já não há

É uma dádiva inestimável poder continuar a ouvir cantar Joan Sutherland, com esta difícil facilidade, com esta sobrehumana humanidade.

(Nunca mais) há vozes assim.

Dame Joan Sutherland, bolero de I Vespri Siciliani, G. Verdi


P.S. Próxima viagem: Bologna, e il suo Teatro Comunale

sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

No Botânico do Porto

O Jardim

Consideremos o jardim, mundo de pequenas coisas,
calhaus, pétalas, folhas, dedos, línguas, sementes.
Sequências de convergências e divergências,
ordem e dispersões, transparência de estruturas,
pausas de areia e de água, fábulas minúsculas.


Geometria que respira errante e ritmada,
varandas verdes, direcções de primavera,
ramos em que se regressa ao espaço azul,
curvas vagarosas, pulsações de uma ordem
composta pelo vento em sinuosas palmas.

Um murmúrio de omissões, um cântico do ócio.
Eu vou contigo, voz silenciosa, voz serena.
Sou uma pequena folha na felicidade do ar.
Durmo desperto, sigo estes meandros volúveis.
É aqui, é aqui que se renova a luz.

António Ramos Rosa

terça-feira, 25 de janeiro de 2011

tangerina, tangerina

FRUTOS

Pêssegos, peras, laranjas,
morangos, cerejas, figos,
maçãs, melão, melancia,
ó música de meus sentidos,
pura delícia da língua;
deixai-me agora falar
do fruto que me fascina,
pelo sabor, pela cor,
pelo aroma das sílabas:
tangerina, tangerina.

Eugénio de Andrade


segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

Os verdadeiros números da eleição

Com abstenção de 53,37%, o universo de votantes foi de 100-53,37=46,63%.

Assim, a real votação em Cavaco Silva é de uns expressivos 46,63 x 52,94 =24,69%

Ou seja, 1/4 dos portugueses aprova o actual presidente.
Melhor ainda, Manuel Alegre , o PS e o Bloco obtiveram 46,63 x 19,75 = 9,2% ! Nem sequer 1 em 10 cidadãos estão nessa onda.

Assim se vê como vai a democracia.

domingo, 23 de janeiro de 2011

voto inútil ?

Quantas vezes fui votar desde o 25 de Abril ? 20? 30? Já perdi a conta. Votei à esquerda, à direita e nos extremos, em cima e em baixo. Não fui coerente, não - dei oportunidade a todos. E que fizeram com o meu voto ? Está a vista. Por eu ter ido votar, por ter ido votar NELES, é que isto está como é sabido - pobre, triste, feio e sujo. Fui conivente , no voto, com isto. Sou culpado, portanto, porque nisto votei, julgando que o fazia por bem.


Desde há uns tempos, finalmente, decidi - não votar mais. Acabou. Não dou mais cobertura a este estado de coisas, a esta gente sempre a mesma, sempre a criar ilusões e a fazer asneira grossa. Afinal não fizeram melhor que o salazarismo - que abomino - fizeram mais do mesmo: empobreceram-nos, fecharam-nos a um canto da Europa de castigo, puseram-nos de rastos, só para encher os bolsos da corte e dar nas vistas com mamarrachos do regime. Reduziram-nos a Fado, Futebol, Fátima e mais uns Folguedos televisivos particularmente imbecis.

Não votando, voto finalmente contra eles, descomprometo-me das burrices e patifarias que vão fazer nos próximos tempos, contribuo para a falência do sistema. Aleluia, que já chega.

Há com certeza alternativa.

sábado, 22 de janeiro de 2011

Arte Inuit: belos cestos !

Nas minhas deambulações pelo ártico na Net encontrei estes surpreendentes cestos, feitos em aldeias das ilhas árticas do Canadá - Baffin, Ellesmere, Cornwallis, Victoria - que são só por si todo um outro planeta, onde paisagens estranhas e deslumbrantes albergam povoações improváveis de pescadores e caçadores maioritariamente inuit.


Em breve hei de dar aqui conta dessas ilhas, algumas entre as maiores do planeta, onde a NASA achou por bem instalar bases experimentais para treinar a vida...em Marte! De facto, é na pequena e abandonada ilha de Devon que encontrou a paisagem terrestre mais parecida com o deserto marciano!

Mas os cestos, são uma beleza, não são?


cesto com pássaro

cesto com mergulhão

cesto com foca

cesto com pássaro

sábado, 15 de janeiro de 2011

Julia Lezhneva, soprano

Será a voz que faltava , a Caballé do séc XXI ?

Já o Outra Escritas se lhe referia há meses, aqui.

A soprano russa Julia Lezhneva é ainda uma jovem de 21 anos ( nasceu em 1989, na ilha Sakhalin) cuja carreira, depois de grandes sucessos em Moscovo e S. Petersburgo, começou realmente o ano passado em Londres. Muito versátil e com enorme extensão vocal, o reportório de Lezhneva vai desde o barroco ao bel canto e ao romântico: Vivaldi, Broschi, Bach, Handel, Mozart, Rossini, Bellini e Donizetti...

Na sua discografia, salienta-se o Ottone in Villa de Vivaldi, com o Giardino Armonico.

Em 2008, a voz era ainda muito verde e rígida. Está mais solta, a firmeza, segurança e facilidade notam-se tanto no agudo como no grave. Falta-lhe a maturidade de timbre, talvez por uma certa indefinição entre soprano e mezzo; esperemos que venha com o tempo.

R. Broschi, Son Qual nave ch'agitat',com os solistas de Trondheim
G.

Händel, Lascia Chio pianga. Soprano; Julia Lezhneva, solistas de Trondheim

sábado, 8 de janeiro de 2011

Eine Faust-Symphonie

Uma obra que bem gostaria de ouvir em concerto (é raro), a "Sinfonia Fausto" (Eine Faust-Symphonie) de Liszt, composta em Weimar,1857.


Espécie de enorme poema sinfónico inspirado no Fausto de Goethe, respira uma poderosa dramaturgia numa orquestração vanguardista e luxuriante, que termina com este "Coro Místico", uma das mais belas páginas de Liszt:


(aqui canta Hans Peter Blochwitz sob Chailly)


(aqui canta Siegfried Jerusalem sob Solti)

Alles Vergängliche
ist nur ein Gleichnis;
das Unzulängliche,
hier wird's Ereignis;
das Unbeschreibliche,
hier ist es getan;
das Ewigweibliche
zieht uns hinan.

Tudo o que é transitório
não passa de alegoria
O que é inadequado
aqui acontece
o indescritivel
é agora realizado
o Eterno Feminino
atrai-nos e eleva-nos

terça-feira, 4 de janeiro de 2011

Ler e Reler: Seda, de Alessandro Barrico


Seda, de Alessandro Baricco

Estamos no séc XIX, numa cidade francesa enriquecida com o negócio da seda. Nas viagens de ida e volta ao Japão para comprar os casulos, o protagonista (pacato homem de negócios sem horizontes) descobre um mundo de fascínio e paixão, que contrasta com a sua vida medíocre. Cada expedição é uma repetição, um eterno retorno, sempre terminada com a esposa que o espera pacientemente. Repetem-se parágrafos inteiros, diálogos, criando um contexto bizarro, em que tudo se concentra num gesto, num olhar. 'Seda' é sobretudo uma história de sensações, e como elas alimentam a memória e a linguagem, por vagas sucessivas, como o mar.

Numa escrita de elegante e depurada simplicidade, um pequeno e leve romance onde a emoção está toda em matizes, em palavras que não são ditas. E um belo documento de História ficcional, também.

(Lido em francês)

Outros livros anteriormente relidos:

O Golpe de Misericórdia, de Margueritte Yourcenar

A Aventura Maravilhosa, de Aquilino Ribeiro

Shroud, de John Banville

O Jogo das Contas de vidro, de Herman Hesse

Um Outro Mar , de Claudio Magris

Ondine, de Friedrich de la Motte-Fouqué

A Invenção de Morel, de Bioy Casares

Um Deus Passeando Pela Brisa da Tarde, de
Mário de Carvalho

"An Equal Music", de Vikram Seth

O Castelo dos Cárpatos , de Jules Verne